31 outubro 2019

“Horas de Luto: a Pátria e a República em Crepes”


“Horas de Luto: a Pátria e a República em Crepes”

O funeral de António José de Almeida
António José de Almeida morreu a 31 de Outubro de 1929, faz hoje 90 anos. O jornal  A Voz de S. Pedro de Alva, na edição de 16 de Novembro,  noticia com grande destaque: ''A Pátria e a República em Crepes: morreu o Dr. António José de Almeida. Está de luto a Pátria e a República, está de luto o coração dos portugueses!''

Conta aquele quinzenário que "assim que em S. Pedro de Alva, terra do venerando democrata, se soube do tristíssimo acontecimento, os seus conterrâneos vestiram de luto.” A bandeira nacional, “envolta em crepes”, foi hasteada “a meia adriça” na sede do jornal, ao mesmo tempo que “eram expedidos muitos telegramas de pêsames à família do egrégio cidadão.”

“Ainda há poucos meses o ex-presidente da República, em carta, nos dizia que, quando estivesse melhor dos seus padecimentos, escreveria umas linhas para o nosso jornal” – recorda A VOZ DE S. PEDRO DE ALVA. Naquela missiva terá escrito António José de Almeida que aquele periódico era  “uma gazeta interessante, despretensiosa e séria. E para mais, estruturalmente republicana.”

O quinzenário publicado em S. Pedro de Alva (tendo como Director Francisco Cordeiro dos Santos, e como editor e administrador, Eduardo Pedro da Silva) descreve os últimos momentos de vida de António José de Almeida, bem como o funeral civil que teve a participação de cerca de trezentas mil pessoas.

Enviaram pêsames, por intermédio de A Voz de S. Pedro de Alva: Francisco Cordeiro dos Santos, Rodolfo Martins Gomes, António Maria Marques, José Maria Marques, Alípio Simões Bispo, Antero Gomes Fróis, José Cunha Martins, Joaquim Marques Cordeiro, Joaquim Marques Morgado, Aníbal Ramos, António Jorge dos Santos, António Henriques da Fonseca, Abel Lopes Figueiredo, Marques Basso, Valentim Ramos, Júlio dos Santos, Martinho de Paiva, Francisco Fonseca Lourenço, António Costa Figueiredo, Hermenegildo Pereira, Joaquim Pereira Castanheira, Francisco Cunha Martins, José Alberto Coimbra, Oliveira Nascimento, José Campos Ribeiro, Augusto Sousa Gonçalves e António Pereira da Costa. Em nome da Junta de Freguesia, Campos Ribeiro, presidente, também endereçou mensagem de pesar através de telegrama.

A Voz de S. Pedro de Alva não poupará elogios póstumos a este seu ilustre conterrâneo, dizendo que este fora um grande "apóstolo da Democracia” e que  “tinha um altar em todos os corações portugueses''.

José de Oliveira e Costa escreverá que, perante o grande abalo que acabava de sofrer o país e ''sobretudo a grande massa liberal'' havia que destacar o carácter bondoso deste vulto que ''professava a religião do Bem por interesse do próprio Bem''.

Eduardo Silva (sobrinho de Eduardo Pedro da Silva), no artigo ''Horas de luto'' destaca também as qualidades de António José de Almeida, "o homem de palavra brotando da sua alma límpida, que na tribuna arrastava multidões em delírio de fé e patriotismo".

A morte de António José de Almeida também é notícia em grande destaque na edição de 2 de Novembro do Jornal de Penacova:  " Morreu! Descubramo-nos perante o seu cadáver. Curvemo-nos em respeito e admiração. É o cadáver de um grande português. É o cadáver de um homem honradíssimo. A república portuguesa perdeu um dos seus soldados mais valorosos e um dos seus filhos mais ilustres."

Eduardo Silva, que era à data o redactor deste periódico, escreverá:

“O dr. António José de Almeida era nosso conterrâneo. Nasceu além, na freguesia de S. Pedro de Alva, num lugarzito, lindo e pitoresco, que se chama Vale da Vinha. Lá está o seu solar que nos desperta lembranças da sua mocidade indómita de combatente pelo ideal republicano, desde os seus mais verdes anos.[…] Foi um grande português, homem de uma honestidade intransigente, a sua vida não teve mancha a diminuir o seu valor e o seu prestígio, o seu carácter de fino e puro quilate esteve sempre de pé mantendo-se numa integridade absoluta."

