quinta-feira, março 23, 2023

Lugares, monumentos e sítios de Penacova (13): Capela de S. João

Capela de S. João, 2023

A capela de S. João, na vila de Penacova, datada de finais do século XVI, integra-se no tipo de arquitectura Maneirista / Barroca.

Com uma planta longitudinal simples, apresenta telhado de duas águas, nave, capela-mor e alpendre.

O alpendre tem 3 arcos, tendo o do lado da estrada sido aberto aquando da abertura do arruamento contíguo ;

O espaço interior tem cobertura de madeira, sendo iluminado por quatro frestas, duas nas paredes laterais e duas na frontaria. Umas apresentam molduras barrocas da segunda metade do séc. XVIII e outras são de remate contracurvado.

A fachada principal, que está voltada a Sul, pode ser descrita como “de pano único entre cunhais apilastrados e empena triangular, rasgada ao centro por um arco de volta inteira.”

A porta de entrada é rectangular. A verga tem a inscrição “S. SEBASTIANVS / 1581”, depreendendo-se que originariamente era dedicada àquele Santo, cuja imagem, em pedra, marca presença no retábulo maneirista, também daquela rocha.

O retábulo que tem dois nichos entre três pilastras e as imagens de São Sebastião, como referimos, e também em pedra, a de São João Baptista, em tamanho maior que a do outro Santo.
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Fontes: 
Inventário Artístico de Portugal
Direção-Geral do Património Cultural









sábado, março 04, 2023

Município marcou presença na BTL: apresentado novo vídeo promocional



O Município de Penacova estreou na BTL (Bolsa de Turismo de Lisboa) um novo vídeo promocional, ao mesmo tempo que apresentou os eventos para 2023 e o projeto do  Hotel em Lorvão (hotel de cinco estrelas que está previsto “nascer” no Mosteiro de Lorvão, monumento nacional que vai ser transformado em unidade hoteleira de luxo através de um investimento privado de 11 milhões de euros.

A apresentação teve lugar no stand da Comunidade Intermunicipal da Região de Coimbra (CIM-RC), na Feira Internacional de Lisboa (FIL) e foi replicada, na parte da tarde, no stand do Turismo Centro Portugal. A Casa do Concelho de Penacova recebeu a comitiva do Município de Penacova para assistir à mesma apresentação. Durante as apresentações, a pastelaria "O Mosteiro", de Lorvão, e a "Rota da Bairrada" farão, respetivamente, uma degustação de doces conventuais e de vinhos.

ver Fonte

 

segunda-feira, fevereiro 27, 2023

Personalidades (2): Abel Rodrigues da Costa


Abel Rodrigues da Costa nasceu em Penacova no dia 20 de Agosto de 1902. Neto paterno de Bento da Costa e Maria Carolina e materno de Luís Rodrigues Perpéctuo e Ana de Jesus. Os pais, Libório da Costa, barqueiro, e Maria Cândida, doméstica, eram naturais e residentes  na vila.  

Emigrou para o Brasil quando tinha 21 anos, onde já se encontravam dois irmãos. No Rio de Janeiro destacou-se como empresário da indústria de carnes verdes, celebrizando-se com a marca “O Porco que Ri”. A firma “Abel Rodrigues da Costa & Cª Lda” era proprietária do “Açougue Universal” e das filiais “Grande Açougue da Lapa” e “Salsicharia Olímpica”.

Além da actividade empresarial, foi presidente da Casa das Beiras e Beneficência Portuguesa e membro das direcções  do Ginásio Clube Português e do Clube Português de Leitura, no Rio de Janeiro.

Abel Rodrigues da Costa foi condecorado em 1953 pelo Estado Português com a distinção de “Cavaleiro da Ordem de Benemerência”.

Visitava a sua terra natal com bastante frequência, contribuindo com avultadas verbas para a concretização de muitas obras públicas, apoio a instituições e donativos regulares a pessoas carenciadas. A ele muito ficaram a dever a Câmara Municipal, os Bombeiros, a Misericórdia (principalmente  o Hospital), a Filarmónica, a Igreja e as Capelas.

