02 novembro 2014

Cartas Brasileiras: Bons Dias! Bom Mês!

Bons dias!

Assim Machado de Assis iniciou algumas de suas crônicas publicadas na Gazeta de Notícias, entre abril de 1.888 a agosto 1.889; isso mesmo, no plural, e por manter contado apenas semanal com os leitores, deseja a todos “bons dias”.
Em uma delas, justificou o cumprimento — “Hão de reconhecer que sou bem criado. Podia entrar aqui, chapéu à banda, e ir logo dizendo o que me parecesse; depois ia-me embora, para voltar na outra semana”.
A saudação inicial em uma chegada ou aproximação, além de polidez, revela nossa cordialidade e apreço. Um “bom dia” recebido de um amigo, quando sabemos das dificuldades que teremos que enfrentar, pode ser o conforto ou força de que tanto necessitamos; quer melhor para começar o dia!
No Vale do Ribeira, terra do meu pai, mantendo até hoje um antigo costume, no primeiro encontro diário com os pais, as pessoas ajuntam as mãos, como se fossem rezar, fazem um leve aceno com a cabeça, e dizem: “bença, pai! bença mãe!” Repetem o gesto ao  final do dia antes de ir para a cama. 
De volta às crônicas de Machados de Assis, aquelas dos “Bons Dias” ele as assinava usando o pseudônimo Policarpo, apresentado como um relojoeiro que havia se desencantado com a profissão.
E eu estou aqui a falar de relógio, eu que sequer use um,  não porque não me prenda ao tempo e nem dê valor a ele; não. É que contando fazendo as contas nas pontas do dedos, vi que minha mãe se viva fosse teria feito 101 anos, e que o tempo levou meu pai já há sete anos, privando-nos para sempre de ouvir o som de sua clarineta.
Então busco consolo escutando “Beguin the Beguine”com Artie Shaw e Orquestra. Ao som da música digo: “Bença pai, bença mãe!”
E  para você leitora ou leitora: “Bom mês!”



 (clique na imagem)

P.T.Juvenal Santosptjsantos@bol.com.br


Obs: crônica reescrita, original publicada 03/08/2010 em O Diário de Barretos

10 outubro 2014

Município de Penacova adquiriu a casa onde nasceu António José de Almeida


O município de Penacova adquiriu a casa onde nasceu António José de Almeida, sexto Presidente da República de Portugal, oriundo deste concelho. "Este sonho era acalentado há várias décadas, sem que nunca se conseguisse atingir o objetivo de o concretizar. Contudo, havíamos feito a promessa de reerguer a casa e o nome deste Presidente, em nome da população penacovense, e por isso a celebração desta conquista deve ser partilhada por todos", referiu Humberto Oliveira, presidente do município.
Foi no âmbito das comemorações da Implantação da República e do 10º aniversário do Museu da Presidência da República, que o município de Penacova celebrou ontem, dia 05 de outubro, pelas 15H00, no Museu da Presidência, a escritura de compra da casa onde, em 17 de julho de 1866, nasceu António José de Almeida, localizada em Vale da Vinha (União das Freguesias de São Pedro de Alva e São Paio do Mondego). António José de Almeida foi um político republicano português, que chegou ao mais alto cargo da nação, o de Presidente da República Portuguesa, cargo que exerceu de 5 de Outubro de 1919 a 5 de Outubro de 1923.


O Museu da Presidência, representado pelo seu Diretor, Diogo Gaspar, associou-se a esta iniciativa da autarquia, estabelecendo uma parceria dinâmica com vista à definição estratégica da utilização da casa e da sua fruição pública. Presentes na cerimónia estiveram, para além de representantes da Casa do Concelho de Penacova em Lisboa, também José António de Almeida Abreu, neto de António José de Almeida.
Após a assinatura do contrato de compra, o Executivo Municipal que se fez acompanhar neste ato pelo Presidente da União das Freguesias de São Pedro de Alva e São Paio do Mondego, foi recebido pelo Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, que congratulou o município pela iniciativa, desejando o maior sucesso ao futuro da casa.
No final da tarde, o Executivo Municipal penacovense, acompanhado pelo Presidente da Junta de Freguesia do Lumiar, Pedro Delgado Alves, e muitos penacovenses residentes em Lisboa, prestaram homenagem a António José de Almeida, depositando junto à sua estátua uma coroa de flores.

Conforme realçou Humberto Oliveira, "este era o passo imprescindível para que se intervenha na requalificação da casa e se faça viver nela todo o simbolismo histórico e político que representa António José de Almeida. A população de Penacova vê assim assegurada, com o esforço do seu município, a preservação da sua história e a vontade de perpetuar os seus símbolos, que orgulham a nossa gente".

