29 julho 2017

10 anos do Penacova Online: nota editorial

Os vários cabeçalhos que o blogue apresentou
ao longo destes 10 anos
O blogue Penacova Online está a completar 10 anos de existência. Estávamos em 2007.  Verificámos que em Penacova, quer a nível da blogosfera, quer a nível de “sites” institucionais o panorama era muito limitado, para não dizermos pobre. No plano noticioso nada existia que duma forma consistente congregasse o que, dispersamente, se ia publicando na imprensa local e regional e noutros meios de comunicação social. Perante isso sentimos que Penacova, também neste aspecto, estava a ficar para trás. Assim, sem interesses lucrativos ou políticos e sem grande aparato tecnológico iniciámos a publicação do Penacova Online.

De 2007 a 2010 tentámos cumprir essa função noticiosa. A partir daí, o site do Município de Penacova passou a fazer a cobertura informativa da vida social e cultural do concelho. Surgiu, entretanto,  o “Aqui-Penacova”, a que se seguiu o “Penacova Actual”, projecto que acabou por se afirmar como  "o jornal " do nosso concelho, em formato digital.

Escrevíamos em 26 de Julho de 2010, ao completar três anos de publicação: “Entendemos que o Penacova Online completa assim um ciclo. O ritmo das notícias, das políticas e das politiquices, das tricas e das fofoquices não se enquadra no nosso formato. Arredados da escravatura do momento e da velocidade do instante, iremos falando, de vez em quando, da história e da cultura de Penacova, bem como das suas belezas naturais.”

E esta é, ainda, a nossa posição. Vamos continuar a linha que temos vindo a seguir nos últimos tempos: mais do que noticiar o dia a dia penacovense, dar primazia à publicação de textos relacionados com a história local e o(s)  património(s) do nosso concelho.

David Almeida

10 julho 2017

Poetas penacovenses (II): Reconquinho...



Entrelaçado na/ envolvência de ti / Rio / Eu fico aqui em cima a /

Olhar parado / Quase paralisado /  Como se tivesse  muito /Frio /

O teu espelho continua / Reflector /

O arvoredo circundante / Nas tuas margens /

Está agora a iniciar / Um longo processo de dor / Diletante / 

A curva da estrada do /Reconquinho / Está mais cavada, mais / Curvada, /

 Embora / Reconfortante /

A Praia fluvial com /Cobertura de geada /

Canta connosco e tira / Suores ao povo /

Que se renova e ali vai /Ficando mais novo /

As formas bizarras das / Canoas /

Trazem colorido sofrido /

E a velha Barca Serrana /Alberga o pescador que /

Ali pesca boga à cana /

Tudo harmoniosamente / Colocado / Tudo estoicamente conservado

/ Tudo belo / Para não dizer / Encantado!


Luís Pais Amante
Casa Paraíso, Penacova, 3 Dez 16, 9h30
Olhando para o RioMondego


05 julho 2017

Penacova e Cistierna: conhecer o passado para debater o futuro


Estão abertas as inscrições para o programa “Penacova e Cistierna: conhecer o passado para debater o futuro”, um projeto pioneiro que irá decorrer entre 15 e 22 de julho, em Penacova. Este programa decorre no âmbito da geminação entre os dois municípios, cujo acordo será assinado no dia 17 de julho, data do feriado municipal de Penacova.

O programa tem como objetivo principal proporcionar aos jovens dos dois municípios uma semana de convívio e aprendizagem, dedicada a conhecer a história comum, a cultura e a música, permitindo ainda aos participantes o contacto com uma língua estrangeira. Consiste na realização de workshops e palestras sobre temas relacionados com a música, história e com a União Europeia, bem como atividades lúdicas, culturais e sociais. Inclui ainda visitas a sítios de património, como sejam o Mosteiro de Lorvão e o Museu do Moinho, mas também atividades de desporto e aventura nas praias fluviais do Vimieiro e Reconquinho.

