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domingo, junho 30, 2024

“Aristas”: sabe quem criou esta designação tão característica de Penacova?

Recortes do JP 

Não é estranho a qualquer penacovense o termo “arista”. Igualmente para muitos dos que ao longo dos anos têm visitado Penacova esta palavra não é desconhecida. Poderíamos até falar de um “neologismo” se a designação não existisse, de todo, na língua portuguesa. Os dicionários (salvo a Infopédia da Porto Editora) contemplam-na, mas com um sentido que nada tem a ver com turismo.

O Dicionário Infopédia da Língua Portuguesa define “arista” como “pessoa que se desloca para determinado lugar a fim de se tonificar com ar puro”, que é, afinal, o mesmo sentido que se atribui em Penacova. Em todos os dicionários que consultámos o termo “arista” está relacionado com a botânica e também com a zoologia: “ponta filiforme de alguns órgãos vegetais”; o mesmo que aresta, pragana; “estrutura semelhante a uma cerda, existente na ponta das antenas dos animaís dípteros” ou ainda “peça óssea ou espinhosa do esqueleto de um peixe”.

Terá sido em Penacova que na década de 20 do século passado “nasceu” um significado muito diferente. O termo, mesmo por aqui, acabou por cair em desuso, até ao momento em que há poucos anos o Município recuperou a ideia, criando o “Roteiro do Arista”, selecionando oito locais de grande expressão turística, tantos quantas as letras que formam a palavra PENACOVA. Os visitantes são convidados a  a “apreciar cada um dos locais, e a desfrutar dos bons ares e da natureza, transformando-se assim em verdadeiros Aristas".

Sublinha o site da Càmara Municipal que “no início do século XX, Penacova era um local de eleição para aqueles que genericamente ficariam conhecidos como “aristas”. Pessoas que atraídas pela qualidade do ar que aqui se respirava, bem como pelas paisagens, permaneciam longas temporadas nesta vila.”

Quando se fala no início do séc. XX devemos ter em conta que foi só na primeira década que Penacova começou a ganhar alguma notoriedade nacional, principalmente pela mão de Emídio da Silva, Alfredo da Cunha e Simões de Castro, à volta da Sociedade de Propaganda de Portugal e do “Diário de Notícias”. Apenas nas décadas seguintes a presença dos tais “aristas” mais se fez sentir, prolongando-se até aos anos sessenta.

Mas voltemos à questão de saber como surgiu a designação de “arista”. Ora, no Jornal de Penacova, nº 1251, de 19 de Julho de 1930, podemos ler, sob o título “Penacova – Hotel” o seguinte: “Principiaram já a chegar os «aristas», vocábulo já velhote que deve vir de 1922 ou 1923. “Aristas” são os felizes mortais que vêm até nós provar a pureza magnífica dos nossos ares. Assim o decretou o famoso hoteleiro de Penacova-a-Linda, sr. José Alves de Oliveira Coimbra, numa fuga feliz da sua prosa proverbial. E o que é certo é que as bichas pegaram e agarraram-se com firmeza. O «Penacova Hotel”, já tem «aristas» e já são nove. Alves Coimbra espera mais por estes dias. Não tem vindo porque as caretas de este verão esquisito os traz indecisos, de pé no estribo (…).

Quem escreveu esta nota teria perfeito conhecimento do que estava a afirmar. A fazer fé nessa informação, ficamos então a saber que a designação de “arista” no sentido de veraneante que procurava a nossa vila para tonificar os pulmões (numa época em que grassava a tuberculose, não esqueçamos), foi José Alves de Oliveira Coimbra, personalidade carismática em Penacova no mundo do comércio e também da política local.


Quem foi José Alves de Oliveira Coimbra? Nasceu em Gavinhos, Figueira de Lorvão, no dia 19 de Julho de 1883. Filho de José Alves Marques e de Maria Manuela de Oliveira Coimbra,

Além de farmacêutico e comerciante em diversos ramos, fez parte do núcleo mais activo do movimento republicano em Penacova.

Integrou o grupo que no dia 6 de Outubro de 1910 percorreu a vila “convidando os cidadãos para assistirem à proclamação da República nos Paços do Concelho”, e fez parte da primeira Comissão Administrativa. Assumirá a Vice-Presidência da Câmara por diversas ocasiões.

