31 maio 2015

Mirante Emídio da Silva faz hoje 107 anos

[recolha de penacovaonline]
O Mirante Emídio da Silva, 
construído no local do antigo miradouro do Monte da Senhora da Guia, também conhecido por Mirante do Castelo, foi inaugurado há 107 anos. Foi precisamente a 31 de Maio de 1908.

Um pouco da história do mirante: certo dia, o Dr. Manoel Emigdyo da Silva, eminente figura do jornalismo, da engenharia, da cultura, visitou Penacova e ao chegar ao Mirante do Castelo terá ficado maravilhado com a beleza da paisagem.

Com o seu apoio e do Presidente da Câmara, Dr. José Albino Ferreira,  o mirante nasceu. Foi desenhado pelo prestigiado arquitecto italiano, radicado em Portugal, Nicola Bigaglia, também projectista da Casa dos Cedros no Buçaco.

[ recolha de penacovaonline]
A inauguração do Mirante no fim de semana de 30 e 31 de Maio de 1908 foi um acontecimento marcado por grandes festejos, em que Emídio da Silva – e uma comitiva da alta sociedade lisboeta – foi recebido em apoteose. Centenas de pessoas esperaram a caravana automóvel na zona da Várzea, pelas cinco da tarde de sábado, com flores e foguetes ao som da Filarmónica Penacovense. 

À noite, junto ao mirante, a iluminação com balões venezianos pendurados nas oliveiras, juntamente com fogueiras, deram a luz necessária para que o arraial abrilhantado por um rancho de tricanas de Penacova e pela veia artística da cantadeira de quadras populares Emília Carolina fosse um êxito.


[recolha de penacovaonline]
No dia seguinte, domingo, o Dr. Alfredo da Cunha, director do Diário de Notícias, descerrou a lápide que ainda hoje se encontra no local com a inscrição “ Mirante Emidgyo da Silva-31-5-908”, ao que se seguiu o discurso emocionado do homenageado, bem como outras intervenções. A festa terá perdido algum brilho, porque um intenso aguaceiro se abateu sobre Penacova a meio das cerimónias. No entanto o entusiasmo de alguns penacovenses, entre eles, Alves Coimbra, António Casimiro e Amândio Cabral, levou a que erguessem aos ombros por entre a multidão o Dr. Emídio da Silva, que deixou Penacova, segundo relatos escritos da época, consternada pela partida, acenando simbolicamente com lenços brancos.
Este evento foi notícia destacada e muito desenvolvida no Diário de Notícias, ilustrada por fotografias, o que não era muito comum nos jornais da época.

27 maio 2015

Visitar Lorvão em 1909: a visão de Emídio da Silva

Publicamos hoje o terceiro texto de um conjunto de escritos sobre Lorvão.Já transcrevemos a opinião, que consideramos injusta, de Magalhães Colaço (1913) e também o relato de Lino d´Assunção (finais do séc. XX). Agora, um trecho de Emídio da Silva, publicado em 1909. 

"O Mosteiro de Lorvão foi um dos mais notáveis do país e apesar de se encontrar hoje (1909) em ruínas, e mesmo arrasado em parte, é ainda um monumento de subido valor histórico e um repositório de arte muito curioso e interessante. O convento fica ao fundo de um estreito vale, ocupando um local aprasível que se nos impõe pela sua austera beleza e que podia ser no Verão concorridíssimo, dada a frondosa arborização da encosta adjacente ao mosteiro e a frescura dos deliciosos mananciais de água que vêm dos granitos da montanha.

Mas a laboriosíssima aldeia não tem sequer ainda uma estrada que a ligue às outras do país e para se ir lá, de Penacova, pela estrada do Botão, tem de se deixar esta dois ou três quilómetros de Penacova e seguir a pé ou em burro por uma extensa ladeira que leva a descer 30 minutos!...

E no entanto, Lorvão bem merecia que os poderes públicos tivessem olhado um pouco mais para ela pois a simpática aldeia não vive passivamente da tradição dos seus monumentos, como outras de Portugal mas do constante e esforçado labor dos seus filhos que desde os de mais tenra idade até aos da mais provecta, se dedicam inteiramente à fabricação dos palitos de dentes, que tem ali o maior centro de produção do concelho de Penacova, do qual constitui, como é sabido, a indústria mais importante.

Mas se os poderes públicos deixam quase ao abandono os restos do grandioso mosteiro que é um monumento nacional ! O seu pitoresco claustro foi demolido e as cantarias vendidas ou roubadas! No esplêndido templo, de grandes e nobres proporções chove como na rua e o magnificente coro que é um dos melhores exemplares da nossa época do rococó está destinado a desaparecer, atacado pelo caruncho ou pelas mesmas mãos que destruíram o claustro…


Quando vou a Lorvão e ainda lá encontro perdida naquelas ruinas solitárias, como um náufrago que escapou a cem porcelas, a custódia de prata dourada guarnecida de pedrarias – uma relíquia da nossa arte sumptuária do século XVIII – esquecida e inapreciada na vasta igreja, hoje sertaneja, e vejo ao mesmo tempo abandonados os sarcófagos de prata que contêm os restos das infantas, filhas de D. Sancho I, não posso deixar de fazer as mais amargas reflexões acerca da conservação que Portugal dedica aos seus monumentos."

25 maio 2015

Lorvão: impressões da visita de Lino d'Assumpção em finais do séc. XIX

A descida [entre Chelo e Lorvão] vai sempre por entre pinhais, na meia encosta abrupta e pedregosa, ao fim da qual (...) se ouve correr a água, embora se não veja. O sol está alto e mordente; sol cruel, implacável pressagio certo de tempestade, e cuja lividez estampa no terreno estratificado e amarelo a sombra esburacada dos pinheiros que rumorejam brandamente.

Além. onde a orreta  se alarga, vêem-se bois pequenos lavrando a terra escura e fraca, que vai sendo semeada com punhados de milho, e das rodas duma azenha, cujo ruído melancólico e rítmico chega até nós, levantam-se pulverizações douradas pela luz do sol. Nas bifurcações indecisas guiam-me rodadas fundas dos carros. E cantam melros e pintassilgos.