As atividades irão decorrer diariamente, a partir das 10h00 e incluem o almoço. Os workshops irão decorrer no Mosteiro de Lorvão e na Biblioteca Municipal/ Centro Cultural e as atividades culturais noturnas terão lugar no Largo Alberto Leitão, em Penacova.

Do lado espanhol, a maioria dos participantes integra a Banda de Música de Cistierna e do lado português poderá inscrever-se qualquer jovem com residência no concelho de Penacova. Contudo, como parte do programa se relaciona com música, será conveniente que os participantes tenham conhecimentos de música (por exemplo, membros de filarmónicas, grupos de cantares ou grupos corais).

Os interessados em participar no programa poderão inscrever-se online, através do formulário disponibilizado no website do município, (através do linkhttps://goo.gl/forms/yi4JpFHxmdKAfFa62), ou na receção da Biblioteca Municipal/ Centro Cultural.

O projeto “Penacova e Cistierna: conhecer o passado para debater o futuro” foi alvo de uma candidatura ao Programa “Europa para os Cidadãos”, da Comissão Europeia, tendo sido selecionado para cofinanciamento.

Paula Silva
Biblioteca Municipal / Centro Cultural

04 julho 2017

Nos 150 anos da abolição da Pena de Morte: reflexos na história das gentes de Penacova

OS CASOS LUÍSA DE JESUS E EXPLOSÃO DE PÓLVORA NA CORTIÇA

Estão por estes dias a celebrar-se os 150 anos da Abolição da Pena de Morte em Portugal. Não sabemos quantas pessoas ligadas a Penacova foram condenadas à pena capital ao longo dos tempos, mas há dois casos que fizeram história: o caso de Luiza de Jesus (natural de Figueira de Lorvão), por ter cometido cerca de 30 infanticídios, e o fuzilamento de 6 penacovenses por envolvimento no episódio da “Queima da Pólvora" na Estrada da Beira, junto à Cortiça.



Luiza de Jesus, uma mulher de 22 anos, ia buscar “enjeitados” à Misericórdia de Coimbra a “pretexto de criação, matando-os e enterrando-os depois, para se aproveitar do enxoval e dos 600 réis de criação pagos adiantadamente!” – pode-se ler na bibliografia sobre o assunto.  Acharam-se enterradas trinta e três crianças, confessando a ré haver garrotado vinte e oito por suas próprias mãos!
Foi atenazada pelas ruas de Lisboa, cortadas as mãos em vida, garrotada e queimada. Corria o ano de 1772. Entre nós a pena de morte era executada geralmente por estrangulamento (forca ou garrote), por degolamento, pela queima do corpo da vitima (vivicombúrio) ou por esquartejamento, atando a vitima pelas quatro extremidades ás caudas de quatro cavalos. De referir também o fuzilamento.
Havia ainda modos de agravar: em vida, o atenazamento, bem como o corte ou mutilação das mãos, o arrastamento da vitima, no percurso, até o sitio da forca. Em casos mais cruéis podia ser arrancado o coração. Depois da morte, era frequente o corte da cabeça, o esquartejamento (as partes eram distribuídas pelos lugares centrais da cidade, ou colocados às portas dela) e noutros casos, era queimado o cadáver.
Assento de Baptismo de Luísa de Jesus (publicado no jornal Expresso)

Saiba mais sobre este caso AQUI e AQUI.

Caricatura representando D. Pedro  e D. Miguel
disputando a coroa portuguesa, por Honoré Daumier, 1833