TEXTO E FOTO 1: SITE da Câmara Municipal de Penacova. 

Nota: Congratulamo-nos vivamente com este facto. Veja texto publicado no Penacova Online de 5 de Outubro de 2023

23 setembro 2014

Cartas Brasileiras: garrafa com mensagem



Não sei como o leitor ou leitora  chegou aqui; tampouco sei quem é e de onde vem.  Nem mesmo sei por qual caminho,  sei somente que caminhando pela margem do rio acabou por encontrar a garrafa, e que ao abri-la leu a mensagem que nela havia:




Como tudo agora é tão moderno, verá que a mensagem está escrita em azul, a indicar que "clicando" no texto será direcionado a um vídeo.
Se vendo o vídeo achar que ele nada signifique para você ou que o/a comova, por favor, coloque novamente a garrafa no rio, talvez logo mais à frente um outro caminhante possa encontrá-la, quem sabe dela necessite. Boa viagem!


(clique na imagem para ver o vídeo)
P.T.Juvenal Santos


21 agosto 2014

Cartas Brasileiras: amando ou brigando por cartas

Amando ou brigando por cartas
Dizer que antigamente era assim pode dar a impressão de algo muito afastado no tempo, quando na verdade o passado está logo ali; quarenta, cinquenta, sessenta anos! Pois é, como antigamente a paixão distante era curtida e mantida na base das cartas, nas juras eternas de amor, o anúncio do rompimento, as lágrimas pela separação passavam também pelo correio. Se assim era na vida, não havia como a música popular não retratar esses momentos, daí existirem vários registros dessa época eternizados pela música.
“Devolvi” é uma dessas preciosidades, gravada primeiramente por  Nelson Gonçalves (1919-1998), cantor de muito sucesso nas décadas de 40, 50 e 60, sendo ainda apreciado pelos mais velhos. O autor português, Adelino Moreira de Castro (1918-2002) nasceu em Covêlo e faleceu no Rio de Janeiro. 
“Devolvi o cordão e a medalha de ouro / E tudo que ela me presenteou /Devolvi suas cartas amorosas / E as juras mentirosas / Com que ela me enganou. / Devolvi a aliança e também seu retrato/ Para não ver o seu sorriso /no silêncio do meu quarto...”
Mensagem” de Aldo Cabral e Cícero Nunes, composta em 1946 foi gravada inicialmente por Isaura Garcia, mais conhecida como Isaurinha Garcia (1923 -1993), uma das maiores cantoras brasileiras, a Edith Piaf brasileira.
“Quando o carteiro chegou/ E o meu nome gritou / Com uma carta na mão / Ante a surpresa tão rude / Nem sei como pude / Chegar ao portão / Vendo o envelope bonito / E no seu sobrescrito / Eu reconheci / A mesma caligrafia / Que disse-me um dia / Estou farta de ti / Porém não tive coragem / De abrir a mensagem...”
Pombo Correio composta em 1965 por Dodô e Osmar, ao ganhar letra  de Moraes Moreira em 1978, fez logo sucesso, dançada no ritmo frenético do frevo pernambucano é exigida em toda apresentação do artista.   
“Pombo correio / Voa depressa / E esta carta leva / Para o meu amor. / Leva no bico / Que eu aqui /  Fico esperando/  Pela resposta / Que é pra saber /  Se ela ainda / Gosta de mim...”
Bem mais recente, Devolva-me” música do tempo da Jovem Guarda, 1966, com Leno e Lilian foi grande sucesso entre a juventude romântica.  
“Rasgue as minhas cartas / E não me procure mais/ Assim será melhor, meu bem! / O retrato que eu te dei/ Se ainda tens, não sei / Mas se tiver, devolva-me!...”
Como essas coisas não acontecem somente aqui no Brasil, busquei na grande Amália Rodrigues (1920-1999) um exemplo das choramingas nas canções portuguesas feitas através das cartas, o que encontrei em Fado do Ciúme, música que aparece no filme Capas Negras, de 1947, que marca a primeira participação da artista no cinema.  Há no Youtube vários trechos do filme. [clique na imagem]

“Se não esqueceste /  O amor que me dedicaste, / E o que escreveste / Nas cartas que me mandaste, / Esquece o passado / E volta para meu lado, / Porque já está perdoado / De tudo o que me chamaste.”


P. T. Juvenal Santos 

25 julho 2014

Cartas Brasileiras

Carta apaixonada, 
nem às paredes confesso.

