Festival Literário em Penacova?
Nas primeiras impressões, quando ouvi falar neste projeto fiquei apreensiva e ao mesmo tempo curiosa para descobrir e entender o que era um Festival Literário em Penacova. No meu pensamento, a palavra Festival traria a este evento muito mais do que leitura, ouvir os escritores, ou observar os livros. E foi através das redes sociais que a divulgação sobre o tal festival se expandiu com rapidez por todo país e mesmo além fronteiras.
No entanto, fui invadida por uma questão: um evento de tão alto nível cultural ser realizado durante a semana? No meu íntimo, pensei nos meus filhos e tantos outros filhos que iriam estar a trabalhar; “ graças a Deus” é legítimo e digno o trabalho, ganhar o pão nosso de cada dia! Mas, desta forma não poderiam estar presentes, como normalmente, o fazem noutros eventos, durante o final de semana! No entanto, felizmente, no meu imaginário surgiu a profunda convicção de que se o programa estava assim definido, é porque teria a origem criativa dos pensadores do evento a enriquecer Penacova em vertentes mais abrangentes e com outra projeção.
E o programado foi o acontecido, diariamente, o auditório sentiu o calor humano dos alunos, professores das nossas escolas, bem como pais, avós e outras pessoas vindas de outros pontos do País. Palestras, que serviam todas as idades, que mas na minha opinião a nova geração habituada só às novas tecnologias, naquele auditório, experenciaram emoções diferentes, bem como novas aprendizagens, do que fosse numa sala de aulas; o que ouviram e da forma como foi esclarecido, os livros vão ter outro valor e outro sabor na sua vida. Sonhos, aventuras, viagens , criatividade foram palavras descritas com sabedoria por aqueles que as escrevem, leem, cantam, declamam. Ler um livro é tão importante para o desenvolvimento intelectual como o alimento que ingerem, e como alguém dizia: ler livros enriquece o ser humano culturalmente e não matam ninguém, ao contrário das redes sociais que na maioria das vezes são armas do ódio e da raiva onde a ofensa não tem qualquer critério. Os dedos que as escrevem e publicam pertencem a mentes irracionais e vazias até de amor próprio.
O escritor João Gobern dizia-nos “que a leitura dos livros são exercícios de liberdade e de cidadania e Portugal precisa que todos se dediquem mais aos outros do que ao seu umbigo” , e eu acrescento a cultura da solidariedade deve estar presente em cada homem ou mulher, para poder aceitar e valorizar o trabalho dos outros. Temos o dever de nos instruirmos dia após dia e os livros são canais específicos para esses ensinamentos. Todos temos talentos escondidos que podemos utilizar para fazer crescer uma comunidade e não para a destruir.
Dizia-nos o escritor José Luís Peixoto "cada um de nós tem o dever de transformar um pouco do mundo, tirar um curso superior não resolve, é preciso saber estar e saber aprender”
Tenho também de fazer um aparte, sobre as críticas e os mal dizeres sobre os cartazes publicitários deste Festival, só "preenchidos com escritores Homens", e a falta da presença feminina neles. Numa altura em que se apregoa e apela, por todo o mundo, para que haja paz, ainda há tanta língua afiada e tanto dedo a teclar criando polémicas inúteis e fúteis.
Pois e então? Grandes SENHORAS escritoras, médicas, jornalistas, professoras, coralistas,e tantas outras se fizeram presentes com ou sem cartaz e foram motivo de muito orgulho neste evento, demonstraram e vincaram bem a sua dignidade de mulheres.
Em Penacova, a relevância e a emancipação das mulheres já é um processo muito antigo, e a D. Maria da Luz com oito décadas de vida, representou todas as mulheres neste festival, porque bem cedo teve de ser autónoma. Na dureza da vida, a comer as côdeas da broa, aprendeu que só a dedicação ao trabalho lhe permitia ter uma vida digna, assim como a sua família. Uma mulher que não teve oportunidade de ir à escola para ler e escrever , mas aproveitou o seu tempo e o seu mundo para “cultivar”, a sua dignidade, fidelidade e respeito à família que constam numa outra escola que é a das virtudes.
Esta MULHER, FILHA, MÃE, SOGRA, AVÓ, VIZINHA, DONA de CASA, VENDEDORA de TREMOÇOS, ah e cantadeira enquanto trabalha ou nas horas vagas, ah e intitulada como tão velha para ir cantar, mas cantou e desassossegou um auditório cheio de gente que procurou um serão diferente. O título da raiz do povo enquadrou-se como se fosse um puzzle, e o tal festival onde toda a literatura se conjugou na diversidade e em equilíbrio.
A D. Maria da Luz além de tudo o que está escrito, ainda posso acrescentar que ela é o rosto turístico de Penacova, quase um posto de informação para os visitantes e para todos os que se aproximam.
E ainda mais! Segue em apontamento que as mulheres colaboradoras deste evento representaram muito bem a classe feminina, sempre em ação e prontidão tanto nas mudanças de equipamentos para as novas tertúlias como na subida dos escadotes para comporem os sistemas de luzes.
Um Festival tão acarinhado e tão agradecido pelos participantes, a contribuírem e a darem sugestões para que haja continuação dum 2° Festival Literário, um dos caminhos reais para o respeito entre partes e sem divisões, onde prospere cada vez mais a cultura do povo de Penacova, bem como a PAZ.
Saudade Lopes