26 outubro 2015

Penacova e Lorvão sob o olhar de Saramago



Entre Outubro de 1979 e Julho de 1980 José Saramago terá estado em Penacova e Lorvão a fim de recolher elementos para a obra que o Círculo de Leitores lhe encomendara e que viria a ser publicada em 1981 com o título de “Viagem a Portugal”.

Vindo de Góis, onde visitou o túmulo de D. Luís da Silveira, depreende-se, pelo seu relato, que terá passado por Vila Nova do Ceira, Poiares e Louredo, em direcção a Penacova: “O caminho que leva a Penacova é um constante sobe-e-desce, um novelo de curvas, e atinge o delírio já perto do Mondego quando tem de vencer o desnível em frente à Rebordosa.”

“Enfim, aqui está a ponte - escreve - agora é subir até Penacova, nome que consegue a suprema habilidade de conciliar uma contradição, reunindo pacificamente uma ideia de altura (pena) e uma ideia de fundura (cova). O que logo se entende quando se verifica que construíram a meia encosta: quem vem de cima, vê-a em baixo; quem vem de baixo, vê-a em cima. Nada mais fácil.”

Estaríamos no Inverno de 1979, num daqueles dias em que a amenidade de Penacova também não resiste. “O viajante almoça numa sala gelada e húmida” onde “a criada, envolvida em acumuladas roupas, tem o nariz vermelho, constipadíssima.”

Salve-se um elogio à boa comida porque de resto o tom irónico vem ao de cima:” Parece uma cena polar. E se a comida é excelente, bastou-lhe viajar entre a cozinha e a mesa para chegar fria.”

Para agravar a má disposição (conforme confessa) dá com as bombas de gasolina fechadas, abrindo só às três horas. Para passar o tempo resolve ir à Igreja Matriz e “levar o dobro do tempo necessário” e depois, da Pérgola, “olhar cá de cima o vale do Mondego, contemplar os montes à procura de qualquer aspecto que os distinga dos cem outros vistos antes e justifique tão longo admirar”. Mesmo a chuviscar deteve-se ali algum tempo, o que terá induzido em erro quem porventura reparou nisso. “Os penacovenses devem estar muito satisfeitos com este viajante, que tanto mostra gostar da terra, ao ponto de não abandonar o muro do miradouro, nem mesmo quando chuvisca”.

“Enfim, deram as três, já pode ir a Lorvão.” – desabafa. A visita a Lorvão não mereceu grandes elogios, a não ser um ou outro comentário mais positivo. “De Lorvão não viu muito. Levava a cabeça cheia de imaginações, e portanto só pode queixar-se de si próprio. Da primitiva construção no séc. IX, nada resta. Do que no século XII se fez, uns poucos capitéis. Pouco relevantes as obras dos séculos XVI e XVII. De maneira que aquilo que mais avulta, a igreja, é obra do século XVIII, e este século não é dos que o viajante mais estime, e em alguns casos desestima muito.”

A frustação é evidente, pois “vir a Lorvão à espera de um mosteiro que corresponda a sonhos românticos e responda à paisagem que o rodeia, é encontrar uma decepção.”

Apesar de achar a igreja imponente, entende que a sua arquitectura é “fria, traçada a tira-linhas e escantilhão de curvas.” Nem “as três gigantescas cabeças de anjos que enchem o frontão por cima da capela-mor” escapam à crítica: “ são, no franco entender do viajante, de um atroz mau gosto.”

No entanto, “belo” é o coro, “com a sua grade que junta o ferro e o bronze”. Belo também o cadeiral setecentista e “o claustro seiscentista, da renascença coimbrã.” “E se o viajante está de maré de não esquecer o que estimou, fiquem também notadas as boas pinturas que na igreja estão.” – deste modo termina Saramago (o escritor que em 1998 ganhou o Prémio Nobel da Literatura) o relato da sua visita a Lorvão, num dia frio e chuvoso de 1979.