Hoje acordei diferente.
Depois da higiene matinal corri até a cozinha onde minha mulher já tinha preparado meu pedaço de mão com manteiga, o leite pronto para ser aquecido, me aguardando; ela sempre faz isso, como porque ela faz, não que tenha fome pela manhã.
Dei-lhe um beijo de bom dia. Nossa, exclamou ela surpresa.
Pudera, foi um beijo diferente, um desses como não a beijava há muito tempo ao cair da cama. De troca recebi um suspiro como há muito não recebia.
Após o café fui para a varanda. Abri o jornal, folheei-o desinteressadamente, nada nele me despertava; também, naquela manhã! Fechei-o.
Fui para o computador. Não quis saber de emails, de mensagens pelo Twitter ou de notificações do Facebook. Busquei com certa ansiedade minha pasta com músicas; preciosidades!
E, naquela manhã em que me acordei diferente, senti uma vontade louca de ouvir Amália Rodrigues. Pus-me a escutar “Nem às paredes confesso”.
Repeti a música sei lá quantas vezes, até que resolvi buscá-la em vídeos na  Internet, quem sabe alguém tivesse postado uma interpretação. Infelizmente não tive sorte, encontrei apenas alguns slide show. 
Enfim, valeu.
            Minha mulher chegou e me perguntou o que se passava comigo, dei com os ombros. Ela comentou dizendo que eu acordara apaixonado. Apenas ri comigo mesmo, o coração apertado ao ver somente ela e eu em nossa casa, da mesma forma como chegamos após nos casarmos; somente nós e muitos sonhos.
Os filhos! Bem, os filhos cresceram e se foram. Vieram os netos, mas que também cresceram, que com seus afazeres, escola e atividades rarearam suas visitas.
Agora, novamente, nós. Por isso devo ter acordado diferente, acredito por ter, finalmente,  me dado conta de que, definitivamente, restamos ela e eu.
Por isso apenas para ela voltaram os meus beijos. Sem que tenha que dizer para mais ninguém de quem eu gosto, digo só para ela; mas não contem para ninguém!

P.T.Juvenal Santos
ptjsantos@bol.com.br

04 julho 2014

Órgão de Lorvão vai fazer-se ouvir de novo: hoje, com o organista João Vaz e a participação do Coro Mediae Vox Ensemble

Organista : Prof.JOÃO VAZ
Coro : MEDIAE VOX ENSEMBLE

Promovido pelo Centro Cirúrgico de Coimbra   www.ccci.pt


Aberto ao público em geral


Colaboração:
-Paróquia de Lorvão.
-Junta de Freguesia de Lorvão


Trata-se do 3º Concerto do Órgão Histórico do Mosteiro de Lorvão, após o restauro e concerto inaugural de 3 de Maio de 2014.

Fonte: Rui Batista

30 junho 2014

Coral Divo Canto vai apresentar espectáculo inédito em Penacova


Depois de há dias termos divulgado o cartaz, recebemos, hoje, dia 2,  um texto de Eduardo Ferreira que nos fornece mais pormenores sobre o espectáculo e lança um convite a que ninguém falte.

No próximo Sábado à noite (dia 5 de Julho - 21 horas)  em frente à Câmara de Penacova vai acontecer um espetáculo inédito por estes lados, que ninguém deve perder!


Graças à coragem, à paciência e sobretudo à competência do Maestro Pedro André Rodrigues  e às excelentes vozes das solistas que interpretam Orfeu, Eurídice e Amor (Ana Carolina Rodrigues, Carolina Simões e Joana Carvalho, respetivamente), os Penacovenses e todos aqueles que ali se desloquem podem assistir à ópera Orfeu & Eurídice, uma imortal história de amor, composta por Christoph W. Gluck, aqui apresentada pelo Grupo Coral Divo Canto, de Penacova, com as participações dos professores Júlio Dias ao Piano e Gonçalo Rocha na flauta transversal e da Escola de Ballet de Penacova e Silveirinho.
 
É assim um excelente pretexto para ir até Penacova, onde para além do espetáculo, dá ainda para nos deliciarmos com uma saborosa nevada e com a deslumbrante paisagem.
 
Lá nos encontraremos!


