Em complemento do "post" anterior, publicamos uma fotografia dos tempos em que o chafariz estava próximo da torre da Igreja. Foto que Pedro Viseu teve a amabilidade de nos enviar.
domingo, agosto 30, 2015
AINDA A HISTÓRIA DOS CHAFARIZES DE PENACOVA...
No início do
séc XX Augusto Leitão (falecido prematuramente) dá início à construção do
edifício que albergou a União Comercial, depois o Penacova Hotel, Repartições Públicas...enfim, um espaço que todos conhecerão.
Nesse
local existia um antigo chafariz que foi demolido com as referidas obras. Na falta dele, alguns anos depois, Joaquim Leitão oferece à Câmara - facto que foi notícia dos jornais e tinha mesmo uma lápide com essa indicação - uma verba para a construção de um novo
Chafariz que foi implantado junto à Pérgula, que à data não existia.
A história deste chafariz (que tem saltitado de lugar para lugar...) daria para escrever algumas páginas, mas, por hoje, fica este pequeno apontamento.
Antigo chafariz demolido (foto da colecção particular de José Alberto Costa) |
Localização inicial do novo chafariz |
Imagem actual |
A notícia do acto de vandalismo (recorte de 1921) Uma nota: vandalismo? questões políticas?...é que por esta altura Joaquim Leitão seria Senador da República... |
Post scriptum: para completar, mais uma fotografia. Esta de quando o chafariz estava perto da torre da Igreja. Teria sido a segunda localização.
segunda-feira, agosto 17, 2015
Festa de N. S. dos Remédios: recortes do passado
sábado, agosto 15, 2015
A propósito da Festa de Nª Sª dos Remédios este fim de semana em Travanca
Hoje, dia em que se venera Nossa Senhora, e de um modo especial, Nossa Senhora dos Remédios, em Travanca do Mondego, recuperamos o texto que em tempos já publicámos neste blogue.
Altar da capela de N. S. dos Remédios em Travanca do Mondego |
Senhora Ourada [ou o Costume de ornamentar as imagens com adereços de Ouro]
A oferta de objectos de ouro aos deuses será tão antiga
quanto a existência do homem, e, entre as coisas que ainda hoje se oferecem a
Deus e aos santos encontra-se a joalharia. Esta, neste contexto, assume a
designação de joalharia devocional, porque fruto de uma devoção, e pode ser
constituída por peças eruditas ou de carácter popular. No entanto, são estas
últimas as mais oferecidas às diversas invocações de Maria, e a algumas santas
de especial devoção das ofertantes.
O costume de ornamentar as imagens com adereços de ouro foi
comum em todo o País, mas, na actualidade, está mais concentrado nas regiões do
interior transmontano, alentejano e beirão. Na pesquisa efectuada a nível
nacional encontramos, até ao momento, cento e quinze imagens no Continente,
vinte na Madeira e quatro nos Açores, que ainda saem em procissão ataviadas com
ornatos de ouro oferecidos pelas fiéis, e as quais denominamos Senhoras Ouradas.
No distrito de Coimbra deparamos com cinco ocorrências, com a Senhora dos
Remédios incluída.
Relativamente à estrutura, as imagens ouradas podem ser do
tipo vulto perfeito, em madeira, pedra ou pasta pintadas, ou imagens de vestir.
Nas primeiras, os ornatos áureos são-lhes colocados sem a adição de qualquer
peça de vestuário. Contudo, em certas regiões, estas recebem um manto em tecido
para usar no dia de festa juntamente com as suas jóias, como é o caso de
Travanca do Mondego. Por sua vez, nas imagens de roca, ou de vestir, usam-se
vestes completas desde roupa interior, vestido, manto e véus, aos quais se
juntam inúmeros ornamentos áureos.
O tipo de adornos que embelezam o colo das imagens -
cordões, voltas, gargantilhas, alfinetes de peito com pedras vermelhas e
azuis(1), medalhas de santos e crucifixos - são comuns a todo o País. No
entanto, há zonas que apresentam uma grande concentração de peças mais
particulares, como os colares de gramalheira (2) em Trás-os- Montes e as libras
com guarnição(3) no Minho. Na Madeira o número de cordões ou fios é muito
superior ao número de medalhas ou ornatos, como aliás em quase todos os acervos
que tivemos ocasião de apreciar. Todas as imagens ouradas usam brincos, e, se
muitas delas já têm as orelhas furadas para esse propósito, outras, como a
Senhora dos Remédios, usam-nos presos à cabeleira ou ao manto que lhes cobre a
cabeça. Quase sempre ostentam brincos compridos, com incidência no tradicional
brinco à rainha(4) mas, principalmente no Centro e Sul do País, podem ver-se
vistosos brincos compridos de tipologias e influências diversas.
A forma como o ouro é colocado nas imagens varia de região
para região. Pode ser colocado só nas mãos, só ao pescoço, espalhado sobre as
vestes e, ainda, sobre toda a imagem e seu traje. Contudo, todo o ouro exibido
comporta em si, quanto a nós, duas características - a expositiva e a
ornamental. A primeira ocorre dado que uma das principais razões deste uso ser
a de apresentar à comunidade os ornatos oferecidos pelo pagamento de promessas,
e assim, pela sua exibição, mostrar que estes não foram alienados e continuam a
fazer parte do espólio da Senhora ou da Santa. Depois, o carácter ornamental
surgirá quando as jóias são usadas para engalanar e embelezar a imagem, para o
dia da sua festa, à semelhança do que qualquer um de nós faz para um dia
especial.
Este costume provoca diferentes reacções por parte dos
responsáveis da Igreja Católica, e, se uns o aceitam, outros condenam-no. Não é
nosso propósito fazer a apologia nem a detracção de tal prática. Queremos
somente notar que é um hábito que ainda se mantém em muitas vilas e aldeias e
que, por envolver ornamentos em ouro, faz parte de um estudo alargado, que
estamos a elaborar, sobre os vários usos do ouro tradicional português durante o
século XX.
___________
Notas:
1 Tipo de ornatos que entrou em uso a partir dos anos 40, do
século XX, e que foram largamente utilizados até aos anos 80. Eram peças de
formas geométricas, a lembrar as influências Art Déco, e também florais, numa
evocação da Arte Nova, decoradas com vidros coloridos, principalmente azuis e
vermelhos, que com a sua cor e aparência davam um ar de jóia com pedrarias,
vistosa mas a um preço muito acessível.
2 O colar de gramalheira é uma peça de grande aparato e
excepcional efeito ornamental constituída por um medalhão e o seu respectivo
cordão. Este tem duas formas básicas; grandes elos ovalados com círculos no
interior ou constituído por secções de malha intercaladas com argolas. O
medalhão, que em muitas zonas do Minho se chama também simplesmente
gramalheira, é uma grande peça ornamentada com elementos vazados e pedrarias de
fraco valor.
3 Moedas de libra, ou moedas de imitação de libra, envoltas
por uma cercadura filigranada ou cinzelada.
4 Peça de grande aparato, em filigrana. É composto por duas
peças recortadas e vazadas, articuladas por argolins. A parte inferior do
brinco apresenta ainda no centro uma outra peça circular, também articulada,
cujo movimento os torna ligeiros e elegantes ao serem usados. São os brincos
mais usados no Minho e, na zona de Viana do Castelo são os brincos por
excelência de todas as mulheres quando envergam o traje regional, seja este de
que tipo for.