Passados 61 anos, em 1833, temos notícia do fuzilamento de 6 penacovenses, por motivos políticos: António Homem de Figueiredo e Sousa, natural da Cruz do Souto, freguesia de Farinha Podre,  Padre António  da Maya, natural da Cruz do Souto, freguesia de Farinha Podre, pároco encomendado da freguesia do Covelo de Ázere, Francisco Homem da Cunha, filho de Bernardo Homem e irmão de Guilherme Nunes, do lugar da Cortiça, Francisco de Sande Sarmento, solteiro, natural da Carvoeira, freguesia e concelho de Penacova, Felisberto de Sande, solteiro, natural da Carvoeira, freguesia e concelho de Penacova,  Guilherme Nunes da Silva, filho de Bernardo Homem e irmão de Francisco Homem da Cunha e José Maria de Oliveira, natural da Cortiça, freguesia de Paradela.
Conta-nos Henriques Seco (Memórias do Tempo Passado e Presente – 1880) : “É sabida a perseguição que aos liberais foi feita desde 1828 a 1834. Uma das terras do país que mais sofreu então foi a vila de Midões. Fugindo á perseguição, alguns de entre eles vagavam por diferentes terras da província, e por acaso nos primeiros dias do mês de Agosto de 1832 estacionavam junto à Cortiça (quilometro 42 da estrada de Coimbra a Celorico) onde os povos lhe não eram hostis, e havia também muitos cidadãos comprometidos na causa liberal.”  
Ao fim da tarde do dia 4 de Agosto de 1832, os mesmos liberais foram avisados  que havia chegado à Ponte da Mucela “um troço de quarenta voluntários realistas, vindos de Abrantes, escoltando um comboio de vinte carros com pólvora”. Os liberais envolveram-se e depois de vários episódios (ver AQUI e AQUI) foram perseguidos, presos e por fim, muitos deles, condenados à pena capital. A povoação da Cortiça foi quase totalmente incendiada em 1832 pelas milícias miguelistas que quiseram vingar o assalto ao  combóio de carros de bois carregados de pólvora, proveniente dos paióis de Abrantes e destinada ao cerco do Porto. A pólvora foi seguidamente destruída por explosão nas proximidades da Cortiça e, como não foi possível prender todos os guerrilheiros, sofreram as retaliações os moradores daquela localidade.







Penacova, a Barca Serrana e a Navegação Comercial no Mondego

Mostra de actividades ligadas ao rio e ao barqueiro:
 "Festa do Barqueiro" - Miro  2/7/2017

A navegação comercial no Mondego, que remonta a séculos anteriores, atingiu no século  XVIII um grande desenvolvimento. Prosperidade que se manteve até finais do século XIX quando se iniciou uma fase de decadência, que acabou por levar à sua completa extinção em meados do século XX.

Sobre este tema existe um estudo de Maria Adelina de Jesus Nogueira Seco, apresentado à Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, em 1965, enquanto Dissertação de Licenciatura em Ciências Históricas: “A Região de Penacova e a Navegação Comercial no Mondego: subsídios para a história desta navegação”.

Tem como base de investigação um livro de registo de termos de compromisso dos indivíduos que transportavam mercadorias da região de Penacova, passados pelo escrivão desta mesma vila (1773-74), isto é, um conjunto de “termos de fiança das fazendas que levarem guias dos Portos secos da villa de Penacova para qualquer outra Terra do Reyno”. A este conjunto de documentos atribuiu a autora a designação de “Livro de Penacova”.

É com base no excelente trabalho desta penacovense, já falecida, natural do Casal de Santo Amaro, que iremos tecer algumas considerações.

Termo 85: 24 de Agosto de 1773
 Manuel Antunes do lugar do Salão, termo de Arganil,
22 alqueires de sal, “em direitura a vila de Selurico” no valor de 2500 réis.
As mercadorias que das terras mais distantes do litoral se destinavam ao interior das Beiras, eram transportadas pelo Mondego até ao Porto da Foz do Alva (estamos a falar de finais do século XVIII) e daqui por carreiros ao seu destino. Se pelo contrário a origem era o interior, as mercadorias seguiam o mesmo trajecto, mas agora em sentido inverso. O Mondego era a grande estrada comercial.

Os produtos que chegavam à região de Penacova eram essencialmente sal, louça, peixe, azeite e linho. Por sua vez, vinho, milho, fruta, legumes, carvão, castanha e vinagre eram os produtos mais “exportados”.

O sal era, sem dúvida, o mais transacionado. “Na verdade, enquanto outros produtos existiam em maior ou menor quantidade no interior, o sal só poderia ir do litoral, neste caso das salinas da Figueira.” - escreve Maria Adelina Nogueira Seco. “Em 12 de Agosto de 1773 foram carregados no Porto da Foz do Alva 19 carros e no dia 19 dezassete carros. Muito sal num só dia.” - acrescenta.

