03 janeiro, 2020

O Mondego e a bela Penacova


As águas do Mondego esgueiram-se em corrida pelo leito abaixo, com a ânsia de chegar ao seu destino… Contudo, antes disso, têm de passar apressadamente por entre as margens verdejantes e estonteantes daquela vila, que fica lá no alto. Ó doce e delicada paisagem, como se tivesse saído diretamente de uma aguarela pitoresca!...
Do lado direito, vê-se, lá no cimo do monte, o mirante, o hotel e todas as casinhas e ruelas da bela Penacova. Ainda se vê a aldeia da Ponte, ao fundo do monte, rodeada e aconchegada pela densidade da natureza… E, cá em baixo, todos estes pormenores são espelhados no leito do rebelde Mondego, numa simetria perfeitamente esplêndida. Do lado esquerdo, vêem-se os campos cultivados, em relevos e contrastes verdes e acastanhados. Bem junto das águas apressadas fica a pista de pesca de Vila Nova, num longo carreiro ladeado por imponentes choupos, como se tivessem sido ali bordados, estando estes também refletidos no rio. O céu azulado e o brilho quente do sol abraçam todo aquele cenário, completando o enquadramento que parece pintado…  E mesmo quando o nevoeiro desce e embala Penacova, o ar místico que lhe encerra concede a este quadro uma melancolia ternurenta… Um toque de fantasia.
Continua a correr ó Mondego, que mais à frente hás-de passar no Reconquinho, que também te aguarda, com o seu areal que vem beijar a tua margem. E não te esqueças de olhar lá para o alto, que a Pérgola, toda vaidosa e enfeitada com as suas trepadeiras, anseia pela tua passagem e, lá do cimo, te acena e te deseja boa viagem. Olha de mansinho e discretamente a paisagem estonteante que todos os dias te aguarda… Namorisca um pouco e secretamente com ela. Mas corre, Mondego, para não te atrasares e leva contigo um pouco desta beleza sem par. Recorda-te da pacata vila a que beijas os pés todos os dias. E leva também um pouco das suas humildes gentes, que todos os dias te olham com a mesma admiração. Vai… E quando chegares ao mar sussurra-lhe ao ouvido a tua paixão e namoriscos secretos com a bela Penacova, que nós também não contamos a ninguém!...

Mariana Assunção


NR: Mariana Assunção publicou em 2014 o romance “Eternamente” e em 2017 “Eternamente II, com a chancela da Chiado Editora. A sua paixão pela escrita desde cedo se revelou. Com apenas onze anos, obteve um quarto lugar num concurso a nível nacional. Também gosta de escrever poesia.
É com muito gosto que publicamos hoje a sua primeira colaboração no PenacovaOnline.


13 dezembro, 2019

As paisagens e as gentes de Penacova na pintura de José Campas (1888-1971)

"Intimidade", 1932 . José Campas
Óleo sobre madeira (0,33x0,24)

Há poucos dias, em visita ao Museu José Malhoa, nas Caldas da Rainha, deparámo-nos com um quadro pintado em Penacova por José Campas.

Trata-se de um retrato de senhora intitulado ”Intimidade” (0,33x0,24). Com data de 1934 está assinado “J Campas”. De acordo com informação do Museu, encontra-se no verso, manuscrita em etiqueta timbrada, a indicação de que fora oferecido ao Museu José Malhoa em 1934 e que foi pintado em Penacova.

José de Sousa Ferreira Campas (1888-1971) [1] já é conhecido dos penacovenses. No livro “Patrimónios de Penacova” da autoria de Joaquim Leitão Couto e David Almeida (2012) consta a referência a este pintor que registou nas suas obras as paisagens e as gentes de Penacova.

Foi autor de vários quadros relacionados com o concelho: "Mirante Emídio da Silva", "Paliteira e Tricana", "Trecho do Mondego", "Entre Penacova e Rebordosa", entre outros. Está representado em vários Museus Nacionais e a Câmara Municipal possui um quadro deste pintor, representando o Mirante, oferecido por Emídio da Silva em 1916 quando, acompanhado pelo arquitecto Raul Lino, veio estudar o projecto de construção da Pérgola.

"Mirante Emídio da Silva", 1916 

A ligação de José Campas a Penacova já vem, se não de antes, pelo menos de 1914. Nesse ano esteve aqui durante um mês e no final (por ocasião do casamento elegante de Alberto de Castro Pita) expôs no Salão do Palacete da Quinta de Santo António (actual Casa do Repouso) pertencente ao casal Joaquim Augusto de Carvalho e Raimunda Martins de Carvalho.