Rosa Maria Mota
_____________________________
NOTA:
Travanca do Mondego venera Nossa Senhora dos Remédios. Por
ocasião das festas de 2008 o Penacova Online publicou uma pequena reportagem
fotográfica da procissão. Passado muito tempo, somos contactados por uma pessoa
da zona do Porto, que nas suas pesquisas na internet tinha encontrado o nosso
"post". Desejava saber mais
pormenores sobre o uso de colocar ouro na imagem no dia da Festa Anual, dado
que estava a preparar uma tese de doutoramento.
É assim que, a nosso pedido, a Drª Rosa Maria Mota,
doutoranda em Artes Decorativas - Ourivesaria, na Universidade Católica
Portuguesa – Centro Regional do Porto teve a gentileza de nos enviar o texto
que aqui fica registado e certamente será do interesse de muitos dos nossos
leitores.
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Das antigas "pagelas" ao cartaz de 2015 |
domingo, agosto 09, 2015
Cartas Brasileiras: Eu não sei por quê
Eu
não sei por quê
Procurar, eu procurei. Não sei por
que não encontrei a que eu queria. Pode ter certeza, eu juro, não estou mentindo.
Porém, do fundo do meu coração, sinto muito, me desculpe. Dê-me a mão, sou um
estranho no paraíso, permanecer sonhador, esse é o perigo.
Mas, não seja por
isso. Tudo bem, eu imploro perdão, mas você não deve se
esquecer, eu nunca prometi um jardim de rosas. Então, é
melhor você pensar sobre isso. Bem, você poderia fazer tudo se tornar
realidade, eu lhe daria o mundo agora mesmo em uma bandeja de prata. Mas o que
isso importa!
Devem estar pensando, o cronista pirou de vez. Não, estou bem.
Tentei encontrar a letra da música “I don’t kow why” (Eu não sei por quê), com a orquestra de Ray Anttony (20/01/1922), música que faz derreter qualquer coração
ligeiramente apaixonado.
Incrível, não encontrei a letra, mas descobri que ele segue vivo,
como viva são suas interpretações. Encontrei outras com mesmo nome, nem de
longe se comparam à inesquecível versão com Ray
Anthony. Como não queria ser um
estranho no paraíso, e “Stranger in
Paradise” é famosíssima com RayConniff, tentei redimir-me.
Para me desculpar, me fiz valer de “I Apologize”, que tem uma versão primorosa e imbatível com Billy Eckstine (08/07/14 – 09/03/93).
[clique na imagem para ouvir]
Por fim, para que ninguém reclame, porque não apresentei o
prometido, posso dizer, eu nunca prometi aos leitores “Rose Garden”, como tão bem cantou Lynn Anderson (26/09/1947 – 30/07/2015), isso mesmo, ela se foi um dia desses.sexta-feira, julho 31, 2015
Leituras para férias: Penacova paisagem de sonho e beleza
Quem não se recorda das edições antigas da revista Modas e Bordados? Ora, esta revista, associada ao jornal O Século, publicou em 1932 um artigo sobre Penacova, assinado por Maria Lúcia. Quem era Maria Lúcia?
No início dos anos trinta,
durante cerca de meia dúzia de anos, viveu em Penacova, dado que o seu marido
Joaquim Jerónimo da Silva Rosa, funcionário público, natural de Lorvão onde
nasceu em 1900, foi colocado naquela vila. Maria Lúcia Vassalo Namorado era sobrinha de Maria Lamas e foi uma escritora e jornalista de renome. Curiosamente, essa carreira
jornalística começou no Notícias de Penacova onde deixou muitos escritos. Refira-se
que o marido foi também um dos fundadores deste periódico. Lúcia Namorado criou passado algum tempo e dirigiu durante muitos anos a também afamada revista OS NOSSOS
FILHOS, onde apareceram muitas referências a Penacova, inclusivamente
fotografias de bebés/crianças da vila. Existem estudos académicos detalhados sobre
Lúcia Namorado e a sua relação com a nossa terra.
AQUI FICA O TEXTO publicado em 18 de Outubro de 1932:
Penacova
paisagem de sonho e beleza
Pequenina, modesta, privada ainda hoje de comodidades modernas, embora distanciadas apenas cerca de 20 quilómetros de Coimbra, a que a liga uma lindíssima estrada, Penacova impõe-se pelo acaso da sua situação caprichosa, a meio de uma paisagem privilegiada de beleza. Particularidade singular, talvez única na nossa Terra, essa paisagem, sendo grandiosa é, ao mesmo tempo, limitada. Como se a natureza entendesse que os olhos tinham ali pasto bastante para alimentar sucessivas e atentas contemplações.
paisagem de sonho e beleza
Pequenina, modesta, privada ainda hoje de comodidades modernas, embora distanciadas apenas cerca de 20 quilómetros de Coimbra, a que a liga uma lindíssima estrada, Penacova impõe-se pelo acaso da sua situação caprichosa, a meio de uma paisagem privilegiada de beleza. Particularidade singular, talvez única na nossa Terra, essa paisagem, sendo grandiosa é, ao mesmo tempo, limitada. Como se a natureza entendesse que os olhos tinham ali pasto bastante para alimentar sucessivas e atentas contemplações.
Rodeia-a uma infinidade de montes: uns cónicos e rochosos; outros, de
ondulações suaves, grandes extensões de pinhais salpicados e de povoados - nódoas claras que, surgindo
dentre a romaria verde, alegram a vista e fazem lembrar sorrisos
cândidos e saudáveis. No vale, amplo e luminoso, duma claridade doce de
aguarela, passa o rio silencooso e manso, estorcendo-se em curvas airosas que descobrem,
ora à direita, ora à esquerda, areais onde as lavadeiras coram a roupa, e onde
o milho que viceja e amadurece nas ínsuas vizinhas, depois de loiro e
descasulado, é estendido para secar.
Cortando as águas límpidas do rio, que
deixam ver as areias de oiro cantadas
pelos Poetas, deslizam, carregdas de madeira, as barcas negras e muito esguias,
de grande proa revirada; os barqueiros, tisnados, conduzem-nas à vara,
penosamente, correndo sobre os bordos, num esforço exaustivo, prodigioso de
equilíbrio; e só quando o vento sopra a faina abranda um pouco: nas barcas
escuras incha e resplandece a brancura duma vela.
É assim aquele vale de cores macias e duma serenidade extática. Ao
centro eleva-se uma colina semeada de oliveiras e coroada por uma povoação que
dir-se-ia, na verdade, uma rainha no trono - tal como está debruçada para o
Mondego, do alto duma penha erguida
numa cova.
É a vila de Penacova uma das mais antigas da Península; nela , porém,
nada nos fala da sua vetustez, pois nem sequer do seu remotíssimo castelo
existem vestígios. Vários investigadores afirmam que é de origem cantábrica,
mas parece assente que a primeira notícia desta vila data do tempo do conde D.
Henrique.
D. Sancho I mandou-a povoar e deu-lhe em 1193 foral que foi confirmado
em Coimbra por D. Afonso II; D. Manuel I deu-lhe novo foral em Lisboa, no ano
de 1513.