Em S. Pedro de Alva, por iniciativa do professor Joaquim dos Santos Cordeiro, foi colocado na escola do sexo masculino o retrato de António José de Almeida, oferta do ''fervoroso republicano” Eduardo Pedro da Silva.

A Câmara de Penacova, que se fez representar no funeral por António Rodrigues do Amaral, residente em Lisboa, aprovou um "voto de profundo pesar".

21 outubro 2019

Festas das Santas Rainhas em Lorvão comemoram a trasladação para os túmulos de prata em 1715

Comemorando a trasladação das infantas Teresa e Sancha, beatificadas em 1705,  dos túmulos de pedra para urnas de prata, todos os anos se realizam em Lorvão as tradicionais “Festas das Santas Rainhas”.
No livro “As Freiras de Lorvão” Lino d'Assumpção faz uma descrição bastante completa daquele acontecimento. Aquele acto solene, a que assistiram o Bispo de Coimbra e seu Cabido, o Senado daquela cidade, o Abade Geral, diversos abades cistercienses e grande multidão, realizou-se a 19 de Outubro de 1715.

"Findos os três dias de festa, os cofres foram levantados do altar onde elas se conservaram e colocados nos camarins que lhes estavam preparados na capela mor; o de D. Tereza do lado do evangelho, e o de sua irmã do lado da epistola."

Também neste ano de 2019 se cumpriu a tradição. Com a devida vénia, transcrevemos da página do facebook do Dr. José Rodrigues Pisco, guia do mosteiro,  a descrição das festas deste domingo:

Um dia em Lorvão nas Festas em Honra de Santa Teresa e Santa Sancha filhas de Dom Sancho I

"Hoje dia 20 de Outubro, realizaram-se as Festas em honra de Santa Teresa e Santa Sancha, filhas de Dom Sancho I, no mosteiro de Santa Maria de Lorvão. Participaram com muita fé e devoção na missa e na procissão as Irmandades de Lorvão, Arouca, Santa Clara a Nova, Santo Izidoro de Leon, Espanha, Santa Maria de Celas e as capelas da Paróquia. Participaram na solene Missa autoridades civis e religiosas do concelho. Presidiu o Senhor Padre João Paulo Fernandes da Unidade Pastoral das Terras de Santa Maria. A cerimónia decorreu com grande dignidade com o Grupo de Coral da Freguesia de Lorvão e Grupo Etnográfico de Lorvão a cantarem cânticos de Louvor às Santas Rainhas.

Depois decorreu a procissão no Jardim do Mosteiro segundo a vetusta tradição após a qual decorreu na Igreja a bênção do Santíssimo Sacramento.Seguiu-se o almoço convívio no Mosteiro. Da parte da tarde, assistimos a um excelente Concerto com os Coros Divo Canto de Penacova e de Niort (França) que abrilhantaram as Festas das Santas Rainhas Teresa e Sancha com instrumentistas e vozes fantásticas.

Para terminar conduzi uma visita guiada aos nossos amigos franceses de Niort que ouviram com atenção a História do Mosteiro de Lorvão e se deliciaram com os encantos do Claustro.do Coro com o magnífico Cadeiral, o Antecoro, a Grade que separa a Igreja do coro, a porta artisticamente trabalhada da entrada na Igreja, a própria Igreja com as telas de Pascoal Parente do séc XVIII, os Túmulos de Prata de Santa Teresa e Santa Sancha e as preciosidades da Sala do Capítulo. Agradeci a visita e desejei-lhes uma boa noite e boa viagem de regresso a França.

Quanto a vós que ledes este artigo, recomendo-lhes que venham visitar o Mosteiro de Lorvão para fazerem uma visita guiada como uma viagem no tempo, interativa e com uma História e um Património que são únicos apenas pelo módico preço entre 1 Euro e 1.50 Euros. Não se arrependerão. Serão bem vindos.