Eduardo Ferreira

09 junho 2014

Cavaquinho em Cartas Brasileiras

Cavaquinho em Cartas Brasileiras  

Nelson Antonio da Silva, mais conhecido como Nelson do Cavaquinho é um dos grandes nomes da boa música brasileira; o apelido que ganhou já diz bem qual era o forte dele. Autor de umas 400 músicas, algumas chegou até a vender para poder se sustentar, tinham como tema o sofrimento, a ingratidão de amor, e uma quase obsessão  pela morte. Uma composição que bem demonstra o estilo das músicas é como “Quando eu me chamar saudade”.
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Sei que amanhã / Quando eu morrer / Os meus amigos vão dizer/  Que eu tinha um bom coração / Alguns até hão de chorar / E querer me homenagear / Fazendo de ouro um violão / Mas depois que o tempo passar / Sei que ninguém vai se lembrar / Que eu fui embora/ Por isso é que eu penso assim / Se alguém quiser fazer por mim / Que faça agora / Me dê as flores em vida/  O carinho / A mão amiga / Para aliviar meus ais / Depois que eu me chamar saudade / Não preciso de vaidade / Quero preces e nada mais.Nascido em 29 de outubro de 1911, faleceu em 18 de fevereiro de 1986.
No “chorinho” o grande intérprete e compositor foi Waldir Azevedo (27/01/1923 – 20-09/1980). É o autor do famoso  “Brasileirinho”.

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No Brasil todo grande tocador de cavaquinho gosta de executar essa música para mostrar sua qualidade artística e técnica. Waldir compôs muitas outras, como  “Delicado”, “Pedacinhos do céu”

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Waldir Azevedo com sua maestria levou o cavaquinho para uma posição de destaque na interpretação musical, com o que deixou de ser apenas mais um dos instrumentos de acompanhamento. 

E por que falo de cavaquinho! Por tudo que tinha até então escutado, imaginava que o cavaquinho fosse um instrumento genuinamente brasileiro. Mas, ao ver no blog o convite para o almoço comemorativo do 20° aniversário da Casa do Concelho de Penacova, li que uma das atrações será o Grupo de Cavaquinhos de Rebordosa. Fiquei curioso e me pus a pesquisar sobre o assunto tendo descoberto, o que de há muito ai já é sabido, que o instrumento,  também chamado de braquinha, braga e machete, tem origem no Minho (Portugal), de onde espalhou, até chegar ao Brasil.

E do Brasil mando abraços para todos.

P.T.Juvenal Santos


Nota da redacção: havia uma correcção a fazer relativa a datas de nasc / morte. Aos leitores as nossas desculpas.

02 junho 2014

Lisboa: Casa do Concelho de Penacova vai assinalar o 20º Aniversário

Adicionar legenda
A Casa do Concelho de Penacova é uma associação regionalista, sem fins lucrativos, composta por pessoas singulares e colectivas ou equiparadas. Foi fundada em 9 de Junho de 1994, por escritura pública realizada no 20º Cartório Notarial de Lisboa, publicada no “Diário da Republica” nº 174 / 94 (III Série) de 29 de Julho de 1994. Foram fundadores José Bernardes de Oliveira, natural de S. Pedro de Alva, e António Pimentel, Carlos Augusto Luís Simões e António Vicente Cabral, naturais de Penacova. Tem a sua sede em Lisboa, na Calçada de Carriche, nº 47 B, freguesia da Ameixoeira. Logo que foram conseguidas instalações, sucedeu à LACP (Liga dos Amigos do Concelho de Penacova) que, com esse objectivo, tinha sido fundada em 15 de Junho de 1985 pelos mesmos penacovenses, e outro, José Fernandes.

A Casa do Concelho de Penacova tem como principal finalidade promover culturalmente os seus associados; desenvolver a solidariedade entre os naturais do concelho ou que a ele se sintam ligados por laços familiares ou de amizade; divulgar as suas belezas paisagísticas, o seu património cultural e artístico, a sua gastronomia, o seu artesanato e o seu folclore; participar no desenvolvimento do concelho e prestar apoio possível ao seu comércio e à sua indústria; defender o concelho de tudo o que possa causar-lhe danos morais ou patrimoniais; organizar eventos culturais, recreativos e outros de carácter regionalista, entre sócios e simpatizantes; favorecer a prática de modalidades desportivas; colaborar com as associações similares e com as autarquias do concelho; auxiliar, dentro do possível, os penacovenses que se encontrem carenciados.

A Casa do Concelho de Penacova é sócia fundadora da ACRL – Associação das Casas Regionais em Lisboa – fez parte do seu Conselho Fiscal de 2008 a 2010 sendo presentemente Vice-Presidente da Direcção para Área Patrimonial, Equipamento e Logística.

Veja:

http://www.casaconcelhopenacova.pt/index.htm

11 maio 2014

Promover anualmente em Lorvão uma Semana de Cultura à volta da Música Antiga, defende Dinarte Machado

A concluir as referências à inauguração do órgão do Mosteiiro de Lorvão e como prometido, publicamos o texto de Dinarte Machado que constava do desdobrável alusivo ao evento. Fica também a mensagem do pároco, Padre Pedro Miranda.