É hoje muito visitada por pessoas atraídas pela justa fama dos seus encantos
naturais, e tem um grupo de bons amigos empenhados em a dotar com
melhoramentos, dentre os quais se destaca o esplêndido edifício do preventório,
prestes a funcionar – obra cujo largo alcance social é desnecessário encarecer.
A população, que é pobre, emigra
facilmente, sobretudo para as Américas.
A principal indústria do concelho é dos palitos, que se intensifica na
freguesia de Lorvão – cova sombria, triste, contraste profundo da beleza colorida
e sonhadora de Penacova: nessa aldeiasita se desmorona o velhíssimo mosteiro do
mesmo nome, outrora riquíssimo e agora desmantelado, mas onde ainda se
encontram jóias artísticas de raro valor, belas evocações de páginas distantes
da nossa História maravilhosa.
MARIA LÚCIA
domingo, julho 19, 2015
Problemas demográficos de Penacova apresentados em livro
Foi ontem apresentado na Biblioteca Municipal o livro “Penacova visto pela demografia”. Obra que tem como autores Paulo Cunha Dinis e Filipa de Castro Henriques.
Um estudo rigoroso que analisa a evolução da população no nosso concelho entre 1970 e 2011 e faz algumas projecções para o ano 2031 quando se realizar mais um Recenseamento Geral da População.
Nos últimos quarenta anos Penacova perdeu 2024 indivíduos (12% da sua população). A situação agravou-se ultimamente dado que durante a década 2001 -2011 se perderam 1474 habitantes, isto é, 73% do total perdido desde 1970. Tudo aponta para que o concelho continue a perder população. Por exemplo, se em 2011 a população jovem representava um oitavo da população total, em 2031 esse valor representará apenas um vigésimo. Os nascimentos atingirão metade dos verificados em 2011 e a população idosa vai passar para o dobro. Já hoje, por cada 5 óbitos só nascem 2 crianças. Em 2013 estimava-se que em Portugal o índice sintético de fecundidade era de 1,21. Ora, em Penacova já só era de 0,9, situando o nosso concelho na 270ª posição.
Da esquerda para a direita:
António Catela, Humberto Oliveira, Rute Cunha, Paulo Cunha Dinis,
Eduardo Aroso, Álvaro Aroso e José Santos Paulo
No dizer do Presidente da Câmara, presente no lançamento do livro, estaremos perante um cenário “dantesco” atingível a não muito longo prazo.
Refira-se que a Câmara Municipal foi a principal patrocinadora da publicação, que também teve o apoio da União de Freguesias S. Pedro de Alva / S. Paio do Mondego, bem como da Fundação Mário da Cunha Brito.
A obra enumera, ainda, algumas das potencialidades (e fragilidades) do desenvolvimento económico-social do concelho, aspecto que, além do problema da natalidade, se cruza com a questão da fixação (ou eventual atracção) das pessoas no território concelhio. Também o fenómeno migratório (interno e externo) é tido em conta neste estudo.
A apresentação do livro esteve a cargo de Rute Cunha, penacovense, Mestranda em Política Cultural Autárquica na Faculdade de Letras de Coimbra. A iniciar a sessão, actuou um grupo de Guitarras de Coimbra interpretando temas de Carlos Paredes, de Antero da Veiga (que em 1908 esteve no Sarau que fez parte do programa de inauguração do Mirante) e ainda um tema coimbrão que tem origem numa música de José Eliseu, um nome ilustre de Penacova.
Sobre os autores:
Paulo Cunha Dinis, que fez os primeiros estudos em Penacova e pertence a uma família de S. Pedro de Alva, é Mestre em Estudos Políticos de Área – vertente Relações Internacionais no Cáucaso do Sul pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade NOVA de Lisboa, com a dissertação “A Geórgia e a Política Externa Russa. Uma análise do Cáucaso à luz da Teoria da Regionalização”; obteve a Licenciatura em Ciência Política e Relações Internacionais na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade NOVA de Lisboa.
Filipa de Castro Henriques é licenciada em Economia, mestre em Estatística Gestão de Informação ISEGI-UNL; assistente convidada FCSH-UNL; economista GEE-MEI e doutoranda na FCT/CEPESE/FCSH-UNL. É ainda investigadora do CEPESE nas áreas de Envelhecimento, Educação e Saúde e Análise Prospectiva e Planeamento.
Um estudo rigoroso que analisa a evolução da população no nosso concelho entre 1970 e 2011 e faz algumas projecções para o ano 2031 quando se realizar mais um Recenseamento Geral da População.
Nos últimos quarenta anos Penacova perdeu 2024 indivíduos (12% da sua população). A situação agravou-se ultimamente dado que durante a década 2001 -2011 se perderam 1474 habitantes, isto é, 73% do total perdido desde 1970. Tudo aponta para que o concelho continue a perder população. Por exemplo, se em 2011 a população jovem representava um oitavo da população total, em 2031 esse valor representará apenas um vigésimo. Os nascimentos atingirão metade dos verificados em 2011 e a população idosa vai passar para o dobro. Já hoje, por cada 5 óbitos só nascem 2 crianças. Em 2013 estimava-se que em Portugal o índice sintético de fecundidade era de 1,21. Ora, em Penacova já só era de 0,9, situando o nosso concelho na 270ª posição.
Da esquerda para a direita:
António Catela, Humberto Oliveira, Rute Cunha, Paulo Cunha Dinis,
Eduardo Aroso, Álvaro Aroso e José Santos Paulo
No dizer do Presidente da Câmara, presente no lançamento do livro, estaremos perante um cenário “dantesco” atingível a não muito longo prazo.
Refira-se que a Câmara Municipal foi a principal patrocinadora da publicação, que também teve o apoio da União de Freguesias S. Pedro de Alva / S. Paio do Mondego, bem como da Fundação Mário da Cunha Brito.
A obra enumera, ainda, algumas das potencialidades (e fragilidades) do desenvolvimento económico-social do concelho, aspecto que, além do problema da natalidade, se cruza com a questão da fixação (ou eventual atracção) das pessoas no território concelhio. Também o fenómeno migratório (interno e externo) é tido em conta neste estudo.
A apresentação do livro esteve a cargo de Rute Cunha, penacovense, Mestranda em Política Cultural Autárquica na Faculdade de Letras de Coimbra. A iniciar a sessão, actuou um grupo de Guitarras de Coimbra interpretando temas de Carlos Paredes, de Antero da Veiga (que em 1908 esteve no Sarau que fez parte do programa de inauguração do Mirante) e ainda um tema coimbrão que tem origem numa música de José Eliseu, um nome ilustre de Penacova.
Sobre os autores:
Paulo Cunha Dinis, que fez os primeiros estudos em Penacova e pertence a uma família de S. Pedro de Alva, é Mestre em Estudos Políticos de Área – vertente Relações Internacionais no Cáucaso do Sul pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade NOVA de Lisboa, com a dissertação “A Geórgia e a Política Externa Russa. Uma análise do Cáucaso à luz da Teoria da Regionalização”; obteve a Licenciatura em Ciência Política e Relações Internacionais na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade NOVA de Lisboa.
