Bairro era uma forma de gestão do território municipal
Existia estruturado para alojamento, também nupcial
Não lhe estava alheio o anseio, conjuntural, de dar lar
A quem dele precisava
A quem se amava
E queria fazer crescer a sua Família, em reprodução
O Bairro era específico
Característico
E por isso tinha sabor
Saboreava-se o ar circundante
O cheiro das comidas em confecção
O da amizade a pairar, que crescia ali “à mão”
…
Cada Bairro se foi desenvolvendo
Passou a ter Jardim Escola
Deu benefícios no Centro de Saúde
As crianças passaram a ter Locais de Encontro
E Bombeiros
E Postos da PSP ou da GNR
E Associações de Canto
De Teatro
De Dança
Muitas vezes, até, instalações de Junta de Freguesia
Sem esquecer a existência do Parque Infantil
E de Parques de Merendas, aos mil
…
Era o Bairro do amor
Um aglomerado, esmerado
Que também era sedutor
…
Depois passou para as ex-quintas, nas colinas, nas ravinas
Nas zonas menos nobres, até pobres
E aglomerava gentes sem sortes
Estratificada nas classes sociais
Nas ditas “zonas urbanas sensíveis”
Empurradas para fora do centro
Dos centros urbanos iluminados
Longe dos mais ricos e decanos
Para não se misturarem as pessoas
Fossem elas más ou boas
Arrumavam-se mais longe
Embora se dependesse delas
…
À medida que evoluiu a pressão imobiliária
As casas diminuíram muito na qualidade
Os moradores têm muito mais dificuldade
As relações sociais degradam o espaço protector
As crianças não têm acompanhamento
Valoriza-se só a alegria do momento
Que não a que combate o sofrimento
Mais droga pr’aqui; mais álcool pr’ali
Mais violência pr’acoli…e pobreza muita, aí
Tudo o que lhes escondemos no triste sabor
Das casas acrescentadas de barracas degradadas
E tendas de campismo ou de plásticos rasgadas
…
E é este o Bairro do desamor
Que acorda bem cedo na sua dor
Com humanos, como nós, já cheios de pavor!
Luís Pais Amante
Casa Azul
A pensar na letra e na música do Jorge Palma “O Bairro do Amor” que servirá de tema a um Congresso de gente Amiga, sem esquecer o “momento” socialmente destrutivo que criámos, enquanto Nação de Emigrantes.
O "Sabor do Bairro" traduz uma realidade evolutiva, infelizmente em má direcção, para o Bairro do Desamor. Mas ... ainda há esperança!
ResponderEliminarDe facto estamos a passar por um período no nosso País (mais em Lisboa e Porto) em que o descontrole se instalou e muito ser humano não está a ser bem tratado.
ResponderEliminarParabéns primo Luís.
Eduardo Miguel BECAS
Nem sempre o que chamam "desenvolvimento" é um bom caminho para podermos ser "Pessoas". Uma excelente reflexão!
ResponderEliminarEste é um assunto que nos deve fazer pensar muito enquanto País.
ResponderEliminarA situação dos Imigrantes, que é muito triste, provoca tratamento idêntico aos Emigrantes.
E isso é mesmo difícil de entender!
Á muitos anos atrás...eramos muito mais felizes e sabíamos amar...valorizar e respeitar tudo o que ía progredindo ao nosso redor...sim...eramos realmente com tão pouco e como esse pouco nos enchia a alma...com orgulho em vivenciar esse ambiente. Infelizmente tem se perdido esses valores humanos que existiam e deram lugar á podridão...á vergonha...á ganancia....e em meu ver ao falta de caracter e bom senso dos seres humanos!!!!
ResponderEliminarNo início estava a ser tão bom ler !!... Só que os valores de então desfizeram-se com os novos tempos . A má vida que se vive agora nos bairros trazem pessoas que vivenciam horrores . Eu quero acreditar que ainda teremos bons bairros. Uma descrição coerente , realista e que nos entristece muito !... Bem-hajas Luís por trazeres estes temas que tanto necessitam de ser avaliados.
ResponderEliminarExtraordinário.
ResponderEliminarA pensar nessa tão bela e triste reflexão, num olhar de quem veio procurar esse conforto, a paz e o sossego para criar os seus filhos, num lugar que outrora era tido como lugar de sonho.
ResponderEliminarInfelizmente o crescimento e desenvolvimento desgovernado tem dessas consequências. Mas vamos ter esperança... Que a amargura desses "desamores" um dia se transformem em doces de mel... Que os tempos difíceis passem a ser contados só como história.
Eu ainda tive a sorte de crescer e viver largos anos numa "pequena terra" onde o ambiente, mais coisa menos coisa, ainda nada se assemelha à selva urbana onde se diz haver a verdadeira civilização... Um abraço
ResponderEliminarGonçalo Engenheiro
EliminarE o Bairro desmorona-se mas há os teimosos cheios de esperança que mesmo através de grupos dê whattsap vão reerguendo as paredes do bairro em extinção …Parabéns pelo novo texto que de novo me remete para o meu canto de reflexão…,!!!!
ResponderEliminarLuís Amante, sendo poeta e advogado, tem uma sensibilidade particular para observar a vida urbana e as dinâmicas sociais dos bairros do desamparo, onde a marginalização e a solidão muitas vezes se cruzam com histórias de resistência e esperança.
ResponderEliminarSe ele visse que o número de imigrantes supera o de emigrantes, poderia interpretar essa realidade como um reflexo das transformações sociais e económicas, mas também como um sinal de desigualdades e deslocamentos forçados. No olhar poético de Luís Amante, essa superioridade numérica não seria apenas estatística, mas um símbolo das forças que movem os povos — o desejo por uma vida melhor, a luta contra a adversidade e a eterna busca por um lugar a que se possa chamar lar.
Nos bairros do desamparo, a cidade se fragmenta entre aqueles que chegam e aqueles que partem, entre os que constroem e os que abandonam. Talvez para ele, a verdadeira questão não seja quem é maior em número, mas quem encontra um sentido para permanecer ou partir.
Manuelita Sampaio
Gosto muito da canção “O Bairro do Amor”, de Jorge Palma, mas confesso que nunca tinha reparado na descrição perfeita que faz da função do bairro. É por aí que começa o poema, também com uma correta descrição dos bairros de outrora, que eram pensados para as pessoas, que tinham uma função social e comunitária importantíssima.
ResponderEliminarEssa função foi-se degradando e até destruída de forma violenta, e não foi por causa da emigração nem da imigração, na minha opinião.
Foi a pressão imobiliária, foi a gula dos especuladores, foi o desprezo que essa gente tem pelas pessoas e foi com a conivência de certos autarcas que correram com as pessoas do seu bairro, do seu teto e do seu CHÃO.
Bem se bateu João Ferreira contra esses interesses e bem avisou os coniventes instalados no poder. É altura de lhe dar razão.
Obrigado, Luís Amante, por abordar este assunto tão importante e preocupante.
Eduardo Ferreira
Infelizmente, é mesmo essa a situação actual…
ResponderEliminarExcelente reflexão, mas quando olhamos para "o lado" vê -se muita tristeza. Os bairros, com algumas excepções, já não são o que eram lamentavelmente. Parabéns Luís!
ResponderEliminarImpossível ler e não ficar tocado 😔 toca em todas as fragilidades. Eu fico sempre sem palavras, só sei que sinto uma enorme tristeza pela ganância e pelo desamor.
ResponderEliminarFelicito-o por nos trazer, uma vez mais, um poema real.
Com amizade e admiração, Ana Maria Afonso