ÓRGÃO HISTÓRICO DO MOSTEIRO DE LORVÃO
  . Dinarte Machado, mestre organeiro

O órgão histórico do Mosteiro de Lorvão é o maior órgão construído em Portugal no século XVIII. É um instrumento que, apesar da sua dimensão, não deixa de ser personalizado e seccionado em relação à sua planificação sonora, tornando‑o um instrumento "sensível" e deveras singular.

Foi projetado por Manuel Machado Teixeira de Miranda, natural de Braga, organeiro e escultor, que deu início à sua construção, instalando em primeiro lugar a caixa quase ao centro do corpo sonoro da igreja, sendo uma parte a igreja propriamente dita e a outra o coro baixo. Este organeiro, foi pai do escultor Joaquim Machado de Castro e, em terceiras núpcias, pai do organeiro António Xavier Machado e Cerveira. Foi, aliás, Machado de Castro, quem desenhou e executou a caixa deste instrumento, a sua maior obra deste tipo, onde se expõem figuras e cenas musicais e onde os pontos estáticos praticamente não existem. Tudo está em movimento, distribuído por duas fachadas: a do lado do coro (a principal), e a do lado da igreja. É do lado do coro que o organista toca e para onde estão direcionados os tubos de palheta, com os seus ressoadores de trombetas horizontais, à boa maneira portuguesa, cujo aspecto apenas se pode apreciar em Portugal em Espanha.

Diposição da registação
 na consola
Em relação ao instrumento, António Xavier Machado e Cerveira, após a morte de seu pai, fez cumprir muitos dos compromissos assumidos por este, com quem aprendera e trabalhava já com a sua merecida confiança. Assim, completou, alterou e acrescentou vários dos instrumentos iniciados pelo pai, como o da Basílica dos Mártires em Lisboa, a Igreja Matriz de Praia da Vitória, o Mosteiro dos Jerónimos, a Basílica da Estreia em Lisboa, entre outros. O órgão do Mosteiro de Lorvão, inscreve-se nessa prática, mas criou alguma controvérsia por ser de tão grande dimensão, não sendo do agrado de Machado e Cerveira. Todavia, cerca de catorze anos após a morte de seu pai, Machado e Cerveira decide dar seguimento ao projecto, alterando e acrescentando registos, a fim de o adaptar à prática musical do seu tempo. Também o aspecto económico travou todo este processo, e só por volta de 1793 António Xavier Machado e Cerveira termina este belo instrumento, tornando‑o, no seu conjunto, numa espécie de escola (dada a sua composição) e num exemplar único no panorama da organaria portuguesa.

O órgão é composto por dois teclados manuais e sessenta e dois meios registos distribuídos por vários planos sonoros individualizados, controlados por pisantes existentes na consola, cujo som é produzido por quase 4000 tubos. Cada pisante, anula uma secção sonora, a qual se harmoniza com a base do instrumento, desde os registos de mutação, (reforço da base), caixas de eco, cornetas e palhetas (trombetas). Parecendo complexa a sua composição e "manuseamento", depois de nos integrarmos percebe‑se exatamente o contrário. Tudo parece ter sido feito de modo a facilitar a sua utilização, por parte do organista que o pretenda tanger.

As duas fachadas (a do coro e a da igreja) são preenchidas com tubos de 24 palmos, os quais são sonoros. O projecto inicial, não contemplaria o funcionamento da fachada do lado da Igreja. No entanto, a análise rigorosa de todas as peças deste conjunto faz‑nos acreditar que tenha sido António Xavier Machado e Cerveira quem optou por fazer este reforço sonoro (sobre os graves), pretendendo que ambas as fachadas fossem utilizadas em conjunto, juntando‑se a estes apenas um registo de 12 palmos e um outro de 6 palmos. O efeito desta combinação é deveras impressionante e só pode ser experimentado neste instrumento. Este é o único órgão em Portugal com duas fachadas desta dimensão sonora que, desafiando as leis da acústica (sonoridade geral sendo emitida sem refletor acústico), funciona naquele espaço, na perfeição.

Saliento que o órgão português que considero mais bem planeado e com uma concepção admirável é o do Mosteiro de Santa Maria de Semide, o qual também restaurámos. Aquele Mosteiro pertencia à mesma Congregação que o Mosteiro de Lorvão e o instrumento foi construído na mesma época por António Xavier Machado e Cerveira. A arte organeira em Portugal, que tem o seu expoente máximo no último quartel do século XVIII, indo até ao fim da primeira metade do século XIX (embora já em decadência), é de tal riqueza e com uma identidade tão definida que se torna única no panorama mundial.

O órgão do Mosteiro de Lorvão é testemunho do conjunto de mais de uma centena de órgãos desta traça portuguesa, num universo de quase mil instrumentos existentes no país. 