Em 1947, o Comendador Abel Rodrigues da Costa ofereceu à Câmara 30 000$00 para o ajardinamento do Terreiro e, mais tarde, 500 contos para apoio construção de parque de estacionamento entre a Pensão Avenida e a Capela de S. João.

Em 1946, a 15 de Agosto, aquando da sua primeira visita depois de ter emigrado, foi homenageado no Salão Nobre dos Paços do Concelho. 

Na segunda metade da década de cinquenta do século passado, foi atribuído o nome da Abel Rodrigues da Costa à artéria que liga a capela de S. João à Igreja Matriz. Também nesta altura, mais do que a placa toponímica, se entendeu que seria de toda a justiça a edificação de um busto em local central da vila. Proposta  que nunca chegou a ver a luz do dia.

Em 1951, no contexto do Cortejo de Oferendas para o Hospital da Misericórdia, coordenou no Brasil uma subscrição que rendeu 70 000$00, uma verba bastante significativa para a época.

Visitou novamente Penacova em 1952. Recebido entusiástica e solenemente em 7 de Junho foi homenageado, na hora de voltar ao Brasil, com um Jantar de Despedida que teve lugar na Pensão Avenida. 

Em 1956 veio a Penacova e voltaria em 1969  mais uma vez à sua terra natal oferecendo 5000$00 à Misericórdia e dinheiro para ser distribuído pelo Natal a pessoas necessitadas. Aos Bombeiros ofereceu o seu automóvel para ser sorteado em favor da Corporação. Deixou ainda  200 contos para a estrada no interior da Cheira e 1000$00 para o Notícias de Penacova. 

No dia do 80º aniversário, em 1982, Abel Rodrigues da Costa encontrava-se em Penacova. A Câmara, presidida pelo Dr. Joaquim Leitão Couto, prestou-lhe uma homenagem, visitando-o na sua residência e manifestando-lhe o reconhecimento concelhio pelo apoio ao Hospital da Misericórdia, ao embelezamento do Mirante, aos Bombeiros e a muitos penacovenses com dificuldades económicas. 

A ele se deveu também a compra de todo o equipamento para a sala de operações do Hospital (1951), o apoio ao Asilo de Figueira de Lorvão e a abertura da avenida de acesso ao Mirante (1951)  e, mais tarde, o financiamento da construção da estrada para o Penedo do Castro (1973). 

Quando já era viúvo de Vita Soares Perpéctuo, o Comendador e Grande Benemérito de Penacova, Abel Rodrigues da Costa, faleceu no Rio de Janeiro em 5 de Novembro de 1990, 

sábado, fevereiro 11, 2023

Personalidades (1): Manuel de Oliveira Cabral

 


Nasceu na Covilhã a 15 de Setembro de 1890 e morreu em S. Martinho do Porto em 30 de Outubro de 1974, terra onde casara, em 1916, com Estefânia Cabreira. 

Na capital do norte, onde viveu muitos anos, dirigiu o suplemento infantil de “O Comércio do Porto”. O nomes Estefânia Cabreira e Oliveira Cabral ficaram impressos na capa de muitas obras de carácter didáctico, em especial manuais escolares e colectâneas de música e poesia para crianças. Quem frequentou a escola primária nos anos trinta terá muito provavelmente estudado pelo “ Bom Amigo” e pelo “ Cantinho Florido”, livros de leitura para a 1ª e 4ª classes, respectivamente.