Lorvão, 20 de Outubro de 2019, José Rodrigues Pisco

07 outubro 2019

Outubro de 1919: Mês a mês com Portugal durante o mandato presidencial de António José de Almeida


Propomo-nos, mês a mês, de Outubro de 2019 a Outubro de 2023, publicar a cronologia dos principais acontecimentos políticos ocorridos em Portugal no período correspondente ao mandato presidencial de António José de Almeida (1919-1923).
OUTUBRO 1919
5 ANTÓNIO JOSÉ DE ALMEIDA toma posse do cargo de PRESIDENTE DA REPÚBLICA. prestando o seu compromisso de honra perante o Congresso. Fora eleito Presidente da República na sessão do Congresso de 6 de Agosto de 1919, ao fim do terceiro escrutínio.

A Federação Maximalista Portuguesa (FMP), lançou a sua publicação semanal, A BANDEIRA VERMELHA, um jornal que se tornou muito popular entre as classes trabalhadoras portuguesas chegando mesmo a atingir uma tiragem de 6.000 exemplares.

Criado o PARTIDO REPUBLICANO LIBERAL, tendo como base os partidos evolucionista e unionista, que se tinham dissolvido em fins de Setembro. Estando os líderes dos dois anteriores partidos no desempenho de cargos políticos de relevo (António José de Almeida, eleito para a Presidência da República e, Brito Camacho, nomeado Alto-Comissário da República em Moçambique, os Liberais escolheram António Granjo para seu líder. No entanto, este viria a ser assassinado em 19 de Outubro de 1921, pelo que teve uma existência efémera.

Reúne o CONGRESSO para eleger o Conselho Parlamentar. Nesta sessão esteve presente o Senador Júlio Ernesto de Lima Duque (ligado a Penacova).

António Granjo é eleito líder parlamentar dos liberais. Nesse dia, Júlio Martins, ex-evolucionista, anuncia a constituição do grupo parlamentar popular. Terá o apoio de alguns grupos de radicais democráticos.

13 Vários grupos sidonistas aderem ao Partido Liberal. O directório do PARTIDO NACIONAL REPUBLICANO aconselha a dissolução do mesmo, liderado por Egas Moniz. Idêntica posição toma a facção que se lhe opunha, dirigida por Feliciano Costa.

20 Os Integralistas anunciam no jornal ”A MONARQUIA” que se desligam da obediência a D. Manuel II.

GREVES por todo o país. Greve dos barbeiros em Lisboa. Da construção civil em Guimarães. Dos descarregadores de terra no Porto. Dos soldadores em Olhão. Dos operários conserveiros em Setúbal. Dos carniceiros em Faro

BOMBAS na Marinha Grande e contra um comboio no Porto.

26 “A Bandeira Vermelha” proclama fazer em toda a parte a APOLOGIA DA REVOLUÇÃO RUSSA.

29 O decreto n.º 6184 cria o CONSELHO DE PATRIMÓNIO ARTÍSTICO, órgão consultivo acerca da “distribuição, apropriação, destino, reconstituição e restauro dos bens móveis e imóveis de valor artístico, histórico ou arqueológico”.

FONTES:
http://www.fmsoares.pt/aeb/crono/id?id=039810
http://www.arqnet.pt/portal/portugal/liberalismo/lib1919.html
http://maltez.info/respublica/Cepp/governos_portugueses/i_republica/sa_cardoso_1919.htm

04 outubro 2019

5 de Outubro de 1919: António José de Almeida toma posse como PR

Páginas da "Ilustração Portuguesa"

No dia 5 de Outubro de 1919, por volta das 14 horas, depois de encerrada a sessão, o Presidente do Congresso, da varanda central do Palácio, anunciou que o Presidente da República, depois de haver prestado perante o congresso o compromisso de honra, estava investido no seu alto cargo.

Refere a Acta da Aclamação que “esta comunicação foi recebida com entusiásticos e longos aplausos da parte do povo e das pessoas que tinham tomado lugar na varanda bem como nas outras janelas do palácio.”

Então, António José de Almeida, “em voz clara e forte” dirigiu-se às pessoas que o aguardavam, dizendo:

“Venho de afirmar pela minha honra, lá dentro, na Casa do Congresso, que hei de servir com dedicação e amor a República Portuguesa, respeitando integralmente a sua Constituição.
Agora, pela minha honra também, afirmo ao povo de Lisboa e, por seu intermédio, a todo o Povo Português que, através dos maiores sacrifícios e vicissitudes, hei de cumprir os deveres sagrados a que me comprometo
Nasci do Povo e toda a minha vida o tenho servido e amado. Não me esquecerei jamais dele. E, mais do que nunca, todas as energias da minha vida vão ser postas ao serviço incondicional da Pátria e da República. Viva a República! “

Publicamos de seguida o discurso proferido por António José de Almeida na tomada de posse, nesse dia em que se completavam 9 anos após a Revolução de Outubro.

