Mostrar mensagens com a etiqueta lenda. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta lenda. Mostrar todas as mensagens

terça-feira, dezembro 17, 2024

Casal de Santo Amaro: a Lenda da Imagem do Santo Padroeiro

Imagem de Santo Amaro que se venera no Casal

Texto de Alípio Barra 
in Jornal Nova Esperança 
31 de Março de 1999

Amaro ou “Mauro”, segundo o livro Santos de Cada Dia, nasceu em Roma de família senatorial e foi entregue aos cuidados de S. Bento, quando tinha apenas 12 anos. Correspondeu tão bem à afeição e solicitude do Mestre que foi proposto como modelo aos outros religiosos. S. Gregário exaltou-o por se ter distinguido no amor da oração e do silêncio e conta que a exemplo de S. Pedro foi recompensado da sua obediência caminhando sobre as águas. Foi o caso de um jovem chamado Plácido que caiu no açude de Subiaco. S. Bento soube-o por revelação e chamando Amaro disse-lhe: Irmão Amaro vai depressa procurar Plácido que está prestes a afogar-se. Munido com a benção do Mestre, Amaro correu sobre a água a socorrer Plácido a quem agarrou pelos cabelos e trouxe para a margem não se apercebendo sequer que tinha saído de terra firme. Quando deu pelo milagre atribuiu-o aos méritos de S. Bento. Cumpria tão bem o ideal monástico que todos passaram a considerar nele o perfeito herdeiro espiritual de S. Bento, o sucessor eventual dele. Segundo a tradição foi Amaro quem ficou a substituir S. Bento, quando este se transferiu para Monte Cassino. É-lhe atribuída ainda a implantação do Instituto Beneditino nas Gáleas. Julga-se que veio a falecer em 584.


 Do aparecimento da sua imagem nesta terra, cerca de mil anos depois da sua morte, diz-nos a lenda, contada de pais para filhos, que um dia, há umas centenas de anos, quando uma barreira de terra e pedregulhos caída sobre parte da estrada foi limpa, encontraram uma imagem de Santo Amaro que depois de limpa foi levada para casa de um morador no Casal, mas todos os dias que era levada, no dia seguinte de manhã estava novamente na pedreira.

Por detrás da barreira que foi limpa estava a pedreira na vertical que tinha a meio um cubículo cavado, tipo prateleira, onde teria estado colocado Santo Amaro. Era nesse cubículo que aparecia o Santo, sempre que na véspera era levado dali.

O povo construiu-lhe uma capela a meio do lugar e concerteza depois de festa condigna, foi ali colocado e considerado padroeiro desta terra.

Não se sabe quem teria trazido o Santo Amaro para colocar no cubículo da Pedreira. Teoricamente supõe-se que fazia parte das alminhas que teriam existido naquele lugar e que era ponto de paragem obrigatória dos funerais vindos da povoação de Ribela, pela estrada antiga que fazia ligação na Ribela de Gavinhos, passavam no Casal e seguiam em direcção a Penacova. O cemitério, ao tempo, era junto à Igreja de Nossa Senhora da Guia, que nos anos 30, foi absorvida pelas construções do Preventório.

Quando no início do século foi rasgada a estrada que liga Penacova - Luso, que em princípio só chegava às Contenças, os funerais de Ribela passaram a utilizar esta estrada mas paravam sempre na direcção do local onde havia aparecido Santo Amaro, para rezar os respectivos responsos. Essa paragem era referenciada por uma cruz de madeira que estava pregada numa oliveira.

Diz mais a lenda, que a pedreira onde teria estado o Santo Amaro, foi rebentada já no século XIX e a pedra, foi metida no forno, onde esteve a arder cerca de 72 horas (o normal seriam 36 horas) mas não se transformou em cal.

Quanto aos cabouqueiros que tiveram a coragem de rebentar a pedra, ou foram mandados fazer isso, teriam entrado em doença contínua e morreram com o corpo cheio de mazelas.

O Santo Amaro por ser de pedra, é muito pesado e por isso foi feita uma imagem à semelhança, de madeira, que é a que vai no andor da procissão nos domingos de Festa.

No século XX o Santo Amaro de pedra só saiu duas vezes da Capela: - Uma no início do século. no dia da Festa, que chovia torrencialmente, e não podia sair a procissão e os mordomos colocaram o Santo fora da Capela, à chuva, mas milagrosamente a chuva parou de imediato. A procissão foi feita, mas logo que recolheu e o Santo também, a chuva voltou a cair; - a outra há mais de vinte anos, por promessa, de um conterrâneo nosso, o Armando Xavier, imigrado no Brasil, que ofereceu o relógio existente na Capela e fez a Festa dedicada a Santo Amaro. A juventude desta terra conseguiu com muito esforço adaptar o andor e transportá-lo no longo do percurso percorrido pela procissão, ajudando assim, o nosso amigo Armando Xavier a cumprir a sua promessa.