Página do Diário de Coimbra,
de 9 de Maio
Creio que o órgão do Mosteiro de Lorvão virá alertar para a necessidade de manter estes instrumentos, através da formação de novos organeiros experimentados e empenhados na preservação desta parcela tão importante da nossa história, que outrora nos dignificou e nos fez grandes, perante o mundo. 

Hoje podemos afirmar que conservámos um número significativo de órgãos históricos em Portugal, dignificando a sua escola de organaria. Ignorar este facto significa perdermos a nossa identidade cultura[, algo muito mais importante do que um esforço financeiro pontual. A perda de identidade cultural é irrecuperável e deixa‑nos sem personalidade e sem a dimensão suficiente para recuperarmos o tal esforço financeiro. Hoje, perante o mundo, podemos dizer que em Portugal contactamos muitas vezes com instrumentos no seu estado mais puro e original (eu próprio o posso testemunhar), algo que em muitos países da Europa é de todo impossível. Assim confrontados com o elemento original, podemos criar uma escola mais "pura" e mais verdadeira seguindo esse ensinamento.


Tenho a esperança que em Lorvão e a partir do ecoar deste instrumento, se crie uma semana de cultura à volta da Música Antiga, chamando jovens e admiradores desta faceta cultural, apelando ao contacto e à formação em Portugal de pessoas nesta área, atraindo gente das várias partes do globo para conhecer os órgãos restaurados nesta zona e por todo o país (com eixo em Lorvão) e dando a conhecer o nosso património nas mais variadas vertentes culturais.


Agradecimento e compromisso

 . Pedro Cartos Lopes de Miranda, Pároco de Lorvão

Para uma paróquia essencialmente rural, apesar da proximidade à cidade de Coimbra, e cuja dimensão fica naturalmente muito aquém duma correspondência proporcionada à obrigação natural de habitar e cuidar de um monumento nacional com o significado da Igreja do Mosteiro de St' Maria de Lorvão, estava também completamente fora do seu alcance esta obra que hoje temos a alegria de chegar finalmente à sua plenitude: a obra de restauro do seu órgão.

O investimento que tal obra supôs revela grande coragem da parte da Direcção Regional de Cultura do Centro e do Estado Português, coragem que o povo de Lorvão, cheios de saudades os mais velhos do seu órgão e das liturgias por ele embelezadas, cheios de curiosidade e esperança os mais novos, só pode agradecer encarecidamente.

Permita‑se‑me, em nome do povo católico de Lorvão, formular um compromisso da sua parte para o futuro deste importante instrumento do património organológico nacional: fazer tudo o que está ao seu alcance para que o seu uso litúrgico ‑ que e o seu mais natural ‑ seja o mais quotidiano possível, para lhe garantir a saúde e a longevidade. Penso que pelo menos um sinal, embora inconsciente, já temos da viabilidade desse compromisso: o modesto mas esforçado contributo dos fiéis católicos, que são quem sustenta a vida quotidiana desta sua igreja matriz, para o orçamento tão grande desta obra. Qual? Perguntar‑se‑á. Seja‑me permitida confissão: com a conta mensal da energia eléctrica, que, durante as obras do órgão e outras em curso de iniciativa pública, atingiu uma dimensão que, a ser assim perenemente, nos levaria à ruína.

Quem fez este esforço, seguramente estará disposto a continuá‑lo à medida das suas capacidades, para uma: "longa vida ao órgão da Igreja do Mosteiro de Sta Maria de Lorvão."


06 maio 2014

História e Arte: a propósito do Órgão do Mosteiro de Lorvão

Transcrevemos hoje o texto (publicado no folheto alusivo à inauguração do órgão) do Prof. Doutor Nelson Correia Borges, eminente historiador penacovense e o maior especialista da história do Mosteiro de Lorvão. Só se pode dar valor àquilo que se conhece. Com a divulgação deste documento, que constitui uma excelente síntese histórica e artística,  pretendemos contribuir para que Lorvão se afirme cada vez mais como Centro Cultural do nosso concelho, da região e do país.