Lorvão: bilhete postal em 1926
Cruzo-me no caminho com raros homens de estatura pequena e cara rapada, vestidos de briche , e mulheres sem beleza, de tez encarquilhada, saias sombrias colhidas nas ancas, anágua  pela cabeça, ou lenço traçado na cara, que quase lhes tapa a boca, deixando escapar na testa umas farripas de revolto cabelo, que melhor se lhe chamaria estopa; pés descalços e deformados, carregando pesados cestos que lhes achatam os crânios; e tanto homens como mulheres correspondem à minha saudação com um reenvio religioso. Interrogados — questão de passar o tempo — que tal ia a lavoura, respondiam:

— Tchoveu, mais foi poucatchinho : mas Deus Nosso Senhor, assim como manda o pouco, pode mandar o muito, se quiser.

Uma vez chegado a Lorvão, encontra “ao soalheiro das portas”, sentadas, “mulheres e crianças cortando e afeiçoando em palitos os troncos brancos do salgueiro.”

E a descrição prossegue com grande pormenor:

Ao cabo da rua principal, e fazendo esquina para o largo do mosteiro, encontra-se, á esquerda, a venda do Carlos. Loja suja, dividida por um balcão negro, ao longo do qual vai e vem com passo lento, gesto mole e aborrecido, o dono da casa, quando não anda por Espanha fazendo negócio.

Era a hora do maior concorrência. Mulheres e crianças entravam de xaile pela cabeça, e a troco de palitos levavam bacalhau, açúcar, arroz, café, petróleo, azeite, vinho, broa, fósforos ou papel de cor. O palito é ali a moeda corrente. Para as transacções entre o merceeiro e os seus fregueses não há necessidade do intermédio nem da Casa da Moeda com as cédulas, nem do Banco de Portugal com as notas. O Carlos recebe os maços,e examina-os quase papel por papel, como um usurário examinaria uma peça de ouro suspeita. Ele bem sabe que se o poderem enganar que não deixam de o fazer; portanto, só depois de verificar se a moeda lhe serve é que dá a fazenda que lhe pedem e ela representa. Muitas vezes a moeda sofre uma depreciação que ele arbitra, atendendo á qualidade ou imperfeição do fabrico; outras então rejeita-a sem dó, como se fossem notas falsas: sem reparar que esses macinhos em que à pressa se juntaram lascas tortas, escuras, mal aparadas, representam uma fraude da fome que, ao meio dia, desejaria roer um bocado de broa. E como esta. saída do forno, cheira bem e abre o apetite! Não resisto ao desejo de a provar e de reconhecer que em tal ocasião me soube como se fosse a melhor iguaria.
Verificada a qualidade dos palitos, o Carlos atira com eles para diversos repartimentos, segundo a qualidade, e depois exporta-os por sua conta. A média das compras anuais anda por uma dúzia de contos de réis. Dizem que perto de mil pessoas se ocupam neste fabrico, tão simples como primitivo.


In As freiras de Lorvão : ensaio de monographia monastica / T. Lino d'Assumpção,1899

17 maio 2015

O que de pior se terá escrito sobre as gentes de Lorvão

Lançámos, há dias no Facebook, algum “suspense” ao escrever “O QUE DE PIOR SE ESCREVEU SOBRE AS GENTES DE LORVÃO...NUMA REVISTA DE ÂMBITO NACIONAL...EM 1913”, prometendo, a curto prazo, voltar ao assunto nestas páginas do PenacovaOnline.

De facto, na revista “Ilustração Portuguesa” foi publicado um texto, profusamente ilustrado (como é uso dizer-se), onde a par de sentimentos de algum pesar perante o estado decadente do Mosteiro de Lorvão (que em 1910 havia sido declarado monumento nacional), Magalhães Colaço (tratar-se-á  de João Maria Telo de Magalhães Colaço [1893-1931], professor de Direito em Coimbra?),  lança um anátema contra os habitantes de Lorvão, como se fossem eles os culpados de todo aquele “pesadelo de sombras e de tristeza” reconhecido pelo articulista.

Pese embora o mérito de alertar para o estado lastimoso do mosteiro e também de retratar de algum modo a vida social e económica ligada à manufactura dos palitos, este artigo, continuamos a achar, está ferido de uma concepção preconceituosa da pobreza, que, sem dúvida, existia em Lorvão, tal como em todo o país na época em que o autor escreve.

O artigo intitula-se “Palitos de Lorvão”. Como dissemos, inclui algumas preciosidades fotográficas, tem aspectos positivos... mas, quase nos custa trazer à baila os seguintes parágrafos:

“...toda essa gente que lastimei é gente sem moral, sem coração, nem estímulos, é a escória, vendida em hasta pública, do género humano – que já não presta.”

“Quando as últimas freiras foram sepultadas, toda a legião dos nus e miserandos veio refugiar-se no convento , fazendo das celas desertas a casa paupérrima de indigentes...”

“Com os seus 1200 habitantes, Lorvão não tem casas: todas se comunicam, escancaradas, porque todos vivem na mesma promiscuidade vil.”

“Os homens fortes, são madraços famosos a quem o descanso, o sol e o vinho puxaram a pescoceira farta , abasteceram o tronco e puseram aos olhos todo o brilho gorduroso dos alcoólicos professos. Toda a freguesia, esssas mil e duzentas pessoas, trabalha em palitos – dez minutos antes de comer. Levanta-se tudo tardissimo, e se lhes falta o café, como quem toma do realejo para conseguir esmolas, eles se dispõem ao trabalho, em semi-círculo, homens, mulheres e crianças de ambos os sexos.”

Para quem tiver mais tempo, curiosidade e paciência para ler, deixamos aqui, em grafia actualizada, o texto integral.

