Os "Apontamentos de Viagem de Alexandre Herculano" são um conjunto de anotações e reflexões sobre as suas viagens pelo país, no contexto da Academia das Ciências, especialmente em 1853 e 1854. No Verão de 1853 Herculano esteve na região de Coimbra, incluindo Lorvão e Penacova.
No dia 10 de Julho assistiu à Procissão da Rainha Santa, no regresso a Santa Clara. No dia seguinte esteve no Cartório da Fazenda da Universidade e depois, até ao dia 15, antes de seguir para Lorvão e Penacova, consultou e analisou, com a ajuda de um paleógrafo, muitos dos documentos, alguns em “lastimoso” estado, das Colegiadas de S. Pedro, S. Cristóvão e de S. Tiago. Passou igualmente pelo o arquivo da Câmara.
No dia 15 parte para Lorvão. Sobre esta viagem são particularmente interessantes as observações que vai registando, ao calcorrear aquelas “duas léguas de Montes”: “São grandes outeiros formando montanhas, e acumulados uns aos outros sem a intersecção de vales” – escreve Herculano.
Observa os pequenos recantos de cultivo, “arroteações de recente data, cultivados na maior parte até aos cumes”. Os acessos, como é de imaginar não passavam de “caminhos ladeirentos e tortuosos”.
Curiosa é também a descrição do panorama que do alto da Serra do Dianteiro (que seria já o alto da Aveleira / Roxo) se avistava:
- “em frente, cordilheiras da serra da Estrela elevando-se-lhe os topos como barras pardo--escuras por cima das barras brancas de nuvens”
- “para o lado do norte os territórios levemente ondulados até o Vouga”:
- “para o poente os campos entre Coimbra e Montemor: o Mondego areado e quase sem águas parece ao longe uma estrada tortuosa que atravessa a campina.”
E o mosteiro? Nada se avista. Até porque “só se descobre ao chegar a ele, pela sinuosidade da descida íngreme e pelo relvoso da encosta.”
Original é a imagem do vale de Lorvão. Herculano compara-o ao “cálice de um lírio” e sugere um exercício de imaginação: “uma flor” com um “pistilo grosso e curto, rasgado por um lado”. É desse ponto, dessa “rotura” que “saem as águas da bacia” !
Segue-se a descrição telegráfica (e geometrizante) do mosteiro: “O mosteiro é um longo paralelogramo, a cujo topo para a nascente se liga outro muito mais curto formando com ele um ângulo aberto: por detrás deste ângulo levanta-se a cúpula do zimbório da igreja, que se prolonga com o edifício pela parte interior.”
Uma vez chegado à portaria, registou:
“Estátua de D. Teresa à esquerda: letra antiga — POST THALAMUM ALFONSI REGIS THARASIA FUNDAT LORVANI MONACHAS ET MONIALIS OBIT. Estátua de D. Sancha à direita: letra moderna — REGIA PROGENIES PIA VIRGO CELLAS. EXTRUIT INDE OBIENS CAELICA REGNA PETIT.
(Continua)