José Alves de Oliveira Coimbra também se distinguiu no Jornal de Penacova do qual foi proprietário, editor e director durante quase toda a década de vinte. Em 1920, quando Amândio Cabral, já no Brasil, cedeu a propriedade daquele jornal, foi a empresa "Alves Coimbra & Cª Lda" que o comprou, passando a ser impresso na “Tipografia Alves Coimbra”.

Também foi farmacêutico, tendo mesmo, depois de “oito anos de boa prática farmacêutica”, feito exame para Farmacêutico de 2ª classe, em Julho de 1905 , na Escola de Farmácia de Coimbra.

Sócio principal da Firma Alves Coimbra & Cª Lda, mudou, em 1908, o comércio de mercearia e ferragens da Rua Alves Mendes "para o prédio no Largo Alberto Leitão, ainda em construção, propriedade de Augusto Leitão". Nos finais da década de vinte foi também proprietário e gerente da do Penacova-Hotel.

Faleceu em Penacova no dia 3 de Outubro de 1936, com 53 anos de idade.


sábado, junho 20, 2020

Os dias dos aristas: oxigenar os pulmões, piquenicar, pescar, conviver na Pérgola, dançar no Club ...




Durante algumas décadas caído em desuso, o termo foi agora recuperado para a promoção turística de Penacova. O "Roteiro do Arista" selecciona oito locais de maior expressão turística, tantos quantos as letras que formam a palavra Penacova. 

A criação da Sociedade de Propaganda de Portugal (1906), onde militavam destacadas personalidades, entre elas Alfredo da Cunha e Manuel Emygdio da Silva e a criação da Repartição de Turismo, no seio do Ministério do Fomento (1911), foram decisivas para o desenvolvimento do turismo no nosso país. 

Acompanhando o movimento europeu de valorização do turismo, e acreditando-se que o turismo podia ajudar o país a sair da profunda crise social e económica que atravessava, realizou-se em Lisboa, em 1911, o IV Congresso Internacional de Turismo, de cujo secretariado fez parte Emídio da Silva. Também Alfredo da Cunha, director do Diário de Notícias, teve um papel importantíssimo neste processo. 

A inauguração do Mirante em 1908 que além de Emídio da Silva, que tinha conhecido Penacova pela mão do Deão Leite, e de Alfredo da Cunha, trouxe a Penacova nomes importantes da elite lisboeta e catapultou as belezas da vila para as páginas dos jornais (Diário de Notícias), das revistas (Serões) e dos roteiros turísticos que começaram a surgir. 

Estamos convencidos que Penacova, com as suas belezas naturais, com os seus “bons ares”, com a vantagem de integrar o triângulo turístico Coimbra- Luso – Penacova, só beneficiou deste movimento nacional e se afirmou como estância turística porque teve a sorte de seduzir “apaixonadamente” pessoas influentes do nosso país que se tornaram embaixadores de Penacova em todos os areópagos que frequentavam. Recordemos alguns dos seus nomes: Emídio da Silva, Alfredo da Cunha, Raul Lino, Simões de Castro e Oliveira Cabral (mais tarde). 

Foi assim que Penacova se tornou terra de “Aristas” e na década de quarenta “regorgitava” já de “ilustres creaturas” que “atraídas pelos bons ares, águas e pitorescas paisagens“ aqui vinham gozar as suas férias para “oxigenarem os seus pulmões e tonificarem os nervos” envolvidos pelo “magnífico ambiente" de "verdadeiro sanatório" e "carinhosa hospitalidade". 

Gazeta de Coimbra[1] noticia em 1932: "Penacova tem sido este ano muito concorrida por famílias que ali foram passar a época calmosa, sendo também numerosas as excursões que têm vindo à Sintra do Mondego". Ficamos também a saber que "a maior parte das famílias que ali têm feito vilegiatura são de Lisboa e, em geral, divertem-se pescando no Mondego, realizando pic-nics, passeando em barcos, reunindo-se na Pérgola e organizando bailes no Club." 

Ainda não se tinham "descoberto" as praias, por isso de banhistas não tem Penacova histórias para contar… mas de aristas e excursionistas muitas marcas ficaram nesta " terra de encantamento", nesta terra que inspirou muitos escritores e poetas:

  “Eis ao longe Penacova… / P'ra lá vai o pensamento / É formosa e sempre nova / E terra de encantamento // D'aquele Mirante altivo / E de tamanha grandeza / Fica nosso olhar cativo / De tanta, tanta beleza …”[2]


[1] Setembro de 1932
[2] Grupo Musical Recreativo de Coimbra