Oportunamente, daremos continuidade ao tema, referindo textos de Lino d’ Assumpção e de Emídio da Silva publicados em 1899 e em 1909, respectivamente, bem como de Cabral de Moncada e outros, relacionados com Lorvão nos finais do séc-XIX e inícios do séc- XX.


PALITOS DE LORVÃO

Fica-se comovido e absorto, à vista do Lorvão. O vale fundo, sombrio, tristíssimo, onde jazem os despojos do convento. Já não merece aquele nome rude – Lorvão – nome rápido e áspero com o quer que seja do ressoar longínquo de séculos bárbaros e no qual ainda ecoa o ruído dessas terríveis tempestades das almas e dos elementos que rebentaram naquele vale onde apenas cabe o mosteiro. Que apagada tristeza, que confrangida piedade a dos meus olhos, fitando o velho rosto do enorme convento esquecido. Já não tem portão a antiga entrada para o terreiro antigo, em quadrilátero, sem vidro os caixilhos cheios de erva, negríssimas a s grades de ferro de todas as janelas, a que assomam grupos inteiros de famílias acolhidas ao convento. E que rogos lamentosos os destas pedras, que preces combalidas as destas janelas – olhos do mosteiro - a balbuciarem transidas, que não as trespassem mais os ventos e cóleras do céu. Mas como pode remir-se o velho mosteiro arruinado, grande, hirto, na sua magreza de cadáver? Quando as últimas freiras foram sepultadas, toda a legião dos nus e miserandos veio refugiar-se no convento , fazendo das celas desertas a casa paupérrima de indigentes, ao relento prefrindo o frio que sofre quem vive nestas celas de pedra e ferro...
Pobre mosteiro de Lorvão! Para que hás-de morrer aos poucos, sem freiras que te lisonjeiem, sem madres abadessas que te mandem restaurar, pintar olheiras que fossem mascarar-te a velhice, fazer chalrear nos teus claustros, ornamentar de graças o teu coro sumptuosíssimo, povoar formosas as tuas celas  que foram encantadas e refazer de ti o mosteiro opulento do tempo dos antigos reis  - quando a altiva Filipa d’Eça, de sangue azul, neta de El-Rei D. Manuel I, e monja eleita contra tenção de D. João III, leva a revolta às assembleias do coro e debatia com o régio amo e recorria para Roma distante e poderosa, soprando tempestades desse pequenino vale, onde a natureza é arida e  e os deuses espalharam a miséria e a inópia?
O velho convento geme dolorido nas friagens das noites chuvosas, acalma suas dores a os luares de quem ja ouviu louvores nos lábios das freiras, quando à Cerca desciam a beijar seus pares, se a manhã traz uma réstea de sol, todo ele se espreguiça os membros como o calor benéfico da natureza lhes sarasse  as chagas e o aliviasse da torpeza promíscua dos seus centos de habitantes.  
Pobre mosteiro de Lorvão, bendito e louvado quem te talhasse a tumba! Pobre mosteiro, mosteiro velho das lendas, ergue a tua voz pela noite e canta a tua vida gemendo...
...
E como há aqui quem sorria, cante, e case tão jubilosamente, como no dia em que visitei Lorvão?
Só depois me informaram: toda essa gente que lastimei é gente sem moral, sem coração, nem estímulos, é a escória, vendida em hasta pública, do género humano – que já não presta. Com os seus 1200 habitantes, Lorvão não tem casas: todas se comunicam, escancaradas, porque todos vivem na mesma promiscuidade vil.

Os homens fortes, são madraços famosos a quem o descanso, o sol e o vinho puxaram a pescoceira farta , abasteceram o tronco e puseram aos olhos todo o brilho gorduroso dos alcoólicos professos. Toda a freguesia, esssas mil e duzentas pessoas, trabalha em palitos – dez minutos antes de comer. Levanta-se tudo tardissimo, e se lhes falta o café, como quem toma do realejo para conseguir esmolas, eles se dispõem ao trabalho, em semi-circulo, homens mulheres e crianças de ambos os sexos. Tomam da navalha e dos vimes de salgueiro branco, abrem-nos em quatro e, afirmando-os sobre um pequeno protector de couro que os envolve do joelho esquerdo até ao pé, aí adoçam a madeira,  afiam-na em ponta, com duas ou três passagens rápidas de canivete. Voltam essas pontas, marcam nos vimes a altura conveniente ao palito, cavando a madeira e vergam, partem quatro hastes de cada vez. Aí estão os palitos que eles enrolam e vendem em maços a três vinténs. Vinténs? Olhem a fantasia...No Lorvão, desde que as freiras abalaram, já não há moeda alguma - de metal. A moeda é o palito, o autêntico, cujo maço vale uns tantos gramas de café ou farinha, uns tantos decilitros de vinho. O homem da venda e da tenda recebe palitos, não recebe dinheiro, mas examina a moeda com um escrúpulo, com um rigor de quem conferisse velhas assinaturas em pergaminhos antiquissimos. Aquilo tudo é pesado, medido, contado e retribuido em género, de que eles fazem o almoço. Só despertam de novo para a hora de jantar. Há pão? Não há. E lá se têm de afiar mais uns palitos . . . Não trabalham, - mas não são exploradores, haja de confessar-se. Essas hastes, vendem-nas de graça, e nas raparigas, nem um ar de coqueterie a rogar mais uma espórtula de generosidade ao estranho que os compra. Por vezes, apenas um leve sorriso a quem se abeira, como esse que dispensaram ao meu companheiro de viagem .
Lorvão prolifica prodigiosamente. É que nada há tão semelhante à opulência desmedida como a miséria crassa: aquela cria bastardos sem temor, esta alimenta filhos sem cuidado. E, como era de prever depois de se ter visto, esta gente, que anda sempre de canivete em punho, nunca o enfia pelo seu semelhante. Em Lorvão há todos os dias insultos, ameaças, injúrias, arrenegos, e, contudo, raro se marca um homicídio. Para tudo esta gente traz perdida a energia...
E quem há-de explicar que assim floresçam, entre a lama, algumas carinhas lindas de raparigas, cujos pés patinham detritos, cujos corações sabem todas as amarguras - todas casam já mães -, emergindo umas cabecitas lindas, olhos como gemas, gemas preciosas de côr e de suavidade?
Quem sabe? serão estes tipos de ciganas, netas ainda das freiras lindas e graciosas que morreram d'amor ... cansadas? Aquela, mais formosa ainda de lenço em touca, será neta de alguma abadessa?
Lá entram no terreiro do convento cheio  de relva, por onde correm míseros garotos esfaimados. Parece, no século XVIII, a hora sombria  das sopas distribuidas aos pobres que viviam nas abas do mosteiro.
Olho as janelas altas,  gradeadas do negro ferro antigo, a querer ver as freiras de mantos brancos. E vejo ainda as mesmas pobres, com mantos negros de miséria. Caem horas da torre. Lorvão é agora um pesadelo de sombras e de tristeza...
Magalhães Colaço