Filipa de Castro Henriques é licenciada em Economia, mestre em Estatística Gestão de Informação ISEGI-UNL; assistente convidada FCSH-UNL; economista GEE-MEI e doutoranda na FCT/CEPESE/FCSH-UNL. É ainda investigadora do CEPESE nas áreas de Envelhecimento, Educação e Saúde e Análise Prospectiva e Planeamento.
sexta-feira, julho 17, 2015
Em dia de Feriado Municipal a incontornável referência a António José de Almeida
Penacova celebra hoje o seu Feriado Municipal, evocando o nascimento de António José de Almeida que nasceu, faz hoje 149 anos, neste concelho.
Sobre esta personalidade, muito se escreveu já quer a nível nacional quer localmente.
Aqui fica um vídeo que é um extracto da série documental “Os Presidentes”, produzido para a RTP em 2011, tendo como autores Alexandrina Pereira e Rui Pinto de Almeida.
Sobre esta personalidade, muito se escreveu já quer a nível nacional quer localmente.
Aqui fica um vídeo que é um extracto da série documental “Os Presidentes”, produzido para a RTP em 2011, tendo como autores Alexandrina Pereira e Rui Pinto de Almeida.
CLIQUE NA IMAGEM PARA VISUALIZAR VÍDEO |
António José de Almeida (1866-1929) foi o sexto Presidente
da República Portuguesa (1919 a 1923). É o único eleito da Primeira República que cumpre os
quatro anos previstos na Constituição, sobrevivendo a várias crises sociais e
económicas.
Forma-se em medicina e especializa-se em doenças tropicais,
durante uma estadia em S. Tomé e Príncipe.
É um republicano empenhado e, desde o tempo de estudante, é
também conhecido pela sua retórica realizando discursos que atraem multidões.
Ainda durante a monarquia é preso devido à sua acção
revolucionária.
Após a implementação da República é nomeado Ministro do
Interior e mais tarde, durante o Governo da "União Sagrada" assume a chefia do Governo acumulando a Pasta das Colónias.
De 1919 a 1923 foi Presidente da República, como já se referiu.
domingo, julho 12, 2015
Um pouco da história do quadro de N. S. da Assunção na Igreja de Penacova
Nossa Senhora da Assunção. Igreja Matriz de Penacova. Assinado por Menah (Maria de Lurdes) e datado de 1931 |
Quem visitar a Igreja Matriz de Penacova vai encontrar do lado do Evangelho[1] um quadro de grandes dimensões representando Nossa Senhora da Assunção. No canto inferior direito está assinado por “Menah” e tem a data de 1931.
Há dias perguntámos no facebook se alguém de Penacova sabia quem foi o autor/autora desta pintura. Nenhuma resposta...
Ora, Menah, era o pseudónimo da filha de Constâncio Silva, Maria de Lurdes. Foi oferecido à Igreja em 15 de Fevereiro de 1931.
E agora perguntarão: quem foi Constâncio Silva? Este artista (1881-1949), desenhador e pintor foi "arista" em Penacova , tendo exposto em 1947, no Salão Silva Porto, dois desenhos com temáticas penacovenses, "Pinheiro de Penacova" e "Pinheiro do Mondego - Penacova". Ilustrou também O Filho do Carvoeiro – Conto fantástico para Crianças (1932) de João Augusto Simões Barreto, republicano, funcionário público e jornalista radicado em Penacova.
Constâncio Silva era amigo da família Barreto e também cunhado de António dos Santos Fonseca, outro arista, que mandou construir a conhecida vivenda em S.to António, hoje integrada no complexo do Lar de Idosos da Santa Casa da Misericórdia.
Maria de Lurdes aprendeu a pintar com o pai, um nome famoso do meio artístico da época. Foi graças a esta ligação do mundo artístico nacional a Penacova, nos tempos "áureos" do Turismo nesta vila, que o património penacovense pode contar hoje com esta interessante obra.
Em 1976, o Pintor João Martins da Costa (falecido há precisamente 10 anos) executou alguns trabalhos de restauro, retocando e envernizando este bonito quadro que representa a padroeira de Penacova, Nossa Senhora da Assunção.
[1] Na
celebração de costas para o povo, o celebrante lia a epístola do lado direito
do altar (o “lado da epístola”), após o que lia o evangelho, do outro lado (o
“lado do evangelho”).
terça-feira, julho 07, 2015
Cartas Brasileiras: Assombração
Barretos, minha cidade natal, está localizada
ao norte do estado de São Paulo, distante 424 km da capital. É conhecida pela
Festa do Peão de Boiadeiro, que lá ocorre todo ano na última semana de agosto; um
quase resquício da atividade pecuária que havia na região, ou ainda um
explícito interesse econômico para manter a tradição.
De região pecuária para a citricultura,
agora canavieira, seguindo a política governamental para produção de álcool
combustível, é cana a perder de vista, e com ela o picumã das queimadas; ainda
vamos só comer cana.
Contudo, não é esse o
assunto dessa carta, quero falar sobre uma
cidade distante 51 quilômetros da minha, ou seja, Bebedouro, cujo nome se deve ao
fato de ter nascido à beira de um córrego que era procurado pelos tropeiros,
que lá paravam para dar de beber ao gado.
Também, não tanto sobre a
cidade, e sim a respeito das estranhas aparições, uma assombração, uma mulher
vestida de noiva que atormentava quem passasse à noite pelo cemitério
Foi no começo dos 90. Testemunhas assustadas diziam ter visto a
noiva correndo, as vestes esvoaçantes, um fantasma ou alma do outro mundo. Rapidamente
a notícia se espalhou, aparecendo logo quem a explicasse. Diziam tratar-se de uma
jovem que morrera após experimentar o vestido
de noiva, e que havia sido enterrada com ele. A tenebrosa aparição ganhou a
imprensa, até um boletim de ocorrência policial teria sido registrado. Nem os
mais corajosos se arriscavam a passar pelo local durante a noite.
Conta-se que um coveiro, homem acostumado, resolveu encarar a alma
penada. E, na escuridão, estando diante de uma cova para um sepultamento que
aconteceria na manhã seguinte, viu a
noiva dentro dela, chamando-o pelo dedo indicador. Quase morreu de susto, e deu
entrada na aposentaria.
Como assombração não deve existir, a de Bebedouro tinha tudo para
ser uma farsa, e era. O pior, ou o mais engraçado, a noiva fantasma não era
ninguém se não o meu irmão que morava do outro lado da rua do cemitério. Brincalhão,
resolveu assustar os transeuntes, correndo pelo cemitério à noite com o vestido de noiva da mulher. Só ele
mesmo!
Acreditar em bruxas e duendes,
nenhum de nós acredita, entretanto como dizem os espanhóis: “pero que hay,
hay”. Há fantasma de todo tipo, como aqueles que metem no bolso o dinheiro que
seria para a Educação, Saúde e Segurança. Se a população não usar nas próximas
eleições o voto como Afugenta Fantasma seguiremos vivendo em um mundo
mal-assombrado.
P.T.Juvenal Santos – ptjsantos@bol.com.br
sexta-feira, junho 26, 2015
Coral Divo Canto apresenta hoje Orfeu & Eurídice
O Coral Divo Canto vai apresentar, hoje, pelas 21:30, no Centro Cultural
de Penacova, a Ópera Orfeu & Eurídice.
É graças a um trabalho intenso, de grande qualidade, feito
de esforço, paixão e persistência, quer do seu Maestro, Pedro Rodrigues, quer
de todos aqueles que ao longo destes anos passaram pelo grupo, que Penacova
pode hoje assistir a mais um momento alto de cultura.
