Publicamos hoje o terceiro texto de um conjunto de escritos sobre Lorvão.Já transcrevemos a opinião, que consideramos injusta, de Magalhães Colaço (1913) e também o relato de Lino d´Assunção (finais do séc. XX). Agora, um trecho de Emídio da Silva, publicado em 1909.
"O Mosteiro de Lorvão foi um
dos mais notáveis do país e apesar de se encontrar hoje (1909) em ruínas, e
mesmo arrasado em parte, é ainda um monumento de subido valor histórico e um
repositório de arte muito curioso e interessante. O convento fica ao fundo de
um estreito vale, ocupando um local aprasível que se nos impõe pela sua austera
beleza e que podia ser no Verão concorridíssimo, dada a frondosa arborização da
encosta adjacente ao mosteiro e a frescura dos deliciosos mananciais de água que
vêm dos granitos da montanha.
Mas a laboriosíssima aldeia não
tem sequer ainda uma estrada que a ligue às outras do país e para se ir lá, de
Penacova, pela estrada do Botão, tem de se deixar esta dois ou três quilómetros
de Penacova e seguir a pé ou em burro por uma extensa ladeira que leva a descer
30 minutos!...
E no entanto, Lorvão bem merecia
que os poderes públicos tivessem olhado um pouco mais para ela pois a simpática
aldeia não vive passivamente da tradição dos seus monumentos, como outras de
Portugal mas do constante e esforçado labor dos seus filhos que desde os de
mais tenra idade até aos da mais provecta, se dedicam inteiramente à fabricação
dos palitos de dentes, que tem ali o maior centro de produção do concelho de
Penacova, do qual constitui, como é sabido, a indústria mais importante.
Mas se os poderes públicos deixam
quase ao abandono os restos do grandioso mosteiro que é um monumento nacional !
O seu pitoresco claustro foi demolido e as cantarias vendidas ou roubadas! No
esplêndido templo, de grandes e nobres proporções chove como na rua e o
magnificente coro que é um dos melhores exemplares da nossa época do rococó
está destinado a desaparecer, atacado pelo caruncho ou pelas mesmas mãos que
destruíram o claustro…
Quando vou a Lorvão e ainda lá
encontro perdida naquelas ruinas solitárias, como um náufrago que escapou a cem
porcelas, a custódia de prata dourada guarnecida de pedrarias – uma relíquia da
nossa arte sumptuária do século XVIII – esquecida e inapreciada na vasta
igreja, hoje sertaneja, e vejo ao mesmo tempo abandonados os sarcófagos de
prata que contêm os restos das infantas, filhas de D. Sancho I, não posso
deixar de fazer as mais amargas reflexões acerca da conservação que Portugal
dedica aos seus monumentos."
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