Fotomontagem: quem sabe, a estação de Penacova teria sido semelhante a esta, se o projecto tivesse avançado. |
Os estudos foram realizados e na Câmara dos Deputados[1] o assunto foi exaustivamente discutido. Mas não passou do papel. Na época colocavam-se várias hipóteses para o traçado da Linha da Beira Alta: pelo sul do Mondego (Coimbra, Miranda do Corvo, Arganil, Seia, Celorico, Vilar Formoso) e a norte do mesmo rio. O traçado norte propunha três soluções quanto ao local de entroncamento com a linha do Norte: Coimbra, Pampilhosa ou Mogofores. Estas últimas não eram muito diferentes pois, a partir de Trezói, o traçado seria o mesmo. Já a primeira implicava um desenho completamente diferente.
Proposta por Boaventura José Vieira[2]
em 1874, partia de Coimbra B, subia o Vale de Coselhas, passava entre o Tovim e
Santo António e rumava na direcção das Torres do Mondego, percorrendo diversos túneis. Daí, contornando sempre a
margem direita do Mondego, dirigia-se a Penacova, seguia para a zona da Foz do
Dão e, pela margem esquerda do Dão, atingia Santa Comba. Esta proposta não foi
avante, por diversos motivos, que não apenas financeiros.
As estações localizar-se-iam, além de Coimbra, em Penacova,
Almaça e Santa Comba Dão. Seriam construídas nove casas de guarda, de cinco em cinco quilómetros. Imagine-se, pois, como a história económica e social de Penacova
e a fisionomia do concelho seriam hoje muito diferentes. Teria o caminho de ferro
feito concorrência à navegação comercial do Mondego? Ou, pelo contrário, ficaria comprometida a viabilidade da
exploração da linha férrea face ao transporte fluvial? Não sabemos, mas o certo
é que o comboio acabou por vencer a embarcação. A abertura da linha da Beira Alta em 1882 foi uma
das causas que conduziram à decadência do pujante movimento de pessoas e
mercadorias, que assegurava o intercâmbio
da Beira Alta com Coimbra e Figueira da Foz.
Já deixámos as Torres e as ribeiras de Valbom, Silveira e
Caneiro para trás. Pontes, viadutos, obedecendo às voltas e voltas que o rio impõe. Ao Km
17, na Ribeira da Peneirada, surge-nos um túnel de 600 metros. Já um outro, a
seguir à Ribeira de Lorvão, tem apenas 100. E atingimos Penacova, ao Km 22.
Aqui, mais dois túneis. Um de 60 metros e outro, por baixo da vila, com 190
metros. Agora, um viaduto sobre o Vale das Laranjeiras. Para transpor a massa
quartzítica de “Entre Penedos” foi necessário construir grandes muros de
suporte e cortes de 12 a 15 metros na rocha. O comboio avança na direcção da Raiva.
Ao Km 25, mais um viaduto de 30 metros e na Raiva um túnel com 250 metros para
passar à encosta de Gondelim. Outros
viadutos sobre a Ribeira de Gondelim e do Penso, para chegar ao Cunhedo, ao km
31.
Foge a luz do dia ao entrar no túnel do Cunhedo. São 225
metros debaixo da terra. Segue-se um viaduto, de 150 metros de extensão e 20 de
alto, que nos leva à estação de Almaça.
Gentes de S. Pedro de Alva e Mortágua apanham aqui o comboio. Vale de Porcas,
mais um viaduto. Do lado de lá do túnel irá aparecer o vale do Dão. Mais
pontes, mais viadutos, mais túneis. Agora, na margem esquerda do Dão, há que
transpor cinco viadutos, alguns com 35 m de alto, para chegar a Santa Comba. Contámos as curvas de Coimbra até aqui: 75, o que
corresponde a 49% do percurso. Viadutos: 22, com média de altura de 31 metros.
Pontes: 15 (mais duas para passagens inferiores). Em 45 quilómetros!
Voltemos ao séc. XXI. Não admira, pois, que se tenha
abandonado esta solução, podemos pensar. Mas, feitas as comparações, por
exemplo entre a proposta Mogofores e a proposta Vale do Mondego, conclui-se que
só quanto aos viadutos aquela leva vantagem. O trajecto por Penacova implicaria
10 túneis, com 2300 metros. Mas, argumentou-se na Câmara dos Deputados, que era
preferível abrir dez pequenos túneis do
que um túnel de 1840 metros, com maiores custos de construção e exploração. O
traçado pelos Vales do Mondego e Dão implicava 19 pontes. O de Mogofores, 25.
Outro argumento esgrimido foi o facto de no Vale do Mondego, o rio ser “um grande
auxílio” pois, “todos os materiais de construção podem ser
levados de barco” a todos os pontos do trajecto. O custo total da obra
(Coimbra-Penacova-Santa Comba) estava
orçado em 2 556 712$620 réis.
A construção da Linha
da Beira Alta *, de Pampilhosa a Vilar Formoso, foi iniciada em Outubro de 1878 e concluída em
Junho de 1882. A sua inauguração ocorreu em 3 de Agosto de 1882, com a presença
do rei D. Luís e da Família Real que fez a viagem Figueira da Foz-Vilar Formoso.
E Penacova ficou a ver passar...
E Penacova ficou a ver passar...
[2] Coronel Boaventura José Vieira – Militar; Político; Deputado;
Governador Civil de Viana do Castelo; Vogal da Junta Consultiva de Obras
Públicas e Minas; Engenheiro responsável pela construção das Linhas
Ferroviárias do Algarve, do Minho e do Douro – nasceu em Ponte de Lima, em 8 de
Novembro de 1825, e morreu em 9 de Agosto de 1887. Engenheiro
responsável pela construção das Linhas do Algarve, do Minho e do Douro.
Sem comentários:
Enviar um comentário