Professor, escritor e pedagogo muito conhecido na sua época, Oliveira Cabral também deixou marcas indeléveis em Penacova. A “esta aprazível estância de repouso” como escreveu um dia, veio passar, nas décadas de 40/50 muitas das suas férias. Ainda hoje este casal é recordado por algumas pessoas, especialmente pelos saraus culturais que promoviam. Além disso, Oliveira Cabral foi um dos grandes impulsionadores do grupo “ Os Amigos de Penacova” que viria a dar origem à Sociedade de Propaganda e Progresso de Penacova. Também nos jornais da região, Notícias de Penacova e Correio de Coimbra, ficaram muitos dos seus escritos. Ainda no Natal de 1960 - e cremos que terá sido das últimas colaborações no Notícias de Penacova – podemos ler uma poesia sua, ilustrada por Guida Ottolini, neta de Roque Gameiro. No “Notícias de Penacova” de 30 de Agosto de 1952, escrevia, sob o título “ Parabéns bom povo de Penacova”, felicitando os penacovenses, na pessoa do presidente da Câmara, Francisco Martins, pela criação de uma Biblioteca Popular, à qual prometia oferecer algumas obras, sugerindo a criação de uma secção infantil. Neste artigo, Oliveira Cabral levanta a questão duma presumível doação testamentária de livros à Câmara de Penacova por parte de Emídio da Silva, facto de que pouco se sabia.

Também no mesmo ano e no mesmo periódico, Manuel do Freixo, pseudónimo de Manuel Vieira dos Santos, escreve sobre Oliveira Cabral, rendendo-lhe homenagem e manifestando o seu agradecimento pela acção que desenvolvera em prol de Penacova. Conta o Arcipreste Manuel dos Santos que fora aquando da primeira homenagem a Abel Rodrigues da Costa que Oliveira Cabral lhe prendera a atenção, ao propor a atribuição do nome daquele benemérito a uma artéria da vila, o que acabou por acontecer, como sabemos. Neste artigo a que estamos a fazer referência, Manuel do Freixo, não esquece a fundação de “ Os Amigos de Penacova” e o seu esforço por “ orientar Penacova no sentido turístico “, salientando nesse aspecto, a publicação duma “ pagela artística” intitulada “ Algumas Palavras sobre Penacova”. Para o articulista, esta iniciativa onde revela o quanto aquele “aprecia, admira e estima tudo o que diz respeito à alcandorada vilazinha de sua predilecção”.

O folheto abre com uma vista geral de Penacova, tirada a partir da zona do Penedo do Castro, aparecendo depois uma gravura sobre o quadro de Eugénio Moreira “ A Ferreirinha ou a Gioconda de Penacova” – que hoje podemos apreciar no Museu Soares dos Reis – enquadrada por um texto do escritor Antero de Figueiredo nas suas “Jornadas em Portugal”. Da “pagela” faz parte também o conhecido cartaz com o slogan “ Penacova - Zona de Turismo - A 25 Km de Coimbra”. É também aqui que Oliveira Cabral publica as quadras “Penacova,a Linda”, inspiradas num trecho de um livro de Raul Proença.

Em Outubro de 1950, Oliveira Cabral publica no Notícias de Penacova uma Carta Aberta ao Presidente da Câmara, onde faz questão de esclarecer que “ não é natural de Penacova, não tem interesses na vila ou na região” e que, por isso “ fala desapaixonadamente”. Começa por louvar a iniciativa da Câmara ao editar cartazes de promoção turística, dos quais teve conhecimento no café Guarani, na cidade do Porto e os quais lhe suscitaram alguns reparos sobre o Turismo em Penacova. “ O turismo quer alegria para os olhos e higiene para a saúde” – escreve a dado momento. Assim, vem alertar para “ o estado lastimoso em que se encontra a muralha de suporte em frente da Pensão Avenida” – onde geralmente se hospedava - e para a poeira que os carros levantam quando atravessam a vila. Depois de sugerir o asfaltamento da estrada até à Casa do Repouso, conclui com alguma ironia dizendo que o cartaz “ pode levar algumas pessoas ao engano, mas…só uma vez!”.

Oliveira Cabral, uma figura interventiva em Penacova, que não sendo penacovense, tal como Emídio da Silva, Simões de Castro, Vitorino Nemésio e alguns mais, procurou ser um embaixador desta terra cheia de potencialidades turísticas. 