Refere o Jornal de Penacova de 12 de Setembro de 1914 que estiveram expostos catorze quadros pintados em Penacova onde se destacavam "O Velho Aldeão", "Velha Fiando", "Paliteira e Tricana", "Trecho do Mondego", "Ruas da Aldeia", "As Lavadeiras" e "Mirante Emídio da Silva".

Sobre este quadro, diz o periódico que se trata de "uma pequenina tela de desenho rigoroso e de quente colorido, com um fundo em que a poeira luminosa do sol de verão doira a folhagem virente".

A senhora retratada em “Intimidade” tratar-se-á de alguém de Penacova?

No Museu José Malhoa podemos também admirar um quadro de Martins da Costa “Entardecer no Escorial” datado de 1946. 

"Entardecer no Escorial", 1946
Pintura (óleo sobre madeira) de Martins da Costa

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[1] JOSÉ de Sousa Ferreira CAMPAS, Pintor, natural de Lisboa, nasceu a 14-06-1888 e faleceu a 04-01-1971. Cursou  Pintura na Escola de Belas-Artes de Lisboa, obtendo o Prémio Anunciação em 1905-1906. Estagiou em Paris, onde expôs com êxito de 1918 a 1922. Foi discípulo de Carlos Reis, Jean Paul Laurens, Léon Bonnat, Raphael Collin e J J Duval.

Com os seus quadros recebeu honrosos galardões, como a 1ª medalha em pintura na Sociedade Nacional de Belas-Artes, estando representado no Museu Nacional de Arte Contemporânea.

Foi delegado de Portugal  na Exposição Internacional de Paris, em 1935. Foi Professor do Ensino Técnico, tendo sido Director das Escolas Técnicas de Lagos e de Abrantes.

O seu nome faz parte da Toponímia de Almada (Freguesia da Charneca de Caparica), Cascais; Lagos e Lisboa (Freguesia de Santa Maria dos Olivais).

04 dezembro, 2019

Mês a mês com o Portugal da I República (mandato presidencial de António José de Almeida)

DEZEMBRO DE 1919

1 Em carta dirigida a Aires de Ornelas, D. Manuel II critica o procedimento dos integralistas - Junta do Integralismo Lusitano declarou-se desobrigada de lealdade para com o antigo monarca em Outubro de 1919)

2 Decreto nº 6263 que agrava sobretaxas da importação, estabelece a liberdade das exportações e restringe as remessas de fundos e títulos em ouro para fora do país. Criado um Conselho Fiscalizador do Comércio Geral e Câmbios

18 Encíclica de Bento XV aos prelados portugueses, onde o Papa apoia expressamente a criação do do Centro Católico Português.

19 Descoberto em Lisboa um arsenal que se situava numa dependência de uma escola primária.

22 Cunha Leal critica o decreto de 2 de Dezembro que vem a ser modificado no dia 20, conforme o pedido de várias forças vivas. No dia 22, os ministros das finanças, da agricultura e do comércio pedem a demissão por causa deste processo.

26 Afonso Costa é feito doutor "honoris causa" pela Universidade de Estrasburgo.

29 Sá Cardoso, em entrevista ao Diário de Notícias, refere a existência de agitadores no seio da classe operária.

30 Estabelecido o regime do processo sumário para matérias relacionadas com géneros açambarcados ou adulterados.

E ainda…

Em Dezembro de 1919 forma-se o primeiro doutor em Direito por Lisboa, Jaime de Gouveia. Havia cursado em Coimbra.

Greves em Lisboa do pessoal dos eléctricos, dos pasteleiros, dos cozinheiros e dos trabalhadores do mar.

Bombas em Lisboa, Coimbra e Porto.

São afastados pelo governo na sequência de movimentações monárquicas alguns professores da universidade de Coimbra: Oliveira Salazar, Carneiro Pacheco, Fezas Vital, Magalhães Colaço e Gonçalves Cerejeira.

Surge a Legião Vermelha, à qual irão ser atribuídos a maioria dos atentados que ocorreram até 1925
A epidemia de tifo fez 2282 vítimas neste ano.

Existiam em Portugal 5000 automóveis e 2500 assinantes de telefone.

FONTES: http://www.fmsoares.pt/aeb/crono/id?id=039810
http://www.arqnet.pt/portal/portugal/liberalismo/lib1919.htm
http://maltez.info/respublica/Cepp/governos_portugueses/i_republica/sa_cardoso_1919.htm
História de Portugal em Datas (Círculo de Leitores)