Além do sal, encontramos o peixe, sobretudo seco, já que o fresco era difícil de chegar às regiões mais longínquas em boas condições, devido à morosidade dos transportes. Há registos de carregamentos de cavala seca a partir do porto da Foz do Alva com destino a várias partes da província da Beira e também do transporte de carros de sardinha para a feira de Viseu.

A louça, sendo Coimbra um importante núcleo dessa indústria, também ocupava um lugar de destaque no conjunto dos produtos comercializados.

Podemos concluir que o produto mais “importado” era o sal. O mais “exportado” era o vinho, com destino a Coimbra, Baixo Mondego e Figueira. Vinho que seria, na sua maioria, produzido na Beira Alta. No entanto, também havia vinho produzido em terras de Penacova. Da leitura da obra em apreço podemos concluir que em 16 de Dezembro de 1773, José Ribeiro, do lugar de Paradela, termo de Penacova, transportou 2 pipas de vinho - “cujo vinho hé do seu labrado”. Vinho que chegou a ser conhecido por vinho da Figueira, dado que era exportado para o estrangeiro através deste porto. Outros produtos que partiam da região de Penacova com destino a Coimbra e Figueira eram o feijão, a castanha e a fruta da época.

Sabe-se o Porto da Raiva dispunha de verdadeiros armazéns, dos quais nos anos 60 do séc. XX ainda existiam ruínas. Os carreiros que se encarregavam dos transportes eram sobretudo das regiões de Penacova, Coja e Arganil.

Mas não só de mercadorias se fazia a navegação comercial. “As próprias pessoas não só da região mas também as que de cavalo ou de carros de bois chegavam da Beira tomavam aqui as barcas em direcção a Coimbra e a outras terras ao longo do rio.” Por exemplo os estudantes que se dirigiam a Coimbra e pessoas que iam até Buarcos nas férias de Verão.

“A Raiva – afirma Adelina Nogueira Seco - ainda em meados do séc. XIX era considerado o porto mais importante de todo o curso navegável do Mondego” e ”durante o séc. XIX e 1ª metade do séc. XX desempenhou o papel de grande entreposto ligando o litoral com a região beirã.” Remonta a esse tempo o Ramal (Estrada Distrital nº 105) que fazia a ligação, na Catraia dos Poços, à Estrada Real nº 12.

Os documentos (séc. XVIII) estudados por Maria Adelina Seco, apontam para o “Porto da Foz do Alva”. Será que no séc. XVIII a Raiva e Porto da Foz do Alva eram a mesma coisa? Não se sabe exactamente. Outro porto, que não pertencia a Penacova, mas fazia parte de toda a dinâmica comercial da época era o Porto da Foz do Dão. Quando o caudal o permitia desempenhava também um papel importante. O “Livro de Penacova” regista que José Gomes, criado de João Silva, afiançou, em Fevereiro de 1774, uma pipa de vinho que “remete de sua caza (Vale da Vinha) para o porto da fós dão, termo de Ovoa.”

Os barqueiros são também na sua maioria naturais das diversas povoações do concelho. Ainda no principio do século XX a vida de muitos habitantes das povoações ribeirinhas estava ligada ao rio. Já o “Livro de Penacova” referia com frequência pessoas de Oliveira do Cunhedo, Penacova, Carvoeira, Miro, Vila Nova, Raiva…

A abertura do Caminho de Ferro da Beira Alta, em 1882, terá sido a causa principal da decadência da navegação comercial (o caminho de ferro, mas também o assoreamento do rio, entre Coimbra e Figueira, a beneficiação das estradas e o aparecimento de empresas de camionagem). A mesma foi morrendo e nos últimos tempos de atividade só a lenha, a madeira e a carqueja eram transportadas sobretudo para Coimbra e “mesmo estas porque seria mais económico que a camionagem”. Havia (na Raiva) um cais para as pilhas de lenha e da madeira e mesmo “uma construção destinada a cubicagem dessa madeira.”