Escreveu, em 1947, referindo-se a Penacova, a profª Eduarda Silva, que com ele conviveu enquanto jovem:

Sem uma alma cheia de poesia 
Que te cantasse em versos sem rival 
Tua beleza decerto esquecia 
Quem acha belo o nosso Portugal 

E entre tantos que tem cantado 
a tua formosura sem igual  
Um nome com carinho tens guardado 
Porque te ama – Oliveira Cabral

David Almeida
publicado no jornal Nova Esperança, Jan 2011

segunda-feira, janeiro 23, 2023

Lugares, monumentos e sítios de Penacova (12): Capela de Santo António


A capela de Santo António situa-se a Sul da vila, implantada em terreno de acentuada inclinação, envolvido por amplo adro, parcialmente cercado por baixo muro, com um coreto octogonal em alvenaria de onde se podem apreciar excelentes panorâmicas sobre o Mondego.

Trata-se de uma construção do séc. XVII (com planta longitudinal, simples, com coberturas diferenciadas) enquadrável no tipo de arquitectura maneirista vernácula, apesar de ter sofrido algumas modificações. Fachada principal com alpendre com seis colunas toscanas (quatro na frente e uma a meio de cada lado) em cantaria e pavimento com seixos. 

 No chão da capela-mor existe uma campa, com evidentes sinais de desgaste, tendo uma faixa envolvente decorada e brasão sumido. Apresenta os seguintes dizeres:

 ESTA SEPVLTURA HE DE / MANOEL.DE PAIVA.NATV / RAL.DE COINBRA.../ FES QVATRO.FILHOS BO(NS) / LETERADOS E (HV(M) DELES. (F)OI / IOÃO.DE PAIVA PRIOR DESTA / IGREIA.LHE.MANDOV.FAZER /ESTA SEPVLTVRA.FALECEO / A 21.DE DEZEMBRO.DE.1621. 

 O retábulo secundário é dos sécs. XVII/XVIII, com esculturas de Santo António e S. Francisco, do mesmo período. O púlpito é cilíndrico e, numa mísula, vê-se um Anjo da Anunciação, de pedra, do séc. XVI, manuelino; numa outra, uma Virgem de madeira, dos XVII/XVIII. 

A capela é detentora de um cálice de prata sem ornatos, onde, no listel de base, se lê: “ESTE CALIX HE DA IRMANDADE DE SANTO ANTONIO FOI FEITO ERA D. 1664 a.” 

 Fontes: "Inventário Artístico de Portugal", vol IV, 1953 e Plano Director Municipal



quinta-feira, janeiro 19, 2023

"Basta que os penacovenses tenham a iniciativa dos suissos”




A longa teoria de estrangeiros que todos os anos percorre sistematicamente a Suissa, sob as tirânicas imposições dos Baedecker (1), dos Kook, e de outros Dracons das vilegiaturas (2), a par de excursões extremamente pitorescas, sofrem a desilusão de muitas ascensões e caminhadas que não valem o tempo que perderam.

Pode-se dizer que não há na Suissa um recanto de vale, uma dobra de terreno, um píncaro de monte que não seja visitado por milhares de forasteiros que, mal chega o verão, invadem por todos os lados este afortunado país e por ele se espalham numa ânsia de subir às suas montanhas, ou de bordejar nos seus lagos pelo simples prazer da vista, pela necessidade de fortalecer os pulmões ou de acalmar os nervos.

Mas em cada cantinho de vale, em cada socalco de terreno, assim como nos vértices das montanhas, esse vai-vem formidável de estrangeiros encontra sempre uma pousada, um albergue, uma hospedaria confortável, quando não depara com um desses grandiosos edifícios, que abundam na Suissa, tanto á beira dos lagos como nas regiões alpinas e que, sob os nomes de Palace Hotel, Grand Hotel, Kurhauss Hotel, proporcionam aos seus hóspedes, além de bom alojamento e boa comida, os atractivos dos seus hall sumptuosos e dos seus salões de festas onde se realizam bailes, concertos e soirées dramáticas que em alguns desses hotéis chegam a dar a ilusão de festas particulares elegantíssimas.

