Muito se escreveu (e se escreve ainda hoje) sobre a Batalha do
Bussaco. Muitos e muitos relatos ficaram
registados quer pela mão de franceses, quer de ingleses e portugueses. O texto
que se segue, não trazendo nada de novo,
tem no entanto a particularidade de ter como autor Augusto Mendes
Simões de Castro que, como todos os penacovenses sabem, deu origem à
designação do Penedo do “Castro” outrora conhecido por Penedo da Cheira. Simões
de Castro deixou muitas obras entre as quais o “Guia Histórico do Viajante do
Bussaco” onde dedica um capítulo àquele acontecimento militar que marcou a
nossa região, o país, e mesmo grande parte do “mundo ocidental”.
O capítulo começa com uma sextilha de Delfim Maria d’Oliveira Mata:
Aqui a águia vencedora
Ofuscar seu brilho outrora
Por nossas armas já viu;
-Empolgava quasi a Europa
Mas à forte lusa tropa
O colosso sucumbiu.
Transcrevemos a parte inicial do capítulo em causa:
“Junto dos muros do Bussaco se feriu no dia 27 de Setembro
de 1810 uma famosa batalha, em que o exército anglo-luso, sob o comando de lord
Wellington, ofuscou pela primeira vez a glória militar do afortunado e célebre
Massena -o filho querido da Vitória, como lhe chamava Napoleão.
Havendo as tropas francesas invadido por duas vezes o
nosso pais, sem que obtivessem vantagem decidida, a primeira em 1807 capitaneadas
por Junot, e a segunda em 1809 por Soult, resolveu Napoleão mandar de novo invadir
Portugal por um grande exército sob o comando do marechal Massena, que efectivamente
transpôs a nossa fronteira em Agosto de 1810, depois de tomar Astorga e Ciudad
Rodrigo.
Era Massena precedido pela grande fama de seus esplêndidos
feitos militares; alcançara vitórias assinaladas, e ufanava-se de ter salvado
a França com a batalha de Zurique, que havia ganhado contra os russos, e com
a memorável defesa de Génova, com que facilitara a Napoleão a passagem dos
Alpes. Trazia consigo generais
de grande perícia; e suas tropas eram numerosas, aguerridas
e valentes. Os nossos soldados eram em menor número, grande parte recrutas, que
nunca se tinham encontrado em campo com o inimigo. Bem desigual era pois o partido;
todavia os brios
da nação tudo supriram, e o Filho Querido da Vitória, que
segundo a linguagem soberba de Napoleão, vinha arrojar Wellington para o
Oceano, teve de se reconhecer vencido e de evacuar o país depois de muitos revezes.
Entradas as tropas francesas em Portugal, o seu primeiro
passo foi o cerco de Almeida. Uma terrível explosão, sucedida nos armazéns de
polvora d'esta praça no dia 26 do dito mês de Agosto, obrigou a guarnição a
capitular.
Tratou Massena imediatamente de dispor as coisas para
realizar o seu plano de invasão, e ordenou aos diversos corpos do seu exercito
fizessem colheitas e se provessem de viveres para dezassete dias- tempo que calculara
o necessário para a conquista de Portugal.
No dia 20 de Setembro acamparam as tropas junto de Viseu.
Esta cidade fora abandonada pelos habitantes, e Massena, encontrando-a deserta,
ficou surpreendido e viu transtornados seus planos; pois não só esperava que
o povo português o receberia bem, mas contava por consequência encontrar
facilmente os necessários recursos para o exército prosseguir sem embaraço na sua
marcha até Lisboa.
Convocou Massena os oficiais de estado maior, e alguns
portugueses que trazia consigo, para o instruírem da estrada que mais conviria
seguir em direcção a Lisboa, e deliberou que se marchasse pela de Tondela e que
em Santo António do Cântaro se atravessasse a serra do Bussaco.
No dia 25 pôs-se todo o exército em movimento, e veio
acampar em Tondela e cercanias. Encontrou esta vila deserta e completamente
desprovida de mantimentos.
No dia 26 continuaram as tropas a sua marcha. Na ponte
do Criz achou a vanguarda alguma resistência por parte dos aliados, mas depois
de ligeiro combate abandonaram estes a ponte, deixando-a cortada. Repararam- na
logo os Franceses e por ela pôde passar a artilharia; a cavalaria e infantaria
passaram num vau pouco acima da ponte.
A vanguarda dos aliados continuou a afastar-se até Santo
António do Cântaro, e neste ponto opôs forte resistência. Viram os franceses
que lhes era impossivel vencer esta posição, e ao mesmo tempo descobriram uma
força superior sobre a montanha do Galhano. Fizeram então reconhecimentos para
todos os lados, mas foram rechaçados sucessivamente.
Nessas circunstâncias participaram a Massena (que havia
ficado muito para trás) que os aliados se opunham à passagem da montanha com
forças consideráveis.
Veio Massena reconhecer a posição, e seguidamente perguntou
ao general Pamplona se julgava que os aliados ofereceriam batalha. Respondeu
este que sem dúvida, visto como sobre a montanha se descobriam forças tão
consideráveis. Disse então Massena, convencidissimo e em tom de oráculo: — «Eu
não me persuado que Lord Wellington se arrisque a perder a sua reputação; mas
se o faz, je le tien: demain nous
finirons la conquête du Portugal, si
en peu de jours je noyerai le léopard»
Mal diria Massena que dentro de poucas horas haviam as
coisas de suceder tanto pelo contrário do que esperava!