24 abril 2022

Notas para a história do 25 de Abril em Penacova

 


”A revolução dos cravos foi recebida com grande júbilo, pelo menos, por parte das pessoas com quem eu contactava. Claro que esse sentimento positivo não era unânime, havia pessoas que estavam mais identificadas com o ideal do Estado Novo, mais “encostadas” ao antigo regime e, naturalmente, tinham as suas próprias ideias que não coincidiam com as que tinham levado à revolta de Abril.”

Teófilo Luís Alves Marques da Silva, in Jornal de Penacova, 2002


As manifestações públicas mais significativas só aconteceram no dia 1 de Maio. A seguir à concentração em frente da Câmara Municipal teve lugar uma sessão no Salão Nobre dos Paços do Concelho onde foi eleita uma Comissão para gerir o Município.

Dessa Comissão faziam parte Fernando Ribeiro Dias, Manuel Ribeiro Santos, Rui Castro Pita, Joaquim Manuel Sales Guedes Leitão, José Marques de Sousa, Teófilo Luís Alves Marques da Silva, Américo Simões, Adelaide Simões, Artur José do Amaral, Artur Manuel Sales Guedes Coimbra, António Coimbra Soares e António de Sousa. A 2 de Maio tomou posse e de entre os seus elementos foi escolhido presidente Teófilo Luís Alves Marques da Silva, ficando como vice-presidente, António de Sousa. Teófilo Marques da Silva, natural do Porto, licenciado em História, militante do Partido Comunista Português, era professor e, desde 1971, director do Ciclo Preparatório de Penacova.

Esta Comissão acabou por apresentar a demissão em Agosto de 1975, mantendo-se, entretanto, em funções por mais algum tempo. Reunida com os representantes locais dos Partidos, a Comissão indigitou para Gestor Municipal o 1º Sargento de Infantaria José Alberto Costa, que exerceu essas funções entre 24 de Abril  e 31 de Dezembro de 1976.

Em Dezembro de 1976 têm lugar as primeiras eleições para as Autarquias Locais, saindo vencedor o Partido Socialista, passando a presidir à Câmara Municipal  Artur Manuel Sales Guedes Coimbra e à Assembleia Municipal Eurico Almiro Meneses e Castro. Nesse acto eleitoral, nas listas para a Câmara, o Partido Socialista obteve 2081 votos, o Partido Popular Democrático 2029, o Centro Democrático Social 1302 e a Frente Eleitoral Povo Unido 550 votos.

Recorde-se que nas eleições legislativas de 25 de Abril de 1976 o Partido Popular Democrático havia vencido com 3041 votos, seguido do Partido Socialista com 2884, Centro Democrático Social com 978 e Partido Comunista Português com 515 intenções de voto.

Recordemos mais um ou dois episódios que se encontram registados na imprensa local. No dia 6 de Outubro de 1974, milhares de pessoas em todo o pais decidiram responder ao apelo para a realização de um dia de trabalho voluntário para a Nação. 

Também em Penacova a iniciativa foi bem acolhida. Escreveu “Luineses” no Notícias de Penacova:

 “Mostrar desta maneira que comungamos num Portugal ressurgido (…) que ajudamos de alguma maneira a economia nacional com o produto do nosso esforço. Procedendo assim mostramos obras e não paleio que disso está o mundo cheio. É assim que se vê quem são os Democratas”. 

Outro apontamento refere-se ao assalto ao “Lar das Enfermeiras” em Lorvão para servir de Casa do Povo. Estávamos em Agosto de 1975: “O Povo entusiasmado com o que ouve na rádio e lê nos jornais, resolveu tomar uma atitude, tomando as instalações do lar”.

De referir, por último, que a imprensa local, mais propriamente o Notícias de Penacova, dirigido por Joaquim de Oliveira Marques, foi cautelosa face aos acontecimentos. Só no dia 4 de Maio aquele jornal dá algum destaque ao Movimento das Forças Armadas. O editorial, intitulado “Mudança de Rumo”, mantém ainda muitas reticências quanto ao correcto uso da liberdade restituída ao povo português.

 


19 abril 2022

Lançamento do livro "Penacova (In)temporal" no Dia da Liberdade



O dia 25 de Abril, Dia da Liberdade, foi a data escolhida para o lançamento da obra, editada pelo Município, Penacova (In)temporal

Trata-se de um livro de poemas de Luís Pais Amante que contou com a colaboração de David Almeida e de Óscar Trindade. A apresentação, que terá lugar no Auditório do Centro Cultural de Penacova, pelas 15 horas, caberá a José Fernando Tavares, autor do prefácio.

A sessão será presidida por Álvaro Coimbra, presidente da Câmara Municipal de Penacova. O evento contará com a declamação de alguns poemas, por Humberto Matias, e também com a actuação dos grupos penacovenses Coral Divo Canto e Coro Vox et Communio e de alunos da Escola de Artes.

“Penacova (In)temporal” integra sessenta e sete poemas de Luís Pais Amante, complementados, na sua grande maioria, por fotografias digitalmente editadas, de Óscar Trindade, e por textos de enquadramento histórico e social, relacionados com os temas abordados.