A Suissa, que explora como nenhum outro país a indústria das viagens entendeu que, antes do caminho de ferro, do funiculare até da própria estrada, quando se não podem fazer duas coisas ao mesmo tempo, é mister começar por construir o hotel…

Quantos hotéis teve e tem ainda a Suissa que apenas são acessíveis por estradas e até por simples caminhos, enquanto a tracção mecânica não pode ser estabelecida em condições económicas de provável êxito?…

O hotel, principalmente o bom, é muitas vezes a única razão de ser de algumas vilegiaturas suissas que tanto andam na voga!…

Porque em Portugal as hospedarias são na maioria más, as camas duras e o asseio escasso, e muitas vezes nem boas nem más existem, o estrangeiro, em geral, limita a Lisboa e seus arredores, as poucas viagens que faz ao nosso país, que, mesmo dos próprios portugueses, não é inteiramente conhecido.

Há distritos e até províncias onde, à excepção do viajante do comércio e dos funcionários civis ou militares que viajam por obrigação, raríssimos são os viajantes de recreio que se têm aventurado a ir até lá!

O próprio Minho, que é a província mais percorrida nas viagens de prazer, tem tanta aldeia formosa e mesmo vilas das mais pitorescas, que nós não conhecemos!...

Nestas condições ainda há poucos anos se encontrava uma das regiões mais encantadoras do distrito de Coimbra, a qual nem mesmo com as estradas do reino estava sequer ligada !

Referimo-nos à região de Penacova-Lorvão, nos contrafortes da Serra do Bussaco e na margem direita do Mondego.

O desleixo dos governos e as frequentes alternativas da política não permitiram ainda até hoje que fosse concluída a estrada do Bussaco a Penacova, nem tão pouco a que liga esta vila com Lorvão, que continua acessível apenas por uma íngreme e tortuosa ladeira!

Mas já se pode ir a Penacova por Coimbra e a estrada que lá nos conduz levará ali todos os estrangeiros que visitem Portugal, quando esta região estiver nas condições de os hospedar. Esta estrada por si só vale a viagem, quando o panorama que se goza em Penacova, do Penedo do Castro ou do Mirante Emygdio da Silva não sejam dos mais deslumbrantes que é dado contemplar aos que percorrem o mundo na demanda do pitoresco e do belo surpreendente !

A estrada de Coimbra a Penacova segue a margem direita do Mondego, cingindo- se tanto quanto possível ás ondulações da encosta e à linha caprichosa do talweg desse rio que percorre uma das regiões mais pitorescas e variadas, ora espraiando-se por campos feracissimos através de hortas e laranjais, ora apertado entre aprumados alcantis onde a vegetação nem sempre consegue ocultar os maciços de rocha que se destacam majestosos daquela paisagem luxuriante.

Essa estrada, que nem mesmo uma fita cinematográfica seria capaz de reproduzir, é com efeito um dos mais belos trechos do Portugal pitoresco e não conhecemos muitas que sob este aspecto se lhe avantagem na Europa dos touristes.

E’ no meio deste cenário deslumbrante e cheio de contrastes flagrantes, que surge a vila de Penacova, debruçada sobre o Mondego, que domina de grande altura, abrangendo por isso um vasto panorama em que os olhos se perdem extasiados num horizonte longínquo que serve de esfumada moldura a uma imensa paisagem, ora retalhada de pinhais ou sobrepujada de penedias que dão ao quadro uma tonalidade grave e austera, ora entrecortada de pomares, de vinhas e de milheirais, numa harmonia quase geométrica que é felizmente quebrada aqui e acolá, perto ou longe, inúmeras vezes, pela casaria branca das vilas, das aldeias e dos lugarejos que põe manchas alegres e dá vida e animação a esta grandiosa tela do maior e mais divino dos mestres - a Natureza! E através de todo esse tranquilo e ridente quadro descobre-se sempre o curso do poético Mondego, que ora veste o coturno trágico ao passar Entre Penedos, ora desliza na amenidade da paisagem coimbrã espraiando-se pelos campos a jusante de Penacova.