História e Arte

Nota breve

Teve a música grandes cultoras em Lorvão, em todos os tempos. Abundam na documentação do mosteiro as referências, quer a instrumentos musicais, quer a instrumentistas e cantoras. Os ofícios de coro exigiam solenidade, perfeição e gravidade, conforme a determinação dos Capítulos Gerais da Ordem de Cister e as normas codificadas no Livro de Usos e Cerimónias. O órgão veio a assumir‑se no decurso do século XVII como instrumento indispensável ao esplendor das cerimónias litúrgicas, graças aos aperfeiçoamentos técnicos e estéticos de que foi sendo alvo.
A primeira referência a um órgão de tubos em Lorvão data de 1668, o que pressupõe a sua anterior existência. Em 1719 a comunidade decidiu mandar fazer um novo, profundamente remodelado em 1727, na caixa e nos mecanismos, e com nova reforma em 1742. Não teve muitos anos de uso este órgão reformado, pois foi desmontado em 1747, durante as obras de construção do novo coro e quando se pensava em reedificar também a igreja de forma mais grandiosa. Logo que o coro ficou pronto, cerca de 1748, e começou a ser utilizado para o ofício divino, procedeu‑se à reinstalação do órgão desmontado, antes que se pensasse em mandar fazer outro novo, o que só seria possível depois de concluídas as obras da igreja.
Em 1764, quando se fizeram os retábulos do antecoro, trabalhava-se igualmente nas tribunas ou varandins em que se viria a instalar o novo órgão. Mas só vinte anos mais tarde, em 1784, houve disponibilidade para avançar com a obra. Para o efeito foi contactado o escultor e organeiro Manuel Machado Teixeira, natural de Braga e estabelecido em Coimbra, com oficina na rua de Sobre Ribas. Manuel Machado Teixeira era pai de Joaquim Machado de Castro e de Antônio Xavier Machado e Cerveira. Ao primeiro comunicou o gosto pela escultura, ao segundo o da organaria. Um e outro se distinguiram e foram figuras cimeiras na sua arte. Foi certamente devido à avançada idade de Machado Teixeira que, à obra vultuosa que as cistercienses de Lorvão pretendiam fazer, se associou Antônio Xavier. O contrato para a sua execução foi celebrado em 15 de julho de 1785, mas esta sofreu contratempos vários, como o falecimento de Manuel Machado Teixeira. Também o projeto inicial foi ultrapassado com a adição de novos registos e outras alterações. Só em 1795 o órgão ficaria pronto e, conforme se pode ver na assinatura que Antônio Xavier Machado e Cerveira lhe após, tem o nº 47 de fabrico. Importou em mais de sete contos e seiscentos mil réis, verba avultada que só acabou de ser totalmente liquidada em 1806, o que denota já algumas dificuldades financeiras na governação do mosteiro. Com efeito, os tempos já eram bem diferentes da época áurea anterior. É esta a explicação para o facto de, tanto as caixas do órgão como as tribunas do antecoro, nunca terem sido pintadas e douradas como estava previsto e era comum em todas as obras congéneres. Em 1791 levaram três demãos de aparelho, somente. O douramento e pintura, que lhes emprestariam nova beleza e fulgor foram sendo adiados para melhores dias, que não mais voltaram. Com isto, o órgão de Lorvão ficou impedido de transmitir a mensagem estética visual que lhe fora destinada.
Há que distinguir no órgão a parte de organaria da de marcenaria, escultura e talha. Quer uma quer outra são do mais alto nível, o que confere a este instrumento o estatuto de verdadeira obra‑prima entre os órgãos históricos nacionais. Embora não haja referência documental direta ao nome do escultor e entalhador, é sabido que António Xavier Machado e Cerveira se instalou em Lisboa na oficina de Joaquim Machado de Castro, ao Tesouro Velho, e como era estreita a colaboração profissional entre ambos, é lógico que, absorvido e entregue aos trabalhos de organaria, deixasse para a oficina do irmão a fatura da caixa do órgão laurbanense, que ele próprio também contratara.
Contudo, nem seria necessária esta dedução documental. Basta olhar para a escultura decorativa, para o filiar estilisticamente na arte de Machado de Castro. O parentesco é por demais evidente em certos pormenores que quase têm o valor da marca da sua oficina ou da sua assinatura. Graciosos anjos‑músicos esvoaçam em movimentos delicados, enquanto outros se quedam em diversas atitudes, tangendo com brio variados instrumentos. Especialmente encantador é o relevo em moldura arrendada, da fachada da igreja, com cinco anjos dispostos assimetricamente, movimentando‑se sobre nuvens em diferentes e graciosas atitudes e posições. São uma exaltação de Cister, mostrando ostensivamente os atributos de S. Bernardo: três livros, emblemáticos dos seus inumeráveis escritos, um báculo, a mitra abacial e uma pena. Provavelmente teria sido também Machado de Castro o delineador de toda a caixa, onde se patenteiam bem os princípios estéticos que o norteavam, isto é, os de um barroco classicista, com algum racionalismo de concepção, decorrente da filosofia das Luzes e tão característico da época rococó, bem patente na disposição e articulação dos diversos corpos. Foram utilizadas na execução madeiras de castanho e pinho de Flandres.
Com este alentado e belo instrumento ficaram as monjas laurbanenses habilitadas e estimuladas para a prática de música litúrgica no mais alto grau de perfeição. Muitas delas foram exímias organistas, como se documente pelos assentos dos livros de óbitos.