O livro está dividido em três partes. A primeira parte trata essencialmente de lugares icónicos da vila e do concelho, sendo o segundo capítulo mais voltado para as instituições, as pessoas e as tradições penacovenses. Por último, alguns poemas de carácter mais pessoal, mas registando sempre a relação umbilical à terra natal do Autor, às suas pessoas e aos seus lugares, à sua Penacova inserida no Tempo, mas que, ultrapassando os limites temporais, se projecta num tempo "sem tempo" no plano do rememorar e do sentir.


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https://www.acomarcadearganil.pt/penacova-penacova-in-temporal-livro-cuja-receita-reverte-a-favor-dos-bombeiros/


09 abril 2022

Olhares: "O temeroso sítio de Entre-Penedos"


"Acima da vila de Penacova, a mais de três léguas de Coimbra, alevantam-se quase
a prumo dois grandíssimos penedos, que deram nome àquele passo do Mondego.
A face da pedra, denegrida pelos sois de muitos séculos, é lisa e nua. Apenas
dalguma estreita fenda brota enfezado arbusto ou solitária planta ressequida
pelos ardores do estio.

Em baixo, correm as águas turvas, escuras, sombrias, por sobre as quais a voz
humana e os demais sons têm aquele ressoar lúgubre e prolongado, próprio das
cavernas e dos vales estreitos e profundos, onde a proximidade das encostas se
opõe à propagação das ondulações sonoras.

O espírito confrange-se em tão medonhas solidões, e, às vezes, irresistível
fascinação prende os olhos ao abismo ...D'ambos os lados o aspecto da rocha é
muito semelhante. Às camadas e veios de uma parte, correspondem outros da parte
oposta. Parece, por esta razão, que a serra, ora fendida, foi antigamente contínua, e
que os xistos silurianos, de que a dizem formada, encheram o espaço, em que hoje
corre o ar e a água.

Um poeta, menos conhecido entre nós do que o merece, cantou numa das suas
metamorfoses o antigo cataclismo que fez lugar à ruptura do monte e à passagem
das águas, as quais, na sua opinião, formavam juntas um grande lago, limitado
pelas serras do Bussaco, Caramulo, Estrela, Góis e Lousã:

No sitio, em que o Mondego coibido
Por eternas barreiras lá da origem
Do mundo, pouco e pouco,
Séculos mil e mil acumulara,
Jove troou dos ares... e os Gigantes
De Góis, do Caramulo e do Bussaco
Do pego pelas vagas se esconderam.
Mas de Neptuno a força pelo meio,
Indignando balizas, co'as entranhas
De humedecido monte, furibundo,
A sucessão rasgou da Hermínia serra,
E o que foi mar, é solo . . .

A ideia do poeta, apesar da liberdade, a que ele tinha direitos, não é talvez tão
exagerada, como a de um célebre físico e matemático português, que, a fim de
evitar os estragos das inundações, propôs a restauração do lago primitivo por meio
de um açude agigantado, que havia de unir as duas rochas separadas. Pôde às
vezes a arte mais do que a natureza , mas neste caso, quando não resistiu o monte
endurecido e consolidado pela intensidade das causas cosmogénicas, havia de
resistir a muralha alevantada por débeis mãos de homem?


in ESCRITOS DIVERSOS DE
AUGUSTO FILIPE SIMÕES
1888
(grafia actualizada)

05 abril 2022

Existiu um Mosteiro na Cheira ou mesmo em Penacova?

                                                    Gravura meramente ilustrativa de um mosteiro medieval, obviamente de maiores dimensões 

Terá existido nos arredores de Penacova um mosteiro, que não o de Lorvão? 

Esta hipótese é avançada por Maria Alegria Fernandes Marques  na obra "Memória de um mosteiro: Lorvão, séculos IX-XII - História de uma comunidade masculina", editada recentemente pelo Município de Penacova.

Existem documentos de 998, relativos ao Mosteiro de Lorvão que indiciam a sua existência. Pouco se sabe desse "ignorado" mosteiro, mas sabe-se que era em "Villa Cova", não a Vila Cova doada pela condessa Onega ao mosteiro de Lorvão mas outra Vila Cova, próxima de Penacova. A primeira seria, segundo Nelson Correia Borges, na zona da Granja do Rio, a segunda localizar-se-ia na zona da actual Cheira ou perto do local onde hoje é o centro histórico da vila. Sabe-se que houve  renhidas contendas entre o Mosteiro de Lorvão e essa Vila Cova, relacionadas com a delimitação de territórios.

O possível mosteiro poderá mesmo ter surgido na sequência de alguma "cisão" entre os monges. Dissidência  motivada pelo modo de encarar as relações com os muçulmanos que à época dominavam Coimbra.

Entretanto, terá havido um  incêndio (neste e não no de Lorvão) e os monges ter-se-ão refugiado "na torre de Miranda", que seria o castelo de Penacova (de acordo com Manuel Luís Real in "O Castro de Baiões terá servido de atalaia ou castelo, na Alta Idade Média"? Manuel Real entende, no entanto, que o mosteiro queimado teria sido o de Lorvão...

Este tema do mosteiro na Cheira, ou quem sabe em Penacova, oferece muitas dúvidas aos historiadores, mas não deixa de ser um elemento curioso para a história de Penacova na Alta Idade Média.