17 outubro 2015

LORVÃO: Tricentenário da Trasladação das Santas Rainhas para os Túmulos de Prata

“A funcção que começara depois do meio dia terminou ás dez horas da noute, 
quando já a frontaria do mosteiro se achava deslumbrantemente illuminada;
 estoiravam no ar as bombas dos foguetes e morteiros, 
cahiam as bagas luminosas dos foguetes de lagrimas, 
e os fogos d'artificio eram acclamados por enorme multidão,
 que juntava as suas acclamações 
ao repique jubiloso dos sinos.”
                                      in "As Freiras de Lorvão"

clique para ampliar
Prossegue hoje o programa da Comemoração dos 300 Anos da Trasladação das Santas Rainhas Teresa e Sancha em Lorvão. Como se pode verificar pelo cartaz das Comemorações outros eventos decorreram e vão decorrer este fim de semana. Ontem teve lugar a  Celebração de Abertura dos Túmulos, presidida pelo Senhor Bispo de Coimbra bem como  cerimónia da Veneração das Sagradas Relíquias. Ainda, a cerimónia do lançamento do livro infanto-juvenil "Teresa de Portugal", uma edição do Município de Penacova com autoria de Paula Silva e ilustrações de Cristina Carvalho e Paula Silva. Hoje à noite há um espaço musical que contará com as actuações Coral Divo Canto (Penacova) e dos grupos convidados: Coral Polifónica "Santiago López" (Pravia - Astúrias) e Coimbra Gospel Choir.


 Fotografias de "PENACOVA EVENTOS" no Facebook






APONTAMENTO SOBRE A TRASLADAÇÃO EM

1715

No livro “As Freiras de Lorvão” de  T. Lino d'Assumpção é feita uma descrição daquele momento alto da Trasladação. Para as pessoas mais interessadas em conhecer com algum pormenor estes acontecimentos, transcrevemos, do original, e por isso redigido em português de finais do séc XIX, um excerto (não incluindo notas de rodapé) daquela obra:

Quatro séculos passaram e durante elles as sepulturas das duas irmãs estiveram no coro monástico, obrando grande copia de milagres, conjunctamente com o copo por onde D. Thereza bebia em vida. Mas a quantidade de romeiros era tal á procura de saúde, tantos os devotos que junto do tumulo das santas desejavam expandir-se em lagrimas e suspiros, que vinha d'isso fraude e perturbação para a clausura, e sempre importunas visitas.
Pensava a abbadessa D. Bernarda den Lencastre,neta d'el-rei D. Manuel, por seu pae o cardeal Affonso, em fazer trasladar para o corpo da egreja os dois mausoléus, mas achou a communidade resistente em conformar-se com tal deliberação.Foi neste transe que ceu  se manifestou, como soe  acontecer cm casos taes.
Certa noute, uma das monjas. D. Catharina d’ Albuquerque, sonhou que estava vendo as duas santas vestidas como nos tempos idos da sua vida.  Grandes calanticas ou toucas de miúdas pregas na cabeça, fino e branco veu nos hombros, longas estolas franjadas cahindo-lhes até os pés, e mantos presos ao pescoço por fivellas de ouro.
Uma a outra compunha seus adornos, e na conversa pareciam um pouco agitadas. Tremendo, perguntou- lhes Catharina o que queriam? ao que ellas responderam, rindo: que o fosse  perguntar ao questor da communidade,  João Lacto. E, ao esvairem-se no espaço, acordou a monja.
Immediatamente procurou a abbadessa a quem contou o succedido. Foi chamado o questor e este decidiu que as duas rainhas queriam que os seus túmulos fossem trasladados para a egreja. Soube o mosteiro da visão e ninguém se atreveu a oppór-se a tão formaes ordens.
E' esta a versão que corre impressa, inclusive no processo da beatificação; entretanto, nas memorias manuscriptas do mosteiro, attribue-se a mudança á abbadessa D. Briolanja de Mello.
Eis a copia d'um rascunho para o seu termo de óbito, que existe no livro respectivo:
“A muito religiosa D. Briolanja de Mello, religiosa deste real mosteiro de S.ta Maria de Lorvão foi a penúltima abbadessa perpetua d'esta casa, viveu com muita edificação e santidade, guardando os votos e em tudo o mais a regra do nosso P.° S. Bento; e, estando para ser abbadessa, havendo duvidas como fosse feita abbadessa, nessas occupações veiu uma voz do ceu que a publicou. No seu officio se conheceu fora feita por Deus, e assim se verifica, pois escolheu o Senhor o seu tempo para se publicarem os thesouros que tinhamos nas santas rainhas S. ta Theresa e S.ta Sancha; por que estando as suas sepulturas no interior do mosteiro, e havendo grande difficuldade em as religiosas as deixarem ir para fora, por não perderem a- consolação de tão santa companhia, ellas acharam merecimentos para lhes apparecerom e mandando-lhes que as puzessem na egreja de fora, que Deus ajudaria. E assim foi que as religiosas se accommodaram com a sua saudade: conhecendo pela sua virtude era vontade de Deus, e se ficou fazendo muito maior estimação da prelada. Foi Deus servido, depois (Testa obra. leval-a para si com grande mostra do salvação e edificação das religiosas d'aquelle tempo, em que todas, pelas noticias que achamos no cartório, foram santas pelo espirito com que vieram á religião ».
Na egreja estiveram os dois túmulos até que em 1617. uma das religiosas, D. Catharina da Silveira, mandou fazer a capella de Nossa Senhora do Rosário, e os sarcophagos ficaram constituindo o altar, um junto do outro.
Nessa occasião. emquanto os operários foram jantar, as monjas sahiram da egreja, e, servindo-se das ferramentas, levantaram a pedra do sepulchro de D. Thereza. « Logo um suavissimo perfume" se espalhou pela egreja, e o corpo, deitado numa alcatifa de flores, tão frescas, como se ali não estivessem ha perto de quatrocentos annos, mas como se fossem cortadas naquella hora, achava-se inteiro, cerrados os olhos e entreaberta a bocca, deixando ver os alvos dentes como de quem sorri. Vestia habito de S. Bernardo e sobre o rosto estendia-se um veu preto e a pelle tão fresca e tão perfeita como se estivesse dormindo ».
Na egreja continuavam os cadáveres bemaventurados a obrar tantos milagres, que el-rei D. Sebastião resolveu promover em Roma as duas beatificações, o que não levou a effeito pelos revezes que todos conhecem e que, se lhe custaram a vida, nós tivemos que pagal-os com a independência. O intento do cavalheiroso príncipe foi continuado pelos prelados da Ordem  e, d'accordo com as monjas, trataram durante largos annos a causa junto da Santa Sé, até que em 1705 conseguiram que Clemente XI declarasse bem aventuradas as filhas de Sancho I. Os gastos para tal concessão foram tantos que durante dez annos o mosteiro ficou empenhado, a ponto de somente, em 1715, sendo então abbadessa D. Bernarda Telles de Menezes, se conseguir fazer a trasladação dos túmulos de pedra, em que os cadáveres jaziam, para outros em que mais ricamente ficassem expostos á veneração dos fieis. Muito custa, em Roma, ser santo ! Foi encarregado d'esta obra, de prata lavrada batida a martelo, batida a martello, o ourives do Porto, Manuel Carneiro da Silva, que se não fez cousa maravilhosa, como diz o editor da Monarchia Lusitana, Miguel Lopes Ferreira, fez comtudo uma obra bem acabada e que não deixa de ter grande ar e o que quer que seja da elegância cortezã d'aquelle século .