Passo a passo, esta nossa terra vai recuperando o lugar que em finais do século XIX e primeira metade do século
XX ocupou. Nesses tempos, com
características mais elitistas, se pensarmos nos eventos artísticos que amiúde
se realizavam no “palacete” do casal Raimunda e Joaquim de Carvalho (edifício
da actual Casa de Repouso) com a presença de altas figuras da cultura nacional.
Pela mão de Raimunda Martins de Carvalho, essa paixão pela cultura, acabou por ser
também transmitida e generalizada a
muita gente de Penacova que com ela aprendeu as artes do canto, da música
instrumental e do teatro. Falamos nesta figura penacovense como poderíamos
recordar muitas outras. Correndo o risco de
sermos injustos, diríamos que na segunda parte do século passado, estas
manifestações culturais foram decaindo ao ponto de praticamente chegarmos a poder contar apenas os
grupos etnográficos e folclóricos e as filarmónicas enquanto agentes culturais activos.
Assistimos hoje, e o trabalho do Coral Divo Canto é um dos
excelentes exemplos disso, a um renascer
e a um multiplicar efervescente de iniciativas de qualidade, que pouco a pouco
vão alargando os horizontes da cultura. O espectáculo de logo à noite é, na
nossa opinião, um evento paradigmático
desta dinâmica local.
O espectáculo em causa já foi apresentado no Largo Alberto Leitão em
2014 - tricentenário do nascimento de Gluck
- e no Mosteiro de Lorvão, já em 2015, aquando do capítulo da Confraria da
Lampreia. Desta vez, num espaço diferente, num verdadeiro palco, com outras
possibilidades de sonoplastia e luminotecnia, aguarda-se que constitua um momento
ainda mais intenso e cativante. Mesmo para quem já assistiu, cremos que não será de perder
este serão que vai marcar a história cultural de Penacova.
Christoph Willibald Ritter von Gluck (1714 - 1787) foi um
dos mais importantes compositores do seu tempo. Foi considerado o grande
reformador da ópera clássica por equilibrar a importância da música e da acção
dramática. A ópera “Orfeu e Eurídice” é a obra mais representativa dessa
tendência. Foi escrita em 1762 e apresentada em Viena, em italiano. Em 1774 foi
reelaborada para ser cantada em língua francesa na Ópera de Paris.
Gluck |
O mito de “Orfeu e Eurídice” é relatado nas “Geórgicas” de
Virgílio, e foi utilizado como argumento de outras óperas na história da
música, desde “Orfeo” de Monteverdi (1607) até Offenbach, com sua opereta
“Orfeu no Inferno” (1858).
Terminamos
com o apelo que o Coral Divo Canto faz na sua página do facebook: “Não perca a oportunidade de ser surpreendido com as mais
diversas sensações e emoções que só se conseguem transmitir por este que é sem
duvida o mais completo género artístico.
A ópera está de volta a Penacova, e desta vez será
protagonizada pelos seus conterrâneos. Apareça! “
Leituras complementares:
O MITO DE ORFEU
Orfeu era
filho do deus Apolo e da ninfa Calíope; do pai herda uma lira
que, uma vez tocada por si, revela um canto do qual, pela sua magia, ninguém
consegue livrar-se.
O deus dos casamentos,
Himeneu, selou o amor de Orfeu e Eurídice, mas não foi capaz de lhes garantir
o êxito da relação. Os maus presságios iniciais concretizaram-se quando a bela jovem,
pouco depois, foi assediada por Aristeu. Ao escapar desta perseguição,foi
picada por uma serpente o que provocou a sua morte.
Incapaz de
aceitar este desenlace, Orfeu vai atrás da sua amada até ao mundo dos mortos.
Aí, tocando a sua lira, leva Caronte a guiá-lo ao longo do rio Estige amenizando
o sofrimento das almas e conseguindo mesmo entorpecer Cérbero, que, diante de Hades, acaba por verter algumas lágrimas. Comovido e dando ouvidos aos apelos da esposa Perséfone, permite que Orfeu entre para buscar Eurídice, impondo,
no entanto, uma condição: a jovem regressaria com Orfeu ao mundo dos vivos, mas
Orfeu não poderia olhar para ela até estar novamente no mundo da luz. Foi
conseguindo aguentar mas quando já estava quase a chegar ao fim dos escuros
túneis, quis certificar-se se Eurídice o estava a acompanhar. Ao olhar para
ela, esta transformou-se novamente num fantasma, deu um grito e voltou para o mundo dos mortos.
Orfeu estava
proibido de a seguir e, deseperado, esperou, jejuando, sete dias junto ao lago. A angústia
apoderou-se dele e não conseguiu a partir daí, enamorar-se por mais nenhuma
jovem. Cansadas de serem rejeitadas, as Mênades, furiosas, retalham o seu corpo
lançam a cabeça ao Rio Hebrus.
As musas tiveram
compaixão deste horrível acto, juntaram os restos mortais e sepultaram-nos no
Monte Olimpo.
Agora sim, no reino dos mortos, Orfeu já se podia juntar
a Eurídice.
Na versão de
Glück, os amantes recebem uma nova oportunidade do Amor, que permite a Orfeu
buscar Eurídice ao reino dos mortos, propiciando o reencontro definitivo de
ambos sem que ele tenha que morrer também.
SONETO DE EURYDICE
Eurydice
perdida que no cheiro
E nas vozes do mar procura Orpheu:
Ausência que povoa terra e céu
E cobre de silêncio o mundo inteiro.
Assim bebi manhãs de nevoeiro
E deixei de estar viva e de ser eu
Em procura de um rosto que era o meu
O meu rosto secreto e verdadeiro.
Porém nem nas marés nem na miragem
Eu te encontrei. Erguia-se somente
O rosto liso e puro da paisagem.
E devagar tornei-me transparente
Como morta nascida à tua imagem
E no mundo perdida esterilmente.
E nas vozes do mar procura Orpheu:
Ausência que povoa terra e céu
E cobre de silêncio o mundo inteiro.
Assim bebi manhãs de nevoeiro
E deixei de estar viva e de ser eu
Em procura de um rosto que era o meu
O meu rosto secreto e verdadeiro.
Porém nem nas marés nem na miragem
Eu te encontrei. Erguia-se somente
O rosto liso e puro da paisagem.
E devagar tornei-me transparente
Como morta nascida à tua imagem
E no mundo perdida esterilmente.
Sophia de Mello Breyner Andresen,
in Tempo Dividido, 1954
domingo, junho 14, 2015
Cartas brasileiras: Dia de São Valentim...
No Brasil, 12 de junho é o Dia dos
Namorados.
Em Portugal e
em muitos países, a data é comemorada no dia de São Valentim (dia 14 de
fevereiro), porque, segundo apurei, estaria relacionada com uma antiga festa
romana que homenageava Juno, a deusa romana das mulheres e do casamento. E também
por causa do bispo Valentim que se opôs às ordem do imperador Cláudio II
(213-270 AC), que teria proibido o casamento durante as guerras, por acreditar serem
os solteiros eram melhor nos combatente.
Deixando o romantismo de
lado, na noite de 14 de fevereiro de 1929, em um galpão de Chicago ocorreu o
massacre praticado por integrantes da gang de El Capone contra bandidos rivais;
a história americana registra o fato como St. Valentine Day ´s Massacre.
