No início do século XX, a Sociedade de Propaganda de Portugal inscreveu Penacova no conjunto das 17 localidades portuguesas dignas de serem visitadas. O triângulo Coimbra-Penacova-Luso/Bussaco foi, nos primórdios do turismo no nosso país, um dos circuitos mais divulgados por aquela Sociedade. A conclusão da estrada que liga Penacova ao Luso, a "estrada dos Emídios", assim designada porque à história da sua construção ficaram ligados quer Emídio Navarro, quer Emídio da Silva, permitiu que a Penacova afluíssem muitos mais visitantes. Na época, a Câmara de Penacova, "em testemunho do reconhecimento, resolveu colocar na sala nobre dos Paços do Concelho os retratos daqueles dois beneméritos".
Sobre a relação de Emídio da Silva com Penacova, o Diário de Notícias viria a escrever que “em matéria de turismo deve-lhe ainda, por exemplo, a vila de Penacova, uma das mais pitorescas do país, larga campanha em seu favor. Em troca, a um mirante que ali se erigiu e de onde se descortina sobre o Mondego uma paisagem deliciosa, deu a vila o nome de Manuel Emídio da Silva. Dos "Emídios" se chama também a estrada que liga os vértices Luso-Penacova-Coimbra, do chamado triângulo turístico do centro do país, em louvor popular do seu nome e de Emídio Navarro, o primeiro que deu fundos para a sua construção."
A Sociedade de Propaganda de Portugal, também conhecida por Touring Club de Portugal, foi fundada em 1906. Tinha como objectivo geral colocar o país no “mapa de turismo do mundo”, tal como acontecia noutros países, pela propaganda e pela promoção do mapa excursionista português. Na sequência da participação desta Sociedade, quer no II Congresso de Turismo (San Sebastian, 1909) quer no III Congresso (Toulouse, 1910) - onde apresentaram comunicações Manuel Emídio da Silva e Luiz Fernandes – coube-lhe a responsabilidade da organização do IV Congresso (Lisboa, 1911).
A Comissão de Honra foi presidida por António José de Almeida, Ministro do Interior, incluindo também o ministro das Finanças, José Relvas, e o ministro do Fomento, Brito Camacho. Por sua vez, a Comissão Organizadora tinha como presidente Bernardino Machado, ministro dos Negócios Estrangeiros. Nesta comissão, enquanto secretário‑geral, vamos encontrar Manuel Emídio da Silva, presidente do Conselho de Administração da Companhia de Caminhos de Ferro Portugueses. Como secretários, figuraram José Lino Júnior, engenheiro, irmão do arquiteto Raul Lino e diretor do Automóvel Club de Portugal, Alfredo da Cunha, diretor do jornal Diário de Notícias, Fernando Emídio da Silva (filho de Emídio da Silva) diretor da Sociedade de Propaganda de Portugal e Luiz Fernandes, vice‑presidente de secção de Hotéis da Sociedade de Propaganda de Portugal. Recorde-se que estas personalidades tinham estado em 1908 na inauguração do Mirante. José Lino Júnior e Luiz Fernandes voltarão a Penacova em Julho de 1918 para apreciar o andamento das obras de construção da Pérgola.(1)
Sede da SPP em Lisboa (Rua Garrett) |
Reconhecendo Penacova como “região caracteristicamente de turismo pelas belezas naturais que encaixilham o Mondego e pelos horizontes que do largo da povoação se desfrutam”, a SPP decidiu mandar construir na vila uma Pérgola (ou latada). Refere o Relatório de 1916 que aquela Sociedade, pelos motivos enunciados e por “constituir um centro de turismo de certa importância”, decidira “aformosear o largo” com a construção de uma Pérgola projectada pelo “distinto arquitecto Raul Lino”. É, ainda, aquele documento que revela o custo da obra: 500 escudos.
Entretanto Luiz Duarte Sereno, passara a ser o representante daquela associação em Penacova. Em Março de 1917, este Juiz penacovense (que chegou, mais tarde, a ser Governador Civil) em entrevista ao Jornal de Penacova deu conta do andamento do projecto. Apesar de ter sublinhado que o custo da obra se devia à Sociedade de Propaganda de Portugal, fez questão de realçar “a mais dedicada cooperação” por parte da Câmara. Na ocasião, anunciou para início do mês de Abril o arranque das obras e apontou o dia 31 de Maio para a inauguração, conforme seria desejo de Emídio da Silva. Note-se que nesse dia se assinalariam 10 anos da inauguração do Mirante.