Fotos:
 página da Comissão de Festas no Facebook (2024)

terça-feira, maio 31, 2022

A lenda da cobra de Penacova


“Isso eu não vi, lá isso não, mas contam!” –  José Vieira in Sol de Portugal - Crónica da Beira Alta, 1918. 


As cobras são, geralmente, animais muito temidos. Despertam sentimentos, geram crenças e dão lugar a ditos. Por exemplo, é frequente dizer-se que as cobras hipnotizam. De onde virá essa crença? Pensa-se que se deve ao facto de as serpentes não possuírem pálpebras móveis, não piscando, pois, os olhos. O seu olhar fixo levou, então,  a acreditar que se tratava de um olhar hipnótico!

Diz-se, no entanto, que a rã fica imóvel quando uma cobra se aproxima. Não por estar hipnotizada, mas pura e simplesmente porque sabe que se permanecer imóvel pode ser mais seguro! E a história do hipnotizador de serpentes, ignorando-se que cobras são, afinal, surdas? É sim, pela vibração do solo que elas detectam a presença de algo. Deste modo, o som da flauta será apenas um atractivo “para turista ver” … Metida num recipiente, que não lhe permite grandes movimentos, é atraída pelo cheiro de urina de rato com que, entretanto, se untou exteriormente a gaita do encantador.

Diz também o povo que se pode formar uma cobra dum cabelo de mulher. Arranca-se um cabelo, necessariamente, com a raiz. Mergulha-se depois numa bacia de água e muda-se a água todas as manhãs até que o cabelo se transforme em cobra.

Ora, conta-se que em Penacova aconteceu uma desgraça por causa de uma cobra gerada por esse processo:

“Uma senhora de Penacova arrancou o cabelo da cabeça, pô-lo dentro da bacia d’água e todas as manhãs lá ia vazá-la e deitar outra nova. Ao cabo de três semanas o cabelo já se movia e no sítio da raiz formava-se a cabeça com dois olhitos vermelhos, boca e dentes.

Um dia a senhora esqueceu-se de mudar a água. Na outra manhã, quando apareceu, a cobrita olhou-a e saltou-lhe na cara. Foi só uma dentada. Ao anoitecer, a pobre senhora morreu.”

“Isso eu não vi, lá isso não, mas contam!” 

 

 

sábado, janeiro 02, 2021

Milagre em Penacova: uma história caída no esquecimento...

Não sei se alguém em Penacova ouviu alguma vez falar deste caso que parece ter sido mesmo verdade. Foi notícia na Gazeta de Lisboa onde chegou por meio de “pessoa de grande crédito, moradora na mesma vila”. 


Ao monte da Senhora da Guia, quando ainda não existia a capela, mas um enorme templo inacabado, foi Isabel Francisca, viúva de Manuel de Brito, "assoalhar" lã levando consigo um filhinho de um mês, chamado António. 

A dado momento, do alto da abóbada da igreja, desce uma enorme ave de rapina, talvez um bufo ou guincho, como refere a crónica, que rapta o bebé, cravando-lhe as enormes garras. Num ápice dirige-se para a zona de Entre Penedos enquanto a mãe, impotente, solta um grito de desespero. 

E naquele momento de grande aflição de imediato implora a protecção de Santo António.

Ora, ao passar sobre a Quinta de Bernardo Cabral de Castello Branco,  presumivelmente na zona de Vila Nova, pousou junto a uma fonte onde existia uma imagem daquele Santo. Afugentada por uns trabalhadores que por ali andavam, a enorme ave de rapina deixou a pobre criança em paz e sem feridas de maior, a não ser “leves” (?) marcas das garras. 

Só podia ser milagre!

E quer os que presenciaram quer os que de tudo tiveram conhecimento mais não fizeram que redobrar a devoção a Santo António, já venerado na antiquíssima capela existente na encosta sul da vila. 




Fontes: Gazeta de Lisboa, 3 de Julho de 1749
              O Padre Santo António de Lisboa de Manoel Bernardes Branco, 1887

sexta-feira, fevereiro 08, 2019

A Lenda dos Três Rios









Muitas das compilações existentes sobre lendas portuguesas a referem, atribuindo-a à tradição oral da zona de Pombeiro da Beira, mas muito raramente é feita referência à versão do Visconde Sanches de Frias na monografia sobre aquela localidade publicada em 1896.