E por que lembrar Capone
justo agora! Apenas porque ele só acabou preso ao cair na “malha fina” do
imposto de renda americano, tendo logrado escapar de tudo o mais, por contar
com a assistência jurídica dos melhores advogados do país.
Pois bem, aqui no Brasil
temos vivido uma sequência de escândalos. No maior deles, no mais recente, um
esquema criminoso “saqueou” a maior empresa brasileira, e envolve endinheirados
empresários, as maiores construtoras do país e diretores da Petrobras, empresa
que tem a União (o país) como principal acionista, cabendo ao Governo nomear os
diretores, ainda que indicados pelos partidos da “base aliada”. Só um
ex-diretor se propôs a devolver algo em torno de US$100 milhões.
Apenas para lembrar, em
outro caso, hoje sabido bem menor, o Processo do Mensalão, mas não tão menos
vergonhoso, um ex-Chefe da Casa Civil acabou preso em penitenciária e agora
cumpre prisão domiciliar, isso em tempo de governos ditos sociais.
É de se admirar o destaque
que tem sido dado ao caso FIFA, que envolveria US$150 milhões em subornos,
quando o falcatrua contra a PETROBRAS, a propina e desvios estão estimada em de
US$2 bilhões, conforme registra o balanço da empresa recentemente publicado.
E, então é de se
perguntar: por que o Governo fica fiscalizando e controlando salário de
professores e assalariados ao invés de bem tomar conta da dinheirama da gentalha
que mete a mão!
P.T.Juvenal Santos
..................................
Notas:
Notas:
1. Obrigado pelo comentário sobre os 107 anos do Mirante
"O resgate desse acontecimento somente poderia vir de alguém com a sensibilidade do blogueiro David de Almeida. Centenas de comentários deveriam estar comemorando a data; os penacovenses estão em falta, quer por si mesmos quer por seus descendentes. Ainda que distante, emocionei-me com o relato."
"O resgate desse acontecimento somente poderia vir de alguém com a sensibilidade do blogueiro David de Almeida. Centenas de comentários deveriam estar comemorando a data; os penacovenses estão em falta, quer por si mesmos quer por seus descendentes. Ainda que distante, emocionei-me com o relato."
2. Recordemos o porquê das Cartas Brasileiras:
domingo, maio 31, 2015
Mirante Emídio da Silva faz hoje 107 anos
[recolha de penacovaonline] |
O Mirante Emídio da Silva,
construído no local do antigo miradouro do Monte da Senhora da Guia, também conhecido por Mirante do Castelo, foi inaugurado há 107 anos. Foi precisamente a 31 de Maio de 1908.
construído no local do antigo miradouro do Monte da Senhora da Guia, também conhecido por Mirante do Castelo, foi inaugurado há 107 anos. Foi precisamente a 31 de Maio de 1908.
Um pouco da história do mirante: certo dia, o Dr. Manoel Emigdyo da Silva, eminente figura do jornalismo, da engenharia, da cultura, visitou Penacova e ao
chegar ao Mirante do Castelo terá ficado maravilhado com a beleza da paisagem.
Com o seu apoio e do Presidente da Câmara, Dr. José
Albino Ferreira, o mirante nasceu. Foi
desenhado pelo prestigiado arquitecto italiano, radicado em Portugal, Nicola
Bigaglia, também projectista da Casa dos Cedros no Buçaco.
[ recolha de penacovaonline] |
A inauguração do Mirante no fim de semana de 30 e 31 de Maio
de 1908 foi um acontecimento marcado por grandes festejos, em que Emídio da
Silva – e uma comitiva da alta sociedade lisboeta – foi recebido em apoteose. Centenas de pessoas esperaram a caravana automóvel na zona da
Várzea, pelas cinco da tarde de sábado, com flores e foguetes ao som da
Filarmónica Penacovense.
À noite, junto ao mirante, a iluminação com balões
venezianos pendurados nas oliveiras, juntamente com fogueiras, deram a luz
necessária para que o arraial abrilhantado por um rancho de tricanas de
Penacova e pela veia artística da cantadeira de quadras populares Emília
Carolina fosse um êxito.
[recolha de penacovaonline] |
No dia seguinte, domingo, o Dr. Alfredo da Cunha, director
do Diário de Notícias, descerrou a lápide que ainda hoje se encontra no local
com a inscrição “ Mirante Emidgyo da Silva-31-5-908”, ao que se seguiu o
discurso emocionado do homenageado, bem como outras intervenções. A festa terá
perdido algum brilho, porque um intenso aguaceiro se abateu sobre Penacova a meio das cerimónias. No entanto o entusiasmo de alguns penacovenses, entre
eles, Alves Coimbra, António Casimiro e Amândio Cabral, levou a que erguessem
aos ombros por entre a multidão o Dr. Emídio da Silva, que deixou Penacova,
segundo relatos escritos da época, consternada pela partida, acenando
simbolicamente com lenços brancos.
Este evento foi notícia destacada e muito desenvolvida no Diário de Notícias, ilustrada por fotografias, o que não era muito comum nos jornais da época.
quarta-feira, maio 27, 2015
Visitar Lorvão em 1909: a visão de Emídio da Silva
Publicamos hoje o terceiro texto de um conjunto de escritos sobre Lorvão.Já transcrevemos a opinião, que consideramos injusta, de Magalhães Colaço (1913) e também o relato de Lino d´Assunção (finais do séc. XX). Agora, um trecho de Emídio da Silva, publicado em 1909.
"O Mosteiro de Lorvão foi um
dos mais notáveis do país e apesar de se encontrar hoje (1909) em ruínas, e
mesmo arrasado em parte, é ainda um monumento de subido valor histórico e um
repositório de arte muito curioso e interessante. O convento fica ao fundo de
um estreito vale, ocupando um local aprasível que se nos impõe pela sua austera
beleza e que podia ser no Verão concorridíssimo, dada a frondosa arborização da
encosta adjacente ao mosteiro e a frescura dos deliciosos mananciais de água que
vêm dos granitos da montanha.
Mas a laboriosíssima aldeia não
tem sequer ainda uma estrada que a ligue às outras do país e para se ir lá, de
Penacova, pela estrada do Botão, tem de se deixar esta dois ou três quilómetros
de Penacova e seguir a pé ou em burro por uma extensa ladeira que leva a descer
30 minutos!...
E no entanto, Lorvão bem merecia
que os poderes públicos tivessem olhado um pouco mais para ela pois a simpática
aldeia não vive passivamente da tradição dos seus monumentos, como outras de
Portugal mas do constante e esforçado labor dos seus filhos que desde os de
mais tenra idade até aos da mais provecta, se dedicam inteiramente à fabricação
dos palitos de dentes, que tem ali o maior centro de produção do concelho de
Penacova, do qual constitui, como é sabido, a indústria mais importante.
Mas se os poderes públicos deixam
quase ao abandono os restos do grandioso mosteiro que é um monumento nacional !