Uma vez ligada a Lorvão e ao Bussaco pelas estradas que estão em adiantada construção, Penacova fica ocupando o vértice de um triângulo de vilegiatura que há-de constituir um percurso de turismo obrigatório, dependendo apenas da edificação de um hotel simples e moderno a fixação dessas colónias ambulantes. . .

Não faltam para isso atractivos à linda vila, e não é de certo o menor deles a visita ao histórico mosteiro de Lorvão que fica a meia hora de distância, pelo ramal da estrada que está em construção.

Centro de numerosas excursões, como qualquer dos outros vértices do triângulo que tem por base Coimbra-Bussaco, a região penacovense pode ser um dia tão afamada como algumas estações da Suissa.

Basta para isso que os penacovenses tenham a iniciativa dos Suissos.

L. MANO


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(1) Karl Baedeker (Essen, 3 de novembro de 1801 — Koblenz, 4 de outubro de 1859, notação contemporânea: Karl Bædeker) foi um editor alemão e fundador do mundialmente famoso e ainda hoje publicado Guia de Viagem Baedeker.

 (2) Temporada que se passa fora da zona de habitação habitual, a banhos, no campo ou viajando, para descansar dos trabalhos habituais.






terça-feira, dezembro 20, 2022

Lugares, monumentos e sítios de Penacova (11): Quinta da Ribeira

Todo este local serve de enquadramento a uma quinta barroca, do séc. XVIII, de arquitetura civil, residencial e agrícola. “Possui uma integração na paisagem conseguida de forma harmoniosa. Adapta-se e desenvolve-se em socalcos formando terraços interligados, percorrendo a encosta e desfrutando de uma vista panorâmica sobre o vale" (PDM). Mais se acrescenta que este enquadramento rural, destacado, se encontra próximo de uma ribeira e é envolvido por vegetação arbórea.

Por sua vez, Cecília Matias (2001), do IGESPAR, afirma que se trata de uma “casa unifamiliar barroca representativa da casa nobre portuguesa da época e área geográfica em que se inscreve, pela implantação em terraços e inserção na natureza, assim como, pela conjugação da casa, capela e pátio formando uma unidade própria.”

A casa integra residência, capela, mirante e também uma pérgola; a residência é formada por dois pisos, telhado de duas águas, “fachada principal longitudinal, sóbria, decorada apenas nas janelas do andar nobre com molduras de cantaria de verga curva e avental”. O rés-do-chão inclui cozinhas, celeiros, adegas e arrecadações. No andar nobre há salas e quartos sendo as portas pintadas a marmoreado; por sua vez, a capela é constituída por um “corpo definido por pilastras com empena a romper linha da cobertura, assinalada por dois fogaréus a prolongar as duas pilastras da fachada, que acentuam a verticalidade, e cruz central; portal com cornija forte sobrepujada por pinhas, moldura de recorte curvo; acima óculo quadrilobado.”

De acordo com o já referido acima, esta Quinta é do século XVIII. Investigámos alguns aspectos genealógicos e concluímos que esta casa pertenceu ao casal José Cardoso, nascido em 1718, e Maria Assunção dos Santos, esta natural de Palmazes. Deste casal nasceu, em 1736, precisamente nesta Quinta da Ribeira, o capitão José Cardoso dos Santos, avô materno de David Ubaldo Leitão, bisavô do Conselheiro Alípio Leitão.

quinta-feira, dezembro 01, 2022

O rio Mondego na poesia de Ulisses Baptista

Regresso às Origens é o título do novo livro de poesia de Ulisses Baptista, autor penacovense. Já em 2012 havia publicado Meu Rio de Prata, uma “Breve História de Penacova e suas Tradições”, de acordo com o subtítulo desta obra, toda ela traduzida em estrofes de quatro versos, num total de cento e oitenta e três.

Agora, além da temática do Rio Mondego, Ulisses Baptista, Engenheiro do Ambiente, reúne um conjunto de cinquenta e um poemas onde se cruzam recordações de infância, passada na Carvoeira, preocupações ambientais e sentimentos perante a Vida e a Natureza.