“Mondego, Alva e Zêzere, nascidos da mesma mãe, serpeando pelas vertentes da serra da Estrela, em santa irmandade, amigos e camaradas, viviam tranquilos e alegres, mirando-se cada qual na limpidez das suas águas, e escondendo-se nas gargantas, furnas e sorvedoiros da gigantesca serra. Umas tardes, já quase à boca da noite, envolveram-se em azeda conversa, porque se arrogaram valentias, ao que parece prometeram romper as prisões, que os detinham, trovejaram rivalidades, e acabaram por desafiar-se para uma corrida vertiginosa, cuja meta seria o corpo enormíssimo do mar. O primeiro, que lá esbarrasse...
- Qual dos três saberia melhormente o caminho? — Qual desenvolveria maior tafularia e força? — Quem seria o primeiro a oferecer as suas águas dulcíssimas às salsas águas do mar?
Era o que ia ver-se.
O Mondego, astuto, forte e madrugador, levantou-se cedo, e começou a correr brandamente, para não fazer barulho e não levantar suspeitas, é de crer, desde as vizinhanças da Guarda nos territórios de Celorico, Gouveia, Manteigas, Canas de Senhorim, e dirigiu se, depois de se ter robustecido com a ajuda de colegas, que vieram cumprimentá-lo, à Raiva, na direcção de Coimbra, depois de ter atravessado ofegante as duas Beiras. O Zêzere, que também estava alerta, entrou de mover-se ao mesmo tempo que o Mondego, ocultando-se até certa distância nas anfractuosidades do seu leito penhascoso; foi direito propriamente a Manteigas, onde perdeu de vista o colega, passou também nos terrenos da Guarda, correu para o Fundão, desnorteou, obliquando para Pedrogão Grande; e finalmente, depois de ter atravessado três províncias, deu consigo em Constância, na Estremadura, abraçando-se ao Tejo, a que ofereceu as suas águas, já cansado de caminhar umas 40 léguas e desesperançado de alcançar o mar.

O Alva, dorminhoco e poeta, embora esses atributos não sejam sinónimos, entreteve-se a contemplar as estrelas, mais do que era prudente, adormeceu confiado no seu génio insofrido e nervoso; e, quando despontou, alto dia, estremunhado, em sobressalto, avistou os colegas a correr sobre distâncias a perder de vista. Um desastre, não havia que ver! uma imprevidência, que era forçoso remediar. O Alva atirou consigo de roldão pelos campos fora, rasgou furiosamente montanhas e rochedos, galgou despenhadeiros, bradou vingança temerosa, rugiu ; e, quando julgou que estava a dois passos do triunfo, foi esbarrar com o seu principal antagonista, o Mondego, que lá ia, havia horas, campos de Coimbra fora, em cata da Figueira, onde se lançaria jubiloso no seio volumoso do Oceano, ao ganhar a porfiada contenda.
O Alva esbravejou, como atleta sanhudo, atirou-se ao adversário, a ver se o lançava fora do leito, espumou de raiva; mas... o outro, que deslizava sereno e forte, riu-se, e engoliu-o de um trago.
Ao lugar da contenda e foz do Alva chamou-se propositadamente Raiva, em memória da sua atitude raivosa e do caso tremebundo.”
------------
FRIAS, David Correia Sanches de; VASCONCELOS, Carolina Michaelis de; VASCONCELOS, Joaquim de - Pombeiro da Beira: memória histórica, descritiva e crítica. Lisboa: Tip.de João Romano Torres, 1896


domingo, abril 10, 2016

Mistério em Agrelo

Perto do lugar de Agrelo e da ribeira do mesmo nome, num sítio conhecido por Val do Cavalo, existirá uma espécie de mina escavada de tal modo na rocha, que se torna difícil acreditar que foi feita por mão humana. Conta-se que ao fundo desse túnel há uma lagoa onde a “água não cresce nem mingua e também não corre”. A passagem é de tal modo difícil que ninguém consegue explorar o que está nas entranhas daquele monte.

À volta disto, conta-se também que, há algumas centenas de anos, certo Pároco da Freguesia da Figueira de Lorvão, chamado António de Magalhães, não resistiu à curiosidade. Mandou fazer uma bomba, com a qual trabalharam vários homens durante vinte e quatro horas, na tentativa de fazer secar toda a água da lagoa.

Depois de tirarem a maior parte, dois deles lá conseguiram avançar. Munidos de uma lanterna e a pé praticamente enxuto, conseguiram chegar a umas escadas que os levaram até uma porta que dava para uma enorme sala.

Ora, qual não foi o susto quando se lhe apresenta um conjunto de cinco enormes vultos com armas de fogo apontadas para a dita porta. Cheios de medo recuaram mas tiveram que fugir a nado pois a água tinha entretanto voltado ao nível inicial. 

O medo apoderou-se de tal modo da população que nunca mais ninguém terá tido coragem para desvendar aquele mistério. 

Alguns diziam que talvez fosse um esconderijo dos “mouros”. E quem sabe, mesmo até um esconderijo de um tesouro valiosíssimo. Então, a lagoa serviria para impedir o acesso a quem quer que fosse . Por sua vez, aquelas figuras assustadoras não passariam de um conjunto de estatuetas colossais ali colocadas precisamente para aterrorizar quem ali se atrevesse a entrar... 

Mas a verdade, só Deus sabe – diz o povo...