O seu pitoresco claustro foi demolido e as cantarias vendidas ou roubadas! No
esplêndido templo, de grandes e nobres proporções chove como na rua e o
magnificente coro que é um dos melhores exemplares da nossa época do rococó
está destinado a desaparecer, atacado pelo caruncho ou pelas mesmas mãos que
destruíram o claustro…
Quando vou a Lorvão e ainda lá
encontro perdida naquelas ruinas solitárias, como um náufrago que escapou a cem
porcelas, a custódia de prata dourada guarnecida de pedrarias – uma relíquia da
nossa arte sumptuária do século XVIII – esquecida e inapreciada na vasta
igreja, hoje sertaneja, e vejo ao mesmo tempo abandonados os sarcófagos de
prata que contêm os restos das infantas, filhas de D. Sancho I, não posso
deixar de fazer as mais amargas reflexões acerca da conservação que Portugal
dedica aos seus monumentos."
segunda-feira, maio 25, 2015
Lorvão: impressões da visita de Lino d'Assumpção em finais do séc. XIX
A descida [entre Chelo e Lorvão] vai
sempre por entre pinhais, na meia encosta abrupta e pedregosa, ao fim da qual
(...) se ouve correr a água, embora se não veja. O sol está alto e mordente;
sol cruel, implacável pressagio certo de tempestade, e cuja lividez estampa no
terreno estratificado e amarelo a sombra esburacada dos pinheiros que
rumorejam brandamente.
Além. onde a orreta se alarga, vêem-se bois pequenos lavrando a
terra escura e fraca, que vai sendo semeada com punhados de milho, e das rodas
duma azenha, cujo ruído melancólico e rítmico chega até nós, levantam-se
pulverizações douradas pela luz do sol. Nas bifurcações indecisas guiam-me
rodadas fundas dos carros. E cantam melros e pintassilgos.
Lorvão: bilhete postal em 1926 |
Cruzo-me no caminho com raros homens
de estatura pequena e cara rapada, vestidos de briche , e mulheres sem beleza,
de tez encarquilhada, saias sombrias colhidas nas ancas, anágua pela cabeça, ou lenço traçado na cara, que
quase lhes tapa a boca, deixando escapar na testa umas farripas de revolto
cabelo, que melhor se lhe chamaria estopa; pés descalços e deformados,
carregando pesados cestos que lhes achatam os crânios; e tanto homens como
mulheres correspondem à minha saudação com um reenvio religioso. Interrogados —
questão de passar o tempo — que tal ia a lavoura, respondiam:
— Tchoveu, mais foi poucatchinho
: mas Deus Nosso Senhor, assim como manda o pouco, pode mandar o muito, se
quiser.
Uma vez chegado a Lorvão,
encontra “ao soalheiro das portas”, sentadas, “mulheres e crianças cortando e
afeiçoando em palitos os troncos brancos do salgueiro.”
E a descrição prossegue com
grande pormenor:
Ao cabo da rua principal, e
fazendo esquina para o largo do mosteiro, encontra-se, á esquerda, a venda do
Carlos. Loja suja, dividida por um balcão negro, ao longo do qual vai e vem com
passo lento, gesto mole e aborrecido, o dono da casa, quando não anda por
Espanha fazendo negócio.
Era a hora do maior concorrência.
Mulheres e crianças entravam de xaile pela cabeça, e a troco de palitos levavam
bacalhau, açúcar, arroz, café, petróleo, azeite, vinho, broa, fósforos ou papel
de cor. O palito é ali a moeda corrente. Para as transacções entre o merceeiro
e os seus fregueses não há necessidade do intermédio nem da Casa da Moeda com
as cédulas, nem do Banco de Portugal com as notas. O Carlos recebe os maços,e
examina-os quase papel por papel, como um usurário examinaria uma peça de ouro
suspeita. Ele bem sabe que se o poderem enganar que não deixam de o fazer;
portanto, só depois de verificar se a moeda lhe serve é que dá a fazenda que
lhe pedem e ela representa. Muitas vezes a moeda sofre uma depreciação que ele
arbitra, atendendo á qualidade ou imperfeição do fabrico; outras então
rejeita-a sem dó, como se fossem notas falsas: sem reparar que esses macinhos
em que à pressa se juntaram lascas tortas, escuras, mal aparadas, representam
uma fraude da fome que, ao meio dia, desejaria roer um bocado de broa. E como
esta. saída do forno, cheira bem e abre o apetite! Não resisto ao desejo de a
provar e de reconhecer que em tal ocasião me soube como se fosse a melhor
iguaria.
Verificada a qualidade dos
palitos, o Carlos atira com eles para diversos repartimentos, segundo a
qualidade, e depois exporta-os por sua conta. A média das compras anuais anda
por uma dúzia de contos de réis. Dizem que perto de mil pessoas se ocupam neste
fabrico, tão simples como primitivo.
In As freiras de Lorvão : ensaio de monographia monastica / T. Lino
d'Assumpção,1899
domingo, maio 17, 2015
O que de pior se terá escrito sobre as gentes de Lorvão
Lançámos, há
dias no Facebook, algum “suspense” ao escrever “O QUE DE PIOR SE ESCREVEU SOBRE
AS GENTES DE LORVÃO...NUMA REVISTA DE ÂMBITO NACIONAL...EM 1913”, prometendo, a
curto prazo, voltar ao assunto nestas páginas do PenacovaOnline.
De facto, na
revista “Ilustração Portuguesa” foi publicado um texto, profusamente ilustrado (como é uso dizer-se), onde a par de sentimentos de algum pesar perante o estado
decadente do Mosteiro de Lorvão (que em 1910 havia sido declarado monumento
nacional), Magalhães Colaço (tratar-se-á de João Maria Telo de Magalhães Colaço
[1893-1931], professor de Direito em Coimbra?), lança um anátema contra os habitantes de
Lorvão, como se fossem eles os culpados de todo aquele “pesadelo de sombras e
de tristeza” reconhecido pelo articulista.
Pese embora
o mérito de alertar para o estado lastimoso do mosteiro e também de retratar de
algum modo a vida social e económica ligada à manufactura dos palitos, este
artigo, continuamos a achar, está ferido de uma concepção preconceituosa
da pobreza, que, sem dúvida, existia em Lorvão, tal como em todo o país na época em que o autor escreve.
O artigo
intitula-se “Palitos de Lorvão”. Como dissemos, inclui algumas preciosidades
fotográficas, tem aspectos positivos... mas, quase nos custa trazer à baila os
seguintes parágrafos:
“...toda essa gente que lastimei é
gente sem moral, sem coração, nem estímulos, é a escória, vendida em hasta pública,
do género humano – que já não presta.”
“Quando as últimas freiras foram
sepultadas, toda a legião dos nus e miserandos veio refugiar-se no convento ,
fazendo das celas desertas a casa paupérrima de indigentes...”
“Com os seus 1200 habitantes, Lorvão
não tem casas: todas se comunicam, escancaradas, porque todos vivem na mesma
promiscuidade vil.”
“Os homens fortes, são madraços
famosos a quem o descanso, o sol e o vinho puxaram a pescoceira farta ,
abasteceram o tronco e puseram aos olhos todo o brilho gorduroso dos alcoólicos
professos. Toda a freguesia, esssas mil e duzentas pessoas, trabalha em palitos
– dez minutos antes de comer. Levanta-se tudo tardissimo, e se lhes falta o
café, como quem toma do realejo para conseguir esmolas, eles se dispõem ao
trabalho, em semi-círculo, homens, mulheres e crianças de ambos os sexos.”