                                              
                                         O DISCURSO DE TOMADA DE POSSE

"Agradeço ao Congresso da República Portuguesa a alta honra que me dispensou, elegendo-me Chefe do Estado.
Sou um homem simples e modesto, sem qualidades que o distingam nem predicados que o imponham. E se fui elevado ao alto cargo que me encontro, a dignidade que me concederam só pode ser atribuída à benevolência de quem me elegeu e porventura ainda à circunstância de o Congresso querer mostrar que não se esquecia da minha dedicação à causa pública, e da persistência convicta, inalterável e tenaz com que, nesta casa do Parlamento, defendi, sem um desfalecimento, e nas condições mais variadas, a legítima causa dos Aliados, a que sempre considerei indissoluvelmente ligada à nossa sorte de povo livre.
E, procedendo assim, o Congresso quis significar, sem dúvida, que, perante aquelas razões fundamentais, não prevaleciam razões de ordem secundária, que, todavia, anteriormente, exerceram influência na vida e marcha do Estado. De facto, eu mantive-me, até à última hora, na política activa, exercendo uma acção combativa na imprensa e na tribuna parlamentar e popular. Até à ultima hora estive à frente dum bravo e generoso partido, que, embora ligado por fortes laços de camaradagem patriótica aos outros agrupamentos políticos, tinha a sua doutrina peculiar e adoptava processos que acentuadamente lhe pertenciam.
Apesar disso, o Congresso deliberou escolher-me para, numa República parlamentar, em que o Chefe do Estado se deve conservar alheio a todas as lutas e paixões, presidir aos destinos da Nação, a que se condicionam todos os destinos partidários. Este facto, que não deve ser olvidado, significa que a República Portuguesa está na resolução de pôr acima dos interesses de grupo, os interesses genéricos da Pátria, e que só passageira e superficialmente se deixará impressionar pela modalidade técnica da política dos homens, para apenas ter em conta a superior expressão do seu patriotismo, contanto que eles sejam merecedores, pela sua lealdade, da confiança com que os honrem.
Mais ainda do que o galardão que me conferiu, eu agradeço ao Congresso a segurança que atribuiu ao meu carácter e a certeza antecipada que se criou de que eu, no alto cargo a que ascendo, serei imparcial e sereno, sem outra paixão que não seja a do engrandecimento da Pátria e sem outro sentimento que não seja o do amor à República.
Não se há-de iludir o Congresso. Aqui cheguei sem qualquer espécie de tergiversação ou doblez. A nenhuma convenção ou pacto anterior tenho de subordinar os meus intuitos, a não ser àquele pacto fundamental que regula toda a vida da Pátria: a Constituição. Essa, sim, respeitá-la-ei sempre, servindo-a ao mesmo tempo com consciência e amor, e de maneira tal que eu, zelando-a, a engrandeça, e, engrandecendo-a, não deixe de a zelar, até mesmo naquilo que são atribuições minhas, das quais não cederei jamais, na compreensão de que, se seria um atentado invadir a esfera dos outros, seria uma defecção consentir que os outros apoucassem ou deprimissem os direitos que me pertencem.
Tomei o meu compromisso há pouco. Aqui o formulei em voz bem alta, dando-lhe a garantia da minha honra e aí fica ele escrito sob a responsabilidade do meu nome. Saberei cumpri-lo.
É bem difícil o momento em que assumo a Presidência da República. O mundo, abalado nos seus fundamentos pela Grande Guerra, durante muito tempo procurará debalde a fórmula do seu equilíbrio. Portugal que, cavalheirosamente, se envolveu na luta, ressente-se dos estragos que a furiosa devastação produziu nas suas finanças e na sua economia. Estamos num momento agudo da nossa história, e, porventura, esse momento é decisivo. Mas não devemos preocupar-nos além daqueles limites em que são legítimos a prevenção e o receio, como estímulo de energias adormecidas.