Penacova em imagens I

Três dos ex-libris de Penacova / Av. Abel Rodrigues da Costa

01 maio 2015

O QUE RESTA DO PAÇO DOS DUQUES DE CADAVAL

Fonte da Granja
Quem não conhece a Fonte da Granja? Pensar-se-á que não passa de mais uma construção ao longo da Estrada Verde (N110). Para uns, aquele arco foi simplesmente talhado aquando da construção do chafariz. Para outros,  seria originário de Lorvão, tal como as colunas do Mirante Emídio da Silva.

Ora, o arco que ali se conserva contém em si a memória de uma parte importante da história de Penacova. As colunas do Mirante, essas sim, terão essa origem, mas no caso da Fonte da Granja, aquele pormenor não será mais do que (possivelmente o único) vestígio do Paço dos Duques de Cadaval. Esta informação consta de uma obra do nosso ilustre conterrâneo, Catedrático de História, Nelson Correia Borges.

É também de um outro penacovense ilustre, Dr. José Albino Ferreira [1], o texto que a seguir transcrevemos e que nos fornece informações preciosas sobre a influência dos Duques de Cadaval em Penacova. Conta então, José Albino Ferreira:


Com a implantação do regime liberal, pela vitória definitiva do partido constitucional, por toda a parte se refundiu e transformou a vida social dos portugueses. As antigas casas dominantes desapareceram ou decairam. As fortunas das famílias antigas que em geral se mantiveram ligadas ao partido miguelista estavam muito comprometidas por virtude das invasões francesas e depois pela guerra civil.
Em Penacova aconteceu o mesmo. Eram donatários da vila de Penacova, primitivamente, os condes de Odemira. Esta casa fundiu-se mais tarde, por casamento, com dos duques de Cadaval e assim ficou a ser donatário de Penacova o Duque de Cadaval. Era este Senhor que superintendia em todos os serviços judiciais e administrativos. Nomeava o Juiz e demais funcionários públicos.
Tinha em Penacova o seu Paço, com capaela anexa, no sítio onde agora está a Casa do Tribunal[2]. Tinha em Penacova o seu capelão e procurador, pois era proprietário de muitas terras, lagares e azenhas, e recebia delas as rendas e foros.
O Duque de Cadaval era o Governador Militar de Lisboa quando os miguelistas foram vencidos pelas tropas liberais em Almada. Como visse que não podia manter-se em Lisboa, retirou com as tropas fiéis, e assim, depois da Cionvenção de Évora Monte e termo da Guerra Civil, emigrou para França, não voltando a Portugal.[3]

Como consequência, resolveu o Duque de Cadaval vender todos os bens que possuia em Penacova.
Fotomontagem: Penacovaonline
O Paço foi destruido por um incêndio e depois vendido à Câmara de Penacova, que ali construiu[4] o edifício dos Paços do Concelho e o Largo Fronteiro que hoje tem o nome de Largo Alberto Leitão.
Tinha a Casa de Cadaval uma Capela anexa ao Paço, que foi destruída pelo incêndio, uma capela lateral na Igreja de Penacova, onde ainda está o escudo das armas dos Duques de Cadaval. É uma capela ampla com sacristia. O estilo é de boa renascença.
Com o desaparecimento da fortuna da Casa de Cadaval em Penacova, desapareceu o capelão, o procurador e e mais pessoal. Com o incêndio desapareceram muitos documentos que, certamente, dariam luz para a história de Penacova.




[1] Oriundo da freguesia de Sazes, era formado em Direito, foi notário em Penacova e foi também Presidente da Câmara quer no tempo da monarquia (era-o aquando da inauguração do Mirante) quer mais tarde já no regime republicano. Curiosamente também era  Padre (sem paróquia atribuída mas celebrava missa). Personalidade marcante do nosso concelho e tão pouco conhecida e valorizada.
[2] Texto escrito nos anos quarenta do séc. XX
[3] Ainda hoje a Família Cadaval vive em França e só vem a Portugal com curta demora.,; mas conserva o seu apego à pátria. Os varões, chegando à idade própria, cumpremos seus deveres militares, segundo me consta.
[4] Inaugurado a 1 de Janeiro de 1869 sendo presidente da câmara Constantino Almeida Amaral.