Estes novos cofres são ambos semelhantes. Teem o feitio de urnas, forradas de veludo  carmezim sobre o  qual assentam lavores de prata recortada,realçados de pedrarias. A tampa termina com remate de dois anjos sustentando uma coroa, de cujas aberturas sahem quatro açucenas. A collocação das urnas, em nicho, impede que se vejam por todos os lados, mas o citado Ferreira assim as
Descreve:
O tumulo de santa Thereza «na primeira face tem formada uma tarja com a imagem da santa Rainha vestida no habito de S. Bernardo, com um escudo aos pés partido em pala, do lado direito as armas de Leão de que foi rainha, no esquerdo as de Portugal, onde nasceu infante, e esta lettra: Sancta Theresia Regina. Na face ulterior, e logar correspondente á primeira, se forma outra tarja em que se vêem umas lettras complicadas, cifra do nome da reverendíssima prelada, em cujo triennio se fez a obra, e junto a ella um escudo atravessado com uma banda  xadrezada entre duas flores de liz, que são as armas da illustre Ordem de Cister. Da parte da cabeceira ha outra tarja, que expõe uma cruz, e por cima duas mãos dadas com esta inscripção : Votis conjunctis. Na correspondente ha outra tarja, e nella esculpido em meio relevo um mosteiro com esta epigraphe: Hic tutor».
A urna que encerra os restos de D. Sancha é em tudo semelhante á primeira, differençando-se nas figuras, emblemas e disticos. «Vê-se na tarja da primeira face a imagem da mesma santa polidamente formada, com esta inscripção : Sancta Sanctia Infans ; e ao pé um escudo com as armas de Portugal. Na cabeceira duas coroas, uma real, outra de espinhos, com esta lettra: Per hanc ad illarn. Na parte dos pés duas mãos dadas com esta: Felicitas temporum; e no remate do meio uma coroa por onde saem quatro palmas ».
A trasladação, a que assistiram o bispo de Coimbra, e seu cabido, o D. Abbade Geral, o senado da cidade, vários abbades cistercienses e grande multidão, realizou-se a 19 d'outubro de 1715, depois de alguns mezes perdidos em questões de formalidade, etiqueta e jurisdicção entre o Bispo e o D. Abbade, tão próprias daquelle século essencialmente formalista.
Foram então abertos os túmulos para se fazer a trasladação dos cadáveres. O de santa Thereza, coberto com um veu de tafetá branco, estava completo, mas a cabeça separada do tronco e os ossos já sem carne nem pelle. O de D. Sancha « se viu todo unido e inteiro sem embargo de se haver sepultado quatro centos oitenta seis annos antes, com os braços cruzados sobre o peito, e estes organizados com a composição dos ossos, e nervos cobertos com a pelle e carne: todo o peito composto, e coberto com a cutila sem lhe apparecer nenhuma das costellas: e fazendo exame o dr.  Manuel dos Reis de Sousa, lente de medecina na Universidade de Coimbra, e o dr. Francisco de Oliveira Raposo, medico do convento, pelo contacto do pulso e artelho declararam que se achava brandura na carne. Só se achava separada dos hombros a cabeça». O geral da Ordem tirou-lhe um osso grande da garganta que mandou de presente a D. João V.
Revestidos os dois cadáveres com o habito de S. Bernardo, compostas as caveiras com o toucado e veu de religiosas, foram collocados nos túmulos de prata, fechados a duas chaves cada um, uma de aço outra de prata, entregues ao Bispo, e outras iguaes ao D. Abbade Geral, e collocados no altar, onde até então tinham ficado os de pedra.
A funcção que começara depois do meio dia terminou ás dez horas da noute, quando já a frontaria do mosteiro se achava deslumbrantemente illuminada; estoiravam no ar as bombas dos foguetes e morteiros, cahiam as bagas luminosas dos foguetes de lagrimas, e os fogos d'artificio eram acclamados por enorme multidão, que juntava as suas acclamações ao repique jubiloso dos sinos.
E comtudo a festa não passou sem um dissabor,que por não ter tomado maior vulto, n em por isso deixaria de figurar como incidente no poema do Hyssope. Pois na segunda feira, segundo dia do Triduo que se seguiu á trasladação dos santos ossos, o cabido não teve a audácia grande de vir á porta da egreja de cruz alçada, cantando o Te Deum receber o Bispo !  Ora isto oppunha-se á jurisdicção do D. Abbade Geral que se intitulava nada menos que: D. Abbade do Real Mosteiro de Santa Maria d’Alcobaça, Senhor Donatário e Capitão Mor das Villas de Alcobaça, Aljubarrota, Alfeizarão, Alvorminha, Pederneira, Santa Catherina, Paredes, Coz, São Martinho, Señr do Matto, Mayorga, Évora, Cella, Turquel e mais logares e povoações dos seus termos e coutos do Mosteiro, do Conselho de Sua Magestade, e seu Esmoler Mor, Geral reformador da congregação de São Bernardo nestes Reinos e Senhorios de Portugal e Algarves, etc. etc.
A Senhora da Paz  metteu-se entre os monjes e o cabido, e a pendência de jurisdicção, entre o faustoso bispo-conde d'Arganil  D. António de Vasconcellos e Souza, e o reverendíssimo padre doutor fr. António do Quental, não teve seguimento, embora ficasse, de passagem, consignada nas chronicas.
Findos os três dias de festa, os cofres foram levantados do altar onde durante ellas se conservaram e collocados nos camarins que lhes estavam  preparados na capella mor; o de D. Thereza do lado do evangelho, e o de sua irmã do lado da epistola.
Por fins do primeiro quartel do século XVII, as monjas tratavam de nova mudança dos restos das duas princezas para o seu antigo altar, onde lhes tinham preparada « uma admirável tribuna de rica talha dourada, e nella dous vãos, ou nichos grandes, nos quaes em mãos de anjos se exporiam os cofres das santas rainhas, tudo por modo admirável.
Esta ultima trasladação não se levou a effeito. Que motivos a obstaram, ignoro.“