Nelson Correia Borges,

Historiador

05 maio 2014

Mosteiro de Lorvão: ainda o concerto inaugural do órgão histórico

A inauguração do órgão do mosteiro de Lorvão realizou-se no dia 3 de Maio, à noite, conforme previsto. Contou com a presença do Secretário de Estado da Cultura e da respectiva Delegada Regional além das autoridades locais civis e religiosas. Noite memorável para Lorvão e para o concelho de Penacova. A Igreja (incluindo a parte do Coro) foi pequena para acolher a multidão (assim podemos falar) que quis estar presente neste momento tão especial e ansiado. A página do Penacova Actual no Facebook publicou inúmeras fotografias sobre este acontecimento.
Dada a importância histórico-cultural deste órgão, tomamos a liberdade de publicar alguns textos que fazem parte do desdobrável disponibilizado na ocasião. 
Por hoje, deixamos aos leitores o depoimento de João Vaz, organista de renome internacional, que juntamente com Harald Vogel, derem corpo ao Concerto Inaugural. Posteriormente, publicaremos textos do historiador Nelson Correia Borges e de Dinarte Machado, mestre do restauro.

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(Obs: esta disposição do texto e cor de base não corresponde ao original. 
Pedimos desculpa aos autores. Move-nos tão só a  intençao de divulgar  
e valorizar ainda mais este tesouro cultural)




03 maio 2014

Um Órgão com (muita) história...

Separador do livro Doçaria Conventual de
Lorvão, de Nelson Correia Borges (2013)
É muito provável – segundo alguns historiadores - que em tempos mais recuados já existisse um órgão em Lorvão. 

Todavia, o primeiro órgão de que há notícia terá sido o que em 1718 mandou fazer a abadessa D. Cecília d’Eça e Castro. Entretanto, a abadessa D. Maria da Trindade resolveu reformá-lo, mudá-lo de local, acrescentar-lhe mais registos e dourar-lhe a caixa. A partir de 1748 dão-se as obras de reconstrução da Igreja que se prolongaram por cerca de vinte anos. Depois das obras, as religiosas quiseram dotar o mosteiro com um órgão mais grandioso. Coube a D. Madalena Maria Joana de Vasconcelos Caldeira (1783-1786) materializar esse objectivo. 

Na obra de Nelson Correia Borges, Doçaria Conventual de Lorvão (2013) escreve aquele autor: “ Em 1785, a mesma abadessa empenhou-se na obra do novo órgão, mas já era o canto de cisne da renovação artística de Lorvão: a caixa foi aparelhada e ficou à espera de uma pintura e douramento que nunca mais chegou e o pagamento da despesa arrastou-se por vários anos. É uma realização do que melhor se fazia no reino, já que a parte harmónica e técnica foi executada por António Xavier Machado e Cerveira e a caixa e escultura saiu da oficina de seu meio-irmão, Joaquim Machado de Castro.” 

Só ficou concluído em 1795. Poucos anos depois surgem as invasões francesas que a par de outros factores conduzem à decadência de Lorvão e do seu órgão. 

Depois de muitas décadas, em 1955,  voltou a fazer-se ouvir, depois do restauro feito pela Firma João Sampaio (Filhos), Lda. 

“Foram introduzidas modificações nos foles e na cobertura do teclado. Os primitivos foles eram em forma de cunha e necessitavam de dois homens que tinham de se revezar com frequência. Foram substituídos por um único fole paralelo, instalado em sala contígua, com a vantagem de fornecer sempre a mesma pressão de ar. O seu conjunto harmónico é constituído por cerca de dois mil e quinhentos tubos de metal e madeira.” – escreveu Nelson Correia Borges em 1968 no Notícias de Penacova

Naquela data já o órgão estava outra vez inutilizado. Lamenta o referido cronista que “depois de importantes obras de restauro levadas a cabo em 1955 pela DGEMN e que fizeram voltar o alentado instrumento ao seu antigo esplendor, dum momento para o outro elas ficassem inutilizadas parcialmente por injustificável incúria, em virtude de ter-se dado infiltração de água das chuvas durante umas obras de reparação do telhado”. 

Os anos passaram, muitas pessoas e entidades foram pugnando pelo seu restauro. Depois de muitas vicissitudes, só hoje, 3 de Maio de 2014, vai ser possível ouvi-lo de novo na sua majestade e imponência.

Capa do jornal Díário de Coimbra de 2 de Maio
Díário de Coimbra , 2/5/2014