O país tem condições de vida que são suficiente garantia do seu futuro. Com trabalho ordeiro e disciplinado e com uma economia severa, pautada pelas mais austeras normas de moralidade administrativa, triunfaremos de todas as dificuldades. Tenhamos essa fé, essa certeza. Qualquer palavra de desânimo será criminosa. Erradamente se costuma dizer que o país é pequeno, parecendo ignorar-se que somos a terceira nação colonial, com imensos tractos de terreno virgem, onde se acumulam as mais extraordinárias riquezas. E quando os defectistas dizem que a raça é indolente, eles fingem ignorar as provas de vigor que ela tem dado sempre e ainda agora está manifestando, na ânsia indomável com que deseja acompanhar o movimento de renovação que vai pelo mundo.
Mas, para que o país possa desenvolver-se com intensidade e harmonia, é preciso que gozemos duma paz sem sofismas, e essa só é possível numa atmosfera de ordem, fecunda e acolhedora.
Para que essa atmosfera se crie pela solidariedade de todos, empregarei os melhores esforços e farei os melhores sacrifícios. Conto com o êxito. Acalmando as paixões, apaziguando as cóleras, moderando as ambições dos homens e estimulando as suas energias, o seu amor ao trabalho, o seu poder de iniciativa, conseguirei, pela concórdia e persuasão, aquilo que afinal tem sido o lema político de toda a minha vida: a Paz.
Alheio às lutas políticas, só nelas intervirei com o fim de as acalmar e aproveitando sempre o estímulo patriótico que delas derive. Respeitador de todas as ideias políticas e religiosas dos portugueses, como é próprio da minha tradição e do lugar que vou ocupar, só combaterei, segundo os ditames da Constituição, quem atentar contra a República, e, então, não defenderei só o Estado republicano, mas defenderei, como me cumpre, a própria doutrina republicana.
O âmbito da minha acção política é — eu o sei — pequeno. E não sou eu homem que em caso algum o ultrapasse. Mas a esfera da minha influência moral pode ser vasta, enorme. E é precisamente essa grande e por vezes dominadora influência que eu vou empregar na missão elevada de conciliar os cidadãos portugueses.
Respeitador, por índole e dever, da Soberania Nacional, a minha acção de Chefe de Estado vai cifrar-se na palavra Fraternidade.
Só assim poderei dalguma forma merecer a liberalidade com que me haveis honrado, elegendo-me, e só dessa maneira eu serei digno da satisfação, por tantos modos revelada, com que a Nação aplaudiu esse acto.
Fui o presidente do Governo da União Sagrada. Esse facto impõe-me obrigações que corajosamente aceito, e aponta-me um caminho que intrepidamente seguirei. Na minha fé sagrada, apesar da perturbante emoção que então senti, não tive um momento de hesitação ou desalento quando se tratou de sujeitar o país às provas dolorosas duma guerra atroz. Servindo a Pátria nos seus altos destinos e obedecendo às vozes da Raça, contribuí para que Portugal, graças ao heroísmo do seu exército e da sua marinha, assegurasse, com a integridade do seu território, a prosperidade e benefícios duma honrada independência.
Agora, com devoção igual me dedicarei inteiramente à missão pacifica de harmonizar os meus compatriotas, trabalhando pela Paz com o mesmo afã patriótico com que empreguei todas as minhas energias nas horas angustiosas da guerra.
Só assim corresponderei ao vosso mandato e só assim não serei amaldiçoado pela memória daqueles que dormem o glorioso sono sob a terra em que, defendendo a Pátria, caíram prostrados.
Que a vossa benevolência e o vosso autorizado conselho me não faltem, Senhores Congressistas. Que me não falte o agasalho fraternal do Povo. Que não me falte, em suma, a confiança generosa da Nação. E contanto com esse amparo, que é ao mesmo tempo estímulo e fortaleza, deste lugar, onde imerecidamente cheguei, saúdo todos os Portugueses sem excluir ninguém, na sentida aspiração de ver a Pátria engrandecida — a Pátria a cujas virtudes, a cujo prestígio, e a cuja glória rendo, neste momento, uma suprema homenagem, vitoriando-a no seu símbolo supremo:
Viva a República Portuguesa!

[Proferido na Câmara dos Deputados do Palácio de São Bento, a 5 de Outubro de 1919. Conforme transcrito no Diário do Congresso, Sessão N.º 8 (5 de Outubro de 1919).]