06 outubro 2015

Faustoso acontecimento suspende o trabalho em toda a Vila

Edição do Jornal de Penacova
de 8 de Outubro de 1910
Mais ou menos por esta hora (oito e meia da manhã) Penacova recebe a notícia: ali para os lados de Santo António ouviu-se um forte “Viva a República” que ecoou por toda a vila. Daí a pouco o largo Alberto Leitão já estava cheio de gente entusiasticamente aclamando a instauração do Regime Republicano em Portugal.
Os ecos deste dia 6 de Outubro de 1910 chegam-nos através do periódico que se publicava desde Setembro de 1901, o Jornal de Penacova. A notícia é conhecida de muitos penacovenses. Muitos deles ainda conservam um exemplar da edição de 8 de Outubro. Por altura do Centenário da República publicámos, com o apoio da Câmara Municipal, o livro Penacova e a República na Imprensa Local. Aí, procurámos ir um pouco mais além do relato que é feito naquele jornal, enquadrando os acontecimentos no clima político que antecedeu o 5 de Outubro bem como nos momentos decisivos que se seguiram.
De modo a assinalar a efeméride, deixamos alguns apontamentos baseados naquilo que escrevemos na referida obra:
“A notícia da Implantação da República em Portugal foi trazida a esta vila pelo nosso correligionário Joaquim Serra Cardoso1, na quinta -feira, pelas 8 e meia horas da manhã” – escreve o Jornal de Penacova – que explicita: “o nosso amigo tinha ido na véspera para Coimbra, e assim teve a honra de trazer em primeira mão a grata notícia. Logo ao chegar ao Ramal de Santo António, o nosso amigo soltou um estridente Viva a República que foi ouvido na vila o que fez com que o nosso director [Amândio dos Santos Cabral] corresse ao seu encontro, dirigindo-se logo ao Largo Alberto Leitão, onde imediatamente se juntavam muitos cidadãos aclamando a República.”
E prossegue o relato:  “Pouco depois, uma comissão Republicana composta dos nossos correligionários  dr. Rodolfo Pedro da Silva, dr. António Moncada, José Pedro Henriques, José Alves de Oliveira Coimbra e o nosso director percorreu a vila convidando os cidadãos para assistirem à proclamação da República nos Paços do Concelho, ao meio dia. A notícia fora anunciada por uma salva de 31 morteiros e grande número de foguetes. Imediatamente ''foi suspenso o trabalho em toda a vila, pois que todos queriam pormenores do faustoso acontecimento.''