Além das duas poesias sobre o Mondego, que transcrevemos, encontramos também o poema “Lembranças do Mondego”. Fica um excerto: “Nunca julguei que um dia ao te domar / O Homem, que tem voz no meu lamento / Servisse pra tão só te ver passar”.

Ulisses Baptista vem publicando textos em prosa e em verso na página do Facebook “Carvoeira, terra amiga”, de que é administrador. Um espaço que tem como conteúdo as “histórias e as lendas”, bem como, “fotos e factos sobre a Carvoeira, seus lugares e suas gentes”.


MONDEGO, MEU RIO DE PRATA

Meu rio de prata,
Outrora fecundo,
Morro de saudade,
Por não me rever
No que te fizeram.
Que é feito de ti
Meu rio de prata?
Águas cristalinas
E areias tantas,
Taludes orlados
Com moitas de junco.
Meu rio de prata,
Outrora fecundo,
Que há em ti que eu veja:
Um simples canal,
E ao largo os montes
E o azul do céu,
Não em ti espelhado.
Mas tu, um príncipe folião,
Perdeste a garra
Neste canhão.
Meu rio de prata,
Bem que eu te queria
Como eras dantes:
Seixos roliços
Postos ao acaso
E tapetes de erva,
Que pisei descalço,
Porque era criança.
E criança fui
E em ti me fiz homem
E assim me deixaste,
Meu rio de prata,
Outrora fecundo.


MONDEGO

Tinhas as orlas espraiadas
Em linhas ténues nas areias,
As curvas pouco fechadas
No correr das tuas veias.
Por ti se encantaram povos,
Distantes na madrugada,
Que vieram trazer aos novos
Mensagens de paz velada.
Revoltoso no Inverno,
Quando inundava as terras,
E as águas, num inferno,
Vinham do cimo das serras.
No auge da estação quente,
A cor da prata no leito,
Límpido e transparente,
Num panorama perfeito.
Em ti refletiam as cores,
O celeste azul do céu,
As praias desses amores
Que tanto poeta escreveu.

E quando a força bruta
Trouxe o mal que te quebrou,
A beleza, em forma astuta,
Ainda assim nos encantou.



quarta-feira, novembro 16, 2022

Lugares, monumentos e sítios de Penacova (10): Cruzeiro / Pelourinho


O Cruzeiro de Penacova tem como antecedente o antigo pelourinho, entretanto transformado, tendo a primitiva função judicial dado lugar a um marco de carácter religioso.

Refere o “Inventário Artístico de Portugal” que o cruzeiro é do séc. XVIII. A coluna, geralmente referida como tendo características dóricas, assenta sobre degraus de grandes silhares medievais siglados, provenientes do castelo. É encimada por uma cruz latina, substituindo o remate e o capitel que desapareceram. O monumento foi desmontado em 1950, para rectificação da rua, tendo sido reerguido passados dois anos.

Em 1933, quando foram classificados todos os pelourinhos que ainda o não tinham sido, foi considerado como Imóvel de Interesse Público.

terça-feira, novembro 08, 2022

Vida e obra de António José de Almeida: fragmentos (1)

EVOCANDO O 93º ANIVERSÁRIO DA SUA MORTE E O CENTENÁRIO DA VISITA PRESIDENCIAL AO BRASIL transcrevemos as referências feitas a António José de Almeida, ilustre penacovense, pela REVISTA DA SEMANA na edição de 9 de Novembro de 1929 publicada no Rio de Janeiro 


Um grande vulto que desaparece

“A morte do eminente estadista português António José de Almeida, ocorrida em fins da semana última, repercutiu dolorosamente na alma brasileira, por isso que o grande morto – figura inconfundível de revolucionário, de médico, de orador – era para os Brasileiros um vulto quase familiar: era um “cidadão carioca”, título que lhe foi conferido quando da sua honrosa visita, na qualidade de Presidente de Portugal, ao Brasil. Homenageando a memória do grande morto, reproduzimos nesta página dupla alguns aspectos fotográficos tirados há sete anos, quando da visita de António José de Almeida ao Rio de Janeiro, publicando em outro lugar a nota de redacção sobre o pensamento do eminente estadista.