Este calendário não se cumpriu e as obras só acabariam por ser concluídas em Dezembro de 1918. Entretanto, em Julho desse ano, tinham vindo a Penacova apreciar os trabalhos, José Lino Júnior e Luiz Fernandes e outras pessoas da capital.
Sobre a relação de Emídio da Silva com Penacova, é o próprio que, mais tarde, escreverá numa carta dirigida ao director do jornal recentemente criado “Notícias de Penacova” (10 de Setembro de 1931) o seguinte:
“Há um quarto de século que venho a Penacova e desde o primeiro dia tenho sido um entusiástico propagandista das belezas pitorescas desta linda vila. A minha propaganda não tem sido, porém, tão desinteressada como muita gente crê, pois sou pago de cada vez que volto aqui pelo deslumbramento desta sublime paisagem que me inebria de prazer espiritual! … E sou ainda generosamente gratificado pelo acolhimento carinhoso e pelas distinções que ao mesmo tempo recebo dos Penacovenses entre os quais logrei criar amizades certas e duradouras."
É também aquele jornal que recorda que Emídio da Silva, “vindo a esta vila de passagem para visitar o Convento de Lorvão, [acompanhado por Augusto Simões de Castro] ficou de tal maneira extasiado com as paisagens de Penacova que poucos dias depois iniciava no Diário de Notícias uma intensíssima propaganda em favor delas. Por influência sua, incluiu a Sociedade de Propaganda de Portugal a vila de Penacova no número das terras do país que mereciam ser visitadas."
É de salientar que Raúl Lino pertencia ao círculo de pessoas ligadas à Sociedade de Propaganda de Portugal. A título de exemplo, a revista Ocidente (Abril de 1910) dá conta de uma “soirée de récita e baile” em casa de Alfredo da Cunha, onde foi apresentada, entre outras, uma peça de teatro escrita e representada por Raúl Lino. Terá sido nesse contexto que aquele arquitecto estivera já na inauguração do Mirante em 1908. O Diário de Notícias de 31 de Maio daquele ano noticia o acontecimento com grande destaque. No artigo “Festejos em Penacova” podemos ler que “a convite do Sr. Presidente da Câmara Municipal, o dr. José Albino Ferreira (…) partiram ontem para ali muitas pessoas de Lisboa e Coimbra, que vão assistir à inauguração do belveder (…). Entre essas pessoas de Lisboa, que ontem ali chegaram, figuram os Srs. Raúl Lino e esposa D. Alda dos Santos Lino (…) “.
Assim se compreenderá melhor a marca deixada por Raúl Lino em Penacova, que não se terá limitado à Pérgola. Sabemos que também a lápide do Penedo do Castro foi por ele desenhada, mas consta que a vivenda mandada construir por Joaquim Correia de Almeida Leitão, na Cova do Barro, terá tido também a mão daquele famoso arquitecto.
Junto à Pérgola existe uma placa [colocada numa parede que na época não existia, pois o actual edifício da Câmara é muito posterior] com os seguintes dizeres: “Esta ramada delineada pelo arquitecto Raul Lino, de Lisboa, foi mandada construir pela Sociedade de Propaganda de Portugal e oferecida pela mesma ao povo de Penacova a quem é confiada a sua guarda e conservação – Ano MCMXVIII”.
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(1) O dicionário Porto Editora regista o termo pérgula, mas não traz pérgola. Diz que pérgula vem «do latim pergula-, "varanda
exterior"», tratando-se de «espécie de passeio com cobertura em forma de
ramada decorativa» ou «terraço coberto». O dicionário eletrónico Houaiss acolhe
a palavra pérgola, embora nos remeta
para pérgula, o que significa
que este é o termo preferível; e considera que é uma «espécie de galeria
coberta de barrotes espacejados assentados em pilares, geralmente guarnecida de
trepadeiras». Também o dicionário on-line Priberam admite como sinónimo
geral o termo pérgola.
Fontes: Jornal de Penacova, Notícias de Penacova e Blogue PenacovaOnline
Consultámos também o trabalho
de Seminário “Largo Alberto Leitão em Penacova – a Pérgula Raúl Lino e o Busto
de António José de Almeida” elaborado por Alda Celeste Frias Morgado Santos
(Fac. Letras UC-2009)
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