Conta-se, de seguida, o episódio da subida ao telhado da Câmara para desfraldar a bandeira verde rubra: “Como as repartições da Câmara Municipal estivessem fechadas, o nosso director subiu por uma escada ao telhado do edifício dos paços do concelho e ali, no meio de aclamações entusiásticas do povo, que se achava no largo, hasteou a bandeira vermelha e verde, augusto símbolo da pátria redimida, a qual foi saudada com entusiásticos vivas e por nova salva de 31 morteiros e inúmeros foguetes.”
“Ao meio dia da tarde [assim se dizia] apareceu nesta vila o nosso correligionário sr. Leonel Serra [de Miro], a cavalo, e empunhando uma bandeira branca onde se lia – PAZ – acompanhado de muitos populares, que saudavam a República.”
Só no dia 7 (porque no dia 6 haviam fechado todas as repartições públicas) foi exarado no livro de actas da Câmara o Auto de Aclamação.  
“Ontem, cerca das duas horas da tarde, na sala das sessões da Câmara, no meio do maior entusiasmo, foi lavrado o auto que noutro lugar publicamos, da aclamação da República, sendo logo assinado por todos os cidadãos presentes, levantando-se muitos vivas à República, à Pátria portuguesa, etc. “
Também, de acordo com os relatos do jornal, apareceu pouco depois, no largo Alberto Leitão um ''numeroso grupo de correligionários da freguesia de S. Pedro de Alva que foi recebido no meio do maior entusiasmo, indo logo todos assinar o auto”.
Em seguida, ''todos os cidadãos que estavam no Largo Alberto Leitão se dirigiram para a nossa redacção – conclui o Jornal de Penacova – fazendo-nos uma calorosa e penhorante manifestação, sendo-lhes aqui oferecida uma taça de champanhe, trocando-se numerosos brindes, sempre no meio do maior entusiasmo.  Este periódico  transcreve na íntegra o texto exarado no livro de Actas das Sessões da Câmara:
“Aos seis dias do mês de Outubro do ano de 1910 pelas 12 horas do dia, nesta vila de Penacova e no Largo Alberto Leitão, fronteiro aos Paços do Concelho, foi entusiasticamente aclamada a República Portuguesa, proclamada em Lisboa no dia cinco do corrente, e hasteada abandeira republicana no edifício acima referido. E não podendo este auto ser lavrado logo após a aclamação, em virtude de estarem ausentes as autoridades administrativas deste concelho e fechadas as portas da câmara municipal sendo impossível, por isso, sem violência haver-se o competente livro das actas das sessões da mesma câmara, se lavra hoje,7 do corrente, o presente Auto de Aclamação da República Portuguesa, que vai ser assinado pela Comissão Republicana Local, pelas pessoas que tomaram parte naquela manifestação e ainda pelas demais presentes a este acto que espontaneamente o queiram fazer. Depois de lido por mim, Alípio de Sousa Correia Leitão, secretário da Câmara que o escrevi. “
Penacova por volta de 1910

O documento é assinado por cerca de sessenta pessoas. A ordem aqui apresentada não corresponde ao original. Optámos pela ordem alfabética:

Abílio Augusto Fernandes, Alberto Cabral de Nascimento Palma, Alípio Serra Cardoso, Amândio dos Santos Cabral, Américo Pinto Guedes, Aníbal Duarte de Vasconcelos, António Carlos Pereira Montenegro, António Casimiro Guedes Pessoa, António Correia da Silva, António Gomes Freire de Almeida e Silva, António Henriques Fonseca Júnior, António Joaquim Dias, António Lopes da Costa Carvalho, António Seiça Ferrer de Saldanha Moncada, Armando Alberto Pimentel, Athalyba Duarte Sousa, Augusto Ribeiro de Almeida, Carlos Mendes, Constantino António Carvalho, Daniel da Silva, Eduardo Pedro da Silva, Eduardo Silva, Fernando Miguel, Francisco Augusto Guedes, Francisco de Almeida Ventura, Francisco da Costa Gonçalves, Francisco Sousa Júnior, Heitor Ribeiro de Almeida, Henrique de Assumpção, Henrique Freire Garcez, Henrique Silva, João Augusto Simões Barreto, João Casimiro Guedes Pessoa, Joaquim Augusto de Carvalho, Joaquim Cabral Júnior, Joaquim Madeira Marques, Joaquim Pereira Castanheira, Joaquim Pita d’Eça Aguiar, Joaquim Serra Cardoso, José Alves de Oliveira Coimbra, José António de Almeida Júnior, José Augusto Monteiro Júnior, José Augusto Ribeiro, José de Almeida Coimbra, José de Matos Vieira, José dos Santos Silva, José Maria Marques, José Maria Pereira Pimentel, José Pedro Henriques, José Ventura de Almeida, Leonel Lopes Serra, Luís Pereira de Paiva Pita, Manuel Maria Ralha, Manuel Correia da Silva, Manuel Maria Ferreira, Manuel Silva, Rodolfo Pedro da Silva, Rodolfo  Silva, Silvério de Amaral Guedes e Urbano Ferreira da Natividade.

02 outubro