 ***
“Com a morte do Dr. António José de Almeida, perdeu Portugal uma das figuras mais belas, mais luminosas da sua Política. E a nobre língua de Camões e de Eça de Queiroz – do poeta genial e do artista perfeito – apagou-se numa das suas mais altas fulgurações, num dos seus surtos solares de maior esplendor verbal . Porque se extinguiu para sempre o fogo estelar daquela voz e o turbilhão de ouro daquele espírito. Quem quer que o ouvisse sentia o fascínio do milagre. O talento é chama, o génio é incêndio criador de mundo e é dele que nasce a harmonia das coisas – na frase divina de Pitágoras.

Os fins do século XIX, que assistiram aos últimos esplêndidos crepúsculos da palavra arrebatadora de Emílio Castelar, na Espanha, iluminaram-se de súbito com a oratória flamejante do moço português que, ainda envolto no mistério da sua capa negra de “Coimbra Doutora”, lançava já no silêncio das multidões atónitas o gesto da fascinação maravilhosa e o sortilégio delicioso das imagens resplandecentes.

Aos vinte e quatro anos, surgiu António José dos bancos obscuros de estudante para a batalha, para a epopeia da Inteligência. A imprensa e a tribuna foram o seu largo campo de acção. Portugal lentamente despertava, a sua alma iluminava-se de princípios novos, de ideias novas. E António José ia ser o orador jovem, capaz de traduzir vigorosamente as aspirações e transformações da sua pátria. Ele aparecia assim, na agitação intelectual e social do país, como um renovador, um perdulário de ideias, um semeador de valores espirituais.

Revestido do fulgor da sua palavra como de uma armadura de aço faiscante – era ela o apóstolo do povo, o cavaleiro iluminado das multidões sem voz e sem defesa; e quando subia à tribuna, envolto numa auréola de predestinado, era como se realmente na sua voz se acendessem todas as vozes obscuras da pátria, todas as angústias anónimas do povo.

Ardente como um condottiere, sendo sempre a figura de primacial simpatia em todas as revoluções, republicano a sonhar uma República de nobreza e de liberdade, António José foi o poeta da acção, o idealista do progresso, arrecadando da forte e nobre alma portuguesa – que dera ao mundo os épicos navegadores do século XVI – estos de heroísmo e intensas vibrações patrióticas.

Esse irmão peninsular de Danton, talvez mesmo enamorado um tanto romanticamente das figuras violentas e decorativas da revolução Francesa, foi – na sua dialéctica luminosa e na grandeza demosténica do seu verbo um esplêndido espírito revolucionário, um eloquoentíssimo professor de energia.

Todavia, ao invés de cobrir a face com a máscara de ferro da acção fria e calculista, preferiu cobri-la com a máscara de ouro da beleza brilhante e imaginosa, tornando-se assim em toda a sua vida política um prodigioso fascinador, um harmonista cintilante de períodos rútilos, capaz de dominar pela suprema música da sua inteligência a multidão imensa e inquietante – que é uma serpente de mil cabeças.

Os brasileiros que tiveram a fortuna de ouvi-lo, quando da sua viagem ao Brasil em 1922, de certo não esqueceram a lapidar maravilha dos seus improvisos, a prestidigitação sonora das suas imagens que sugeriam um microcosmo de lendas, frases de diamantes e de rosas, cheias do sortílego poder de transformar miríades de vocábulos inertes em miríades de cintilações de pensamento.

Agora, está morto o homem extraordinário. A morte capaz de todos os sacrilégios, transformou numa fria boca de mármore aquela boca onde turbilhonaram tempestades de sóis e harmonias universais.”

in Revista da Semana, Ano XXX, nº 47, 9 de Novembro de 1929