Para quem
tiver mais tempo, curiosidade e paciência para ler, deixamos aqui, em grafia actualizada, o
texto integral.
Oportunamente, daremos continuidade ao tema, referindo textos
de Lino d’ Assumpção e de Emídio da Silva publicados em 1899 e em 1909,
respectivamente, bem como de Cabral de Moncada e outros, relacionados com Lorvão nos finais do séc-XIX e inícios do séc- XX.
PALITOS DE
LORVÃO
Fica-se comovido e absorto, à vista do Lorvão. O vale fundo, sombrio,
tristíssimo, onde jazem os despojos do convento. Já não merece aquele nome rude
– Lorvão – nome rápido e áspero com o quer que seja do ressoar longínquo de
séculos bárbaros e no qual ainda ecoa o ruído dessas terríveis tempestades das
almas e dos elementos que rebentaram naquele vale onde apenas cabe o mosteiro.
Que apagada tristeza, que confrangida piedade a dos meus olhos, fitando o velho
rosto do enorme convento esquecido. Já não tem portão a antiga entrada para o
terreiro antigo, em quadrilátero, sem vidro os caixilhos cheios de erva,
negríssimas a s grades de ferro de todas as janelas, a que assomam grupos
inteiros de famílias acolhidas ao convento. E que rogos lamentosos os destas
pedras, que preces combalidas as destas janelas – olhos do mosteiro - a
balbuciarem transidas, que não as trespassem mais os ventos e cóleras do céu.
Mas como pode remir-se o velho mosteiro arruinado, grande, hirto, na sua
magreza de cadáver? Quando as últimas freiras foram sepultadas, toda a legião dos
nus e miserandos veio refugiar-se no convento , fazendo das celas desertas a
casa paupérrima de indigentes, ao relento prefrindo o frio que sofre quem vive
nestas celas de pedra e ferro...
Pobre mosteiro de Lorvão! Para que hás-de morrer aos poucos,
sem freiras que te lisonjeiem, sem madres abadessas que te mandem restaurar,
pintar olheiras que fossem mascarar-te a velhice, fazer chalrear nos teus
claustros, ornamentar de graças o teu coro sumptuosíssimo, povoar formosas as
tuas celas que foram encantadas e refazer
de ti o mosteiro opulento do tempo dos antigos reis - quando a altiva Filipa d’Eça, de sangue azul,
neta de El-Rei D. Manuel I, e monja eleita contra tenção de D. João III, leva a
revolta às assembleias do coro e debatia com o régio amo e recorria para Roma
distante e poderosa, soprando tempestades desse pequenino vale, onde a natureza
é arida e e os deuses espalharam a
miséria e a inópia?
O velho convento geme dolorido nas friagens das noites
chuvosas, acalma suas dores a os luares de quem ja ouviu louvores nos lábios
das freiras, quando à Cerca desciam a beijar seus pares, se a manhã traz uma réstea
de sol, todo ele se espreguiça os membros como o calor benéfico da natureza
lhes sarasse as chagas e o aliviasse da
torpeza promíscua dos seus centos de habitantes.
Pobre mosteiro de Lorvão, bendito e louvado quem te talhasse
a tumba! Pobre mosteiro, mosteiro velho das lendas, ergue a tua voz pela noite
e canta a tua vida gemendo...
...
E como há aqui quem sorria, cante, e case tão jubilosamente,
como no dia em que visitei Lorvão?
Só depois me informaram: toda essa gente que lastimei é gente
sem moral, sem coração, nem estímulos, é a escória, vendida em hasta pública,
do género humano – que já não presta. Com os seus 1200 habitantes, Lorvão não
tem casas: todas se comunicam, escancaradas, porque todos vivem na mesma
promiscuidade vil.
Os homens fortes, são madraços famosos a quem o descanso, o
sol e o vinho puxaram a pescoceira farta , abasteceram o tronco e puseram aos
olhos todo o brilho gorduroso dos alcoólicos professos. Toda a freguesia,
esssas mil e duzentas pessoas, trabalha em palitos – dez minutos antes de
comer. Levanta-se tudo tardissimo, e se lhes falta o café, como quem toma do
realejo para conseguir esmolas, eles se dispõem ao trabalho, em semi-circulo,
homens mulheres e crianças de ambos os sexos. Tomam da navalha e dos vimes de
salgueiro branco, abrem-nos em quatro e, afirmando-os sobre um pequeno protector
de couro que os envolve do joelho esquerdo até ao pé, aí adoçam a madeira, afiam-na em ponta, com duas ou três passagens
rápidas de canivete. Voltam essas pontas, marcam nos vimes a altura conveniente
ao palito, cavando a madeira e vergam, partem quatro hastes de cada vez. Aí estão
os palitos que eles enrolam e vendem em maços a três vinténs. Vinténs? Olhem a
fantasia...No Lorvão, desde que as freiras abalaram, já não há moeda alguma - de
metal. A moeda é o palito, o autêntico, cujo maço vale uns tantos gramas de
café ou farinha, uns tantos decilitros de vinho. O homem da venda e da tenda
recebe palitos, não recebe dinheiro, mas examina a moeda com um escrúpulo, com um rigor de quem conferisse velhas
assinaturas em pergaminhos antiquissimos. Aquilo tudo é pesado, medido, contado
e retribuido em género, de que eles fazem o almoço. Só despertam de novo para a
hora de jantar. Há pão? Não há. E lá se têm de afiar mais uns palitos . . . Não
trabalham, - mas não são exploradores, haja de confessar-se. Essas hastes, vendem-nas
de graça, e nas raparigas, nem um ar de coqueterie
a rogar mais uma espórtula de generosidade ao estranho que os compra. Por
vezes, apenas um leve sorriso a quem se abeira, como esse que dispensaram ao
meu companheiro de viagem .
Lorvão prolifica prodigiosamente. É que nada há tão
semelhante à opulência desmedida como a miséria crassa: aquela cria bastardos
sem temor, esta alimenta filhos sem cuidado. E, como era de prever depois de se
ter visto, esta gente, que anda sempre de canivete em punho, nunca o enfia pelo
seu semelhante. Em Lorvão há todos os dias insultos, ameaças, injúrias,
arrenegos, e, contudo, raro se marca um homicídio. Para tudo esta gente traz perdida
a energia...
E quem há-de explicar que assim floresçam, entre a lama,
algumas carinhas lindas de raparigas, cujos pés patinham detritos, cujos
corações sabem todas as amarguras - todas casam já mães -, emergindo umas
cabecitas lindas, olhos como gemas, gemas preciosas de côr e de suavidade?
Quem sabe? serão estes tipos de ciganas, netas ainda das
freiras lindas e graciosas que morreram d'amor ... cansadas? Aquela, mais
formosa ainda de lenço em touca, será neta de alguma abadessa?
Lá entram no terreiro do convento cheio de relva, por onde correm míseros garotos esfaimados.
Parece, no século XVIII, a hora sombria
das sopas distribuidas aos pobres que viviam nas abas do mosteiro.
Olho as janelas altas, gradeadas do negro ferro antigo, a querer ver
as freiras de mantos brancos. E vejo ainda as mesmas pobres, com mantos negros
de miséria. Caem horas da torre. Lorvão é agora um pesadelo de sombras e de
tristeza...
Magalhães Colaço
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