25 abril 2015

O 25 de Abril de 1974 em Penacova


Como em muitos pontos do país, a notícia da Revolução foi recebida em Penacova com um misto de entusiasmo e de apreensão por parte da população em geral.
Foi só no dia 1 de Maio que  as manifestações públicas e mais significativas se fizeram sentir. Neste dia, muitas pessoas se concentraram em frente da Câmara Municipal e de seguida tomaram parte numa sessão no Salão Nobre dos Paços do Concelho. Foi enaltecido o Movimento das Forças Armadas e foi eleita uma Comissão para gerir o Município (recorde-se que o Presidente da Câmara no momento do 25 de Abril era o Dr. Álvaro Barbosa Ribeiro).
Dessa Comissão  faziam parte Fernando Ribeiro Dias, Manuel Ribeiro Santos, Rui Castro Pita, Joaquim Manuel Sales Guedes Leitão, José Marques de Sousa, Teófilo Luís Alves Marques da Silva, Américo Simões, Adelaide Simões, Artur José do Amaral, Artur Manuel Sales Guedes Coimbra, António Coimbra Soares e António de Sousa.
Tomou posse a 2 de Maio e de entre os seus elementos foi escolhido para presidir à mesma o Dr. Teófilo Luís Alves Marques da Silva, ficando como vice-presidente, António de Sousa. O terceiro elemento com mais responsabilidades no executivo passou a ser também  o Engº Castro Pita.
Teófilo Marques da Silva, natural do Porto, licenciado em História, militante do Partido Comunista Português era professor e director do Ciclo Preparatório de Penacova desde 1971.
Perante as dificuldades em satisfazer os anseios das populações e também confrontados com algumas atitudes como aquela em que Castro Pita foi agredido em plena sessão da Câmara, a Comissão apresenta a demissão em Agosto de 1975, mantendo-se entretanto em funções por mais algum tempo. Em entrevista concedida em 2002 ao Jornal de Penacova, Teófilo Marques recorda o ambiente que se viveu em Penacova no 25 de Abril.”A revolução dos cravos foi recebida com grande júbilo, pelo menos, por parte das pessoas com quem eu contactava. Claro que esse sentimento positivo não era unânime, havia pessoas que estavam mais identificadas com o ideal do Estado Novo, mais “encostadas” ao antigo regime e, naturalmente, tinham as suas próprias ideias que não coincidiam com as que tinham levado à revolta de Abril. Por mim, eu já há muito que assumia a minha tendência para as ideias de esquerda.”
Teófilo Luís Alves Marques da Silva (2 de Maio 74 a Agosto de 75:
 nesta data pede a demissão ficando em funções durante
 mais algum tempo)) e
José Alberto Costa (24 de Abril de 76 a 31 Dez 76)

Consumada a intenção de se demitir, a Comissão, reunida com os representantes locais dos Partidos entendeu indigitar para Gestor Municipal, o 1º Sargento de Infantaria, José Alberto Costa, que exerceu essas funções entre 24 de Abril  e 31 de Dezembro de 1976.
Refere o jornal Notícias de Penacova que “depois de muito instado e sendo indivíduo sempre pronto a dar o seu melhor a bem do País, militar irrepreensível, acabou por aceitar e a população penacovense congratulou-se com o facto; estava garantida a continuidade da obra municipal, iniciada pela Comissão Administrativa cessante e que neste jornal foi bem demonstrada.”

12 abril 2015

Cartas brasileiras: Não me importam os motivos


Santo Deus, e meus ouvidos! Pelo que está escrito no Apocalipse, é sofrimento para ninguém botar defeito. Os anjos chegarão fazendo muito barulho; na primeira trombeta o fogo jogado sobre terra irá causar “um arraso”, queimará um terço das árvores e das ervas. Na segunda trombeta, lança-se fogo e sangue sobre o mar, matando um terço das criaturas e destruindo um terço dos navios. E em cada uma delas, até à sétima, desgraças para ninguém botar defeito. Quando o terceiro anjo tocar sua trombeta cairá do céu uma grande estrela ardendo como uma tocha, cairá sobre a terça parte dos rios, e sobre as fontes das águas. Ao som da quarta trombeta o Sol a Lua e as estrelas trarão escuridão, um terço do dia parecerá noite. Ainda com os ouvidos doendo, com os tímpanos quase estourados, ouviremos a quinta trombeta anunciando uma estrela que caindo do céu abrirá um grande abismo; gafanhotos e escorpiões cobrirão a terra, quem não tiver o sinal de Deus na testa pode esperar o pior. Na sexta trombeta mais dor. Das cabeças dos cavalos, como cabeças de leões, sairão fogo e enxofre. Nessa altura um terço dos homens já terá morrido. Não bastassem os ouvidos, a dor não irá parar com a sétima, a trombeta final anunciando o novo reino do Senhor.

clique na imagem para ouvir
Será que não daria para trazerem junto Artie Shaw e sua orquestra, quem sabe Benny Godman. Por que não Ray Anthony! Talvez Lester Young. As opções são tantas que não há desculpas; dispenso os motivos; por Deus apenas façam. Ou não basta ouvir as ambulâncias desesperadas gritando pedindo passagem, presas pelo trânsito caótico, lá dentro uma mulher para dar a luz, um idoso nos últimos suspiros ou uma criança chorando.

P.T.Juvenal Santos ptjsantos@bol.com.br


09 abril 2015

Lorvão: Memória e Tradição


Em parceria com a Associação Pró-Defesa do Mosteiro de Lorvão, o município de Penacova, promove, no âmbito das Comemorações dos 300 anos da Trasladação das Santas Rainhas Teresa e Sancha, e do Dia Internacional dos Monumentos e Sítios, o Colóquio Internacional "Lorvão: Memória e Tradição", bem como um conjunto de outras iniciativas, anuncia a página da Câmara Municipal. 

Fica a transcrição:

Tendo como objetivo, nas palavras de Fernanda Veiga, Vereadora da Cultura do município, "sensibilizar os cidadãos para a importância do património na nossa sociedade, o tema do Dia Internacional dos Monumentos e Sítios - "Conhecer, Explorar, Partilhar" - chama  a atenção para a necessidade de conhecermos o Património e a sua potencialidade enquanto recurso vital para um desenvolvimento harmonioso, bem como para a imprescindibilidade de o partilharmos, entendendo-o como legado e possibilidade de futuro.

É neste âmbito e, tendo como, premissa base a importância do conhecimento, para melhor explorar a potencialidade dos recursos patrimoniais na sociedade contemporânea, partilhando ideias, saberes, perspetivas, preservando a identidade local e a ligação profunda às comunidades, que nos dias 17 e 18 de abril, o município de Penacova comemora o seu Património, com um programa dirigido a todos os públicos e que terá como, expoente, o Colóquio Internacional "Lorvão: Memória e Tradição", que terá lugar pelas 14H30, do dia 17 de abril, no Mosteiro de Lorvão".

O colóquio, cuja sessão de abertura será presidida pelo Presidente do município de Penacova, Humberto Oliveira, conta, na sua Sessão de Abertura, com a presença de representantes da Junta de Freguesia de Lorvão, da Direção Regional da Cultura do Centro, da Consejeria de la Cultura da Junta de Castilla y Léon, do Ayuntamiento de Cabezón de Pisuerga, da Associação Pró-Defesa do Mosteiro de Lorvão, será moderado pelo Prof. Doutor Luís Reis Torgal, tendo como intervenientes: Arq. Fábio Nogueira, "A Evolução do Mosteiro e o Condicionalismo que impôs ao lugar de Lorvão"; Mestre Paula Silva, "Cultura e Património Imaterial de Lorvão"; Prof. Doutor Humberto Figueiredo, "O Património, as Comunidades e o Desenvolvimento"; D. Victor Pesquera, "A História do Mosteiro de Santa Maria de Palazuelos". Às comunicações dos palestrantres seguir-se-á, um momento para debate, após o que será realizada uma visita guiada ao Mosteiro de Lorvão e sua envolvente.

Ainda no dia 17 de abril, e logo pela manhã, o Projeto PENANIMA, realizará uma recriação histórica no Pátio do Mosteiro de Lorvão, dirigida ao público infantil e, à noite, pelas 21H30, a Igreja do Mosteiro de Lorvão será palco, pelas 21H30, de um Concerto realizado em parceria pela Escola de Artes de Penacova e o Conservatório de Música de Coimbra, com a apresentação das classes do Prof. Rodrigo Carvalho e das Profs. Joaquina Ly e Maria José Nogueira, respetivamente. A segunda parte do concerto estará a cargo dos Profs. Rodrigo Carvalho e Júlio Dias.

No dia 18 abril, o município promove, a partir das 09H30,  uma Caminhada na Ribeira de Arcos, seguida de Almoço no Forno Comunitário de Lorvão. Os interessados em participar nesta iniciativa deverão concentrar-se pelas 09H00 em Penacova (saída dos autocarros junto ao edifício da Câmara Municipal de Penacova) ou em Lorvão, pelas 09H15 (saída dos autocarros junto ao Mosteiro de Lorvão).

A participação no Colóquio "Lorvão: Memória e Tradição", bem como na "Caminhada na Ribeira de Arcos" é de acesso gratuito.


As Comemorações dos 300 anos da Trasladação das Santas Rainhas Teresa e Sancha decorrerão até 18 de outubro, com um conjunto de iniciativas culturais, religiosas e gastronómicas diversificadas, organizadas em parceria entre o Município de Penacova, a Associação Pró-Defesa do Mosteiro de Lorvão e a Paróquia de Lorvão, contando com o apoio institucional da Junta de Freguesia de Lorvão, Direção Regional da Cultura do Centro, Diocese de Coimbra, Grupo Etnográfico de Lorvão, Filarmónica Boa Vontade Lorvanense e Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Penacova.


26 março 2015

Jornal Notícias de Penacova: 26 de Março de 1932 - 28 de Dezembro de 1978

A primeira página do nº 1 (26 de Março de 1932)
O Notícias de Penacova, veio a lume pela primeira vez, a 26 de Março de 1932 Faz, portanto, hoje, 83 anos. Teve uma existência de quase meio século.

O primeiro director e proprietário foi José de Gouveia Leitão (que, recorde-se, era  filho do Conselheiro Artur Leitão e foi Presidente da Câmara). O editor era João Simões Barreto (que também estivera ligado ao Jornal de Penacova). João Barreto era Fiscal dos Impostos, escritor e fotógrafo amador. Como redactor principal encontramos o nome de Joaquim Jerónimo da Silva Rosa, natural de Lorvão (casado com a escritora Lúcia Namorado, prima de Maria Lamas e mais tarde fundadora da Revista Os Nossos Filhos). Na altura era escrivão do Julgado Municipal de Penacova. O administrador era o professor e delegado da Junta Escolar, José Joaquim Nunes.

Apresentou-se como ‘’Semanário Regionalista” e ao mesmo tempo "integrado na corrente que de norte a sul” se desenhava. Passado um ano de publicação, assume-se como afecto do “nacionalismo triunfante”.


Até 1937 coexistirá com o Jornal de Penacova num clima de alguma tensão. Em 1936 a direcção passa de J. Gouveia Leitão para Monsenhor José de Oliveira Machado.

Nas últimas décadas de existência será marcado pelas figuras do Professor e Delegado Escolar Joaquim de Oliveira Marques e do Padre Manuel Marques (que assinava as suas escritas como Manuel do Freixo). Este padre, natural de freguesia de Figueira de Lorvão, escreveu durante muitos anos no bem conhecido “Amigo do Povo” a crónica À Sombra do Castanheiro / Ao calor da Fogueira. O Arcipreste, e mais tarde Cónego, Manuel Vieira dos Santos foi também seu proprietário. Era  natural de Santa Catarina da Serra, ali perto de Fátima, onde está sepultado,  .

Com a morte deste, em 1966, a gestão passou  para a Paróquia de Penacova. Após o 25 de Abril de 1974 Joaquim de Oliveira Marques é “saneado” e os seus directores passarão a ser os sucessivos párocos de Penacova.

 Por motivos financeiros, conforme oficialmente anunciado,  terminará em 8 de Dezembro de 1978.

22 março 2015

Penacova rural: início dos anos oitenta







FOTOGRAFIAS DE VARELA PÈCURTO*
RECOLHIDAS
NO CONCELHO DE PENACOVA NO INÍCIO DOS ANOS OITENTA


O MEIO RURAL EM PORTUGAL

Como faz notar F. O. Baptista (1996: 53), na primeira metade dos anos setenta (1970/74), a superfície semeada anualmente no Continente já baixara 23% relativamente a 1960/64, e, em 1985/88, esta quebra era já de 45%. Entretanto, compram-se muito mais adubos, pesticidas, motores e tubos de pvc para rega, e tractores.

Em 40 anos a química e a mecânica instalam-se nos campos. Da vila ou da cidade chegam também sementes, rações e gasóleo.

É a mudança tecnológica bem patente na percentagem dos consumos intermédios na produção final da agricultura, que passa de 6% em 1950 para 45% em 1990 (F. O. Baptista, 1996: 40).

 in O MEIO RURAL EM PORTUGAL: ENTRE O ONTEM E O AMANHÃ - Comunicação apresentada  por José Portela  (Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro) ao Seminário Internacional A Revitalização do Mundo Rural e o Ordenamento do Território, Lisboa, 15-17 de Maio de 1997. 



* publicadas no livro Penacova de Varela Pècurto, 
   edição Hilda, Coimbra 1984 

18 março 2015

Cartas Brasileiras

Crónica de 
Paulo Santos

                                             DEVOLVA O ANEL

           
            De uns tempos para cá, as coisas andam por demais estranhas no meu país, fica cada vez mais difícil saber o que é ético e moral.
Vozes irão se levantar para dizer que a estranheza  não é de hoje, começou em 1808, com a chegada de Dom João VI e sua a corte, e que o “apadrinhamento”, inchaço da máquina pública, vem desde aquela época, pois que na fuga de Portugal, entre 10 e 15 mil portugueses vieram para o Brasil. Claro, o “povo” lá ficou não por não temer Napoleão, mas por tão ter como vir.
O tal “déficit  público” é  herança maldita; treze anos após a chegada da Família Real o buraco no orçamento tinha aumentado mais de vinte vezes. Já  naquele tempo contratavam artistas com o dinheiro “da viúva” e esbanjavam o que não tinham com viagens dos integrantes da “corte” (um dia vi pela TV Senado aprovarem o requerimento para que um senador se ausentasse do país para participar de um congresso em Saigon; 30 dias!).
O Banco do Brasil  criado em 1808 estava arruinado em 1820, seus depósitos em ouro, que serviam para de garantia para a emissão de moeda, representavam apenas 20% do total em dinheiro; 80% era “moeda podre”. Não fizeram o reajuste fiscal!
A “caixinha” corria solta nas concorrências e pagamentos dos serviços públicos; se o interessado não “comparecesse” com os 17% os processos simplesmente paravam de andar. Portanto, por que reclamar tanto do que acontece na Petrobrás!  
Ora, como se vê, dirão para se justificar, as coisas por aqui desandam desde o tempo da coroa. Verdade! Os que aí estão não foram os únicos, mas isso pouco resolve, não limpa a alma de ninguém; padrões éticos estão mais na vergonha de cada um.   
Imagine, alguém que tendo cometido um assalto com sua quadrilha,  presenteia a mulher com o anel de brilhante que roubou! Ainda que ela desse uma de Dona Maria, a louca, e dissesse que não sabia que o marido era ladrão, que o anel era roubado, ou preferisse desconhecer a origem do bagulho, poderia querer ela ficar com o produto do roubo! Certamente que não, diremos nós; há os que acham que pode.
Tudo bem que não deva ser presa, pensamos nós, mas que devolva o anel! 

P.T.Juvenal Santos
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Nota: 1) As citações sobre a chegada da família real foram obtidas no livro 1808 de Laurentino Gomes, um livro de história do Brasil e Portugal, publicado em 2008. O autor recebeu o prêmio de melhor Livro de Ensaio da Academia Brasileira de Letras e Prêmio Jabuti de Literatura. Escreveu 1882 e 1889 completando a trilogia.

CLIQUE NA IMAGEM PARA VISUALIZAR O VÍDEO

Nota: 2) Dia 15 de março de 2015, a população saiu às ruas no Brasil para protestar contra a corrupção, contra o verdadeiro assalto cometido contra a Petrobrás, a nossa empresa queridinha. O Ministério Público, recebendo as denúncias da chamada Operação Lava Jato indicia por diversos crimes, empreiteiros,  diretores da Petrobrás e políticos. O esquema enriquecia os donos das empreiteiras, os diretores da Petrobrás, e fornecia dinheiro para partidos políticos principalmente para os integrantes da base aliada do Governo: PT. PMDB e PP, financiando inclusive campanhas eleitorais.  É disso que trata o vídeo.                                     

16 março 2015

Bizarros comportamentos com 480 milhões de anos

Ainda sobre o assunto que temos vindo a tratar relacionado com a tal "Pedra Curiosa", acrescentamos hoje mais alguma informação, especialmente dedicada àqueles que estão empenhados e estão a levar a sério a hipótese de termos na Livraria do Mondego mais um elemento que enriquecerá aquele local. Poder, aí, onde há  100 anos foi encontrado, observar aquele icnofóssil (ou uma réplica) ainda preservado e visitável no Museu Geológico da Universidade de Coimbra, seria sem dúvida mais um ponto de interesse a acrescentar àquele sítio.

O texto que se segue, referente a Penha Garcia, muito bem se poderia aplicar à Livraria do Mondego, dado que as condições materiais e temporais são as mesmas. Por isso onde se lê Penha Garcia, poderíamos ler  Livraria do Mondego, Entre Penedos...


Icnofósseis de Penha Garcia

Cruziana furcífera - Penha Garcia
Fotografia de Pedro Martins

Penha Garcia há 480 milhões de anos. Um mar negro pela noite austral é varrido por ventos ciclónicos que erguem ondas colossais. Nesta paisagem de trevas , pouco mais se vislumbra do que pequenos baixios arenosos despojados de vida, um mar gélido estende-se para além do horizonte. Terra firme existe a algumas centenas de quilómetros, uma gigantesca massa continental onde se individualizam apenas maciços rochosos, desertos pedregosos, lagos e rios cor de terra. O verde não existe.

As primeiras plantas terão um papel decisivo na formação e fixação de solos apenas 65 milhões de anos mais tarde.

Assim, pouca coisa vai sucedendo na terra, para além de uma rápida erosão causada pelos rios numa paisagem desértica.

Abaixo da superfície líquida crispada, a vida floresce  e fervilha de emocões. Colónias de vermes poliquetas e foronídeos sedentários estendem os seus apêndices plumosoas às correntes marinhas a partir das suas tocas verticais  ou em forma de U, quais redes para a pesca  de minúsculas partículas orgânicas em suspensão nas águas agitadas.

passagem de um grande artrópode  filocarídeo ( semelhante a um camarão encerrado numa concha) nadando sobre estas colónias de “pescadores” faz com  que , num piscar se olhos,  os poliquetas e foronídeos se escondam no interior dos seus tubos escavados nos fundos arenosos.

As fortes correntes de fundo que modelam a areia numa sucessão de cristas paralelas e levantam nuvens de finas partículas também são o fulcro do alimento para os braquiópodes linguliformes. No entanto estes seres vivem enterrados  na areia no interior da sua concha bivalve, mantendo uma ligacão com o exterior para respirar e obter alimento.

A maior profundidade milhares de  trilobites revolvem o fundo arenoso em busca de alimento, adoptando várias e inovadoras estratégias de comportamento que lhes permitem obter mais comida com menos esforço ( Neto de Carvalho, 2006). Basicamente as escavações que as trilobites produzem entre níveis de areia e argila, num acto continuado de assimilação dos abundantes detritos orgânicos, correspondem sulcos bilobados provocados pelo movimento síncrono de mais de 13 pares de patas. Neste colossal fast food de Penha Garcia não é raro ver o trabalho de algumas das maiores trilobites que alguma vez terão existido, com quase meio metro de comprido: verdadeiros gigantes no mundo dos invertebrados! São animais que se alimentam em grupos compostos por dezenas de indivíduos da mesma idade.

Afastados destes gigantes couraçados,  verdadeiras escolas de trilobites com pouco mais de 4mm de comprido testam as estratégias de alimentação e os modos de vida que fizeram deste, um dos mais bem sucedidos grupos de artrópodes de sempre, até desaparecerem  definitivamente  dos oceanos  230 milhões de anos mais tarde.

São janelas temporais deste mundo perdido há muito que poderá encontrar ao longo da Rota dos Fósseis, em Penha Garcia.

Cada camada de quartzito, hoje verticalizada, conta um instante passado no fundo marinho de há 480 milhões de anos. Aprender a ler este livro sobre a História da Terra é despertar para a solução de múltiplos enigmas  que constituem a evolução da Vida.


capa do livro em referência
Carlos Neto de Carvalho (texto) e Pedro Martins (Imagens) Geopark Naturtejo da Meseta Meridional - 600 milhões de anos em imagens. Edição: Naturtejo, E.I.M. – Câmara Municipal de Idanha-a-Nova, 2007



in Carlos Neto de Carvalho e Pedro Martins ,op. cit.


 Se não conhece Penha Garcia, deixamos a sugestão de uma visita!

15 março 2015

Cartas Brasileiras: Com Cópia Oculta


Ao enviar email em cadeia para meus amigos, utilizo sempre o recurso CCO (Com Cópia Oculta); evito expô-los. Em uma dessas mensagens, encaminhava a todos as respostas recebidas, sem que ninguém soubesse de quem era. O incrível era que eu não conhecia pessoalmente um dos meus grandes amigos.
Como ter amigo que não se conhece? Se eu contasse veria que pode.
Título do email: "Eu não estou me comportando mal"; o qual escondia uma mensagem cifrada. No texto, a morte de Robin Williams, e um link para que ouvissem uma música, uma descoberta, então recente; desconhecia a música e o intérprete, mesmo sendo preciosidade dos anos 40! A beleza nem sempre se nos apresenta, temos que buscá-la.
Logo veio a primeira resposta de um o amigo que se valeu de Saramago:  "Ninguém está falando que está"; ou seja, que eu estivesse "enchendo". Passou ele batido pelo texto cifrado. E seguiu falando do ator: ”atuação extraordinária em Bom dia, Vietnã. Acho que o diretor deixou-o fazer o que quisesse. Outra atuação maravilhosa é a do professor, em Sociedade dos Poetas MortosÉ isso aí. Matarei a saudade, revendo seus filmes”.
O amigo “desconhecido” comentou: “Devo dizer-lhes que estou ouvindo a canção; eu ainda não há conhecia, foi amor à primeira vista; incrível, como pude não conhecer essa maravilha! Como não sabemos de nada!”
            Outro escreveu: “ah, eu também sou fã de Robin Williams, digo sou, porque sou fã de Burt Lancaster, James Stewart, Audrey Hepburn, Ava Gardner, etc., etc.”.
Animado, um queria mais: “espero que nos encontremos novamente nas próximas mensagens, estou adorando essas conversas;  a música é adorável!
            Há sempre os mais comedidos: “Obrigado pela música, de extremo bom gosto; enfeitou meu sábado”.
            A morte do ator provocou mais comentários: “concordo, foi sim um belo filme. Linda canção! Bom final de semana, boas viagens. Abraços do amigo de sempre.”
          Como eu, um saudosista: “adorei Sociedade dos Poetas Mortos;  não tenho visto mais filmes tão lindos assim. Ou eu me tornei um chato, ou não fazem mais daqueles filmes”.
O fim daquela conversa veio com o email que enviei: “Interessante, amigo de sempre não é aquele que é desde a eternidade, mas aquele que ao se tornar permanece assim. Abraço a todos. Tenho que ir, minha mulher já me telefonou para o almoço; explico, meu netinho quer comer comida chinesa no Shopping, eles foram eu fiquei, agora lá vou eu.”
            Não me censurem pela brincadeira de “Eu não estou me comportando mal”, segue o link para que ouçam “Ain´t Misbehavin´ ”; é linda!


PS: o amigo que não conhecia partiu de repente, tive que apagá-lo dos meus contatos. Muito triste.  Ah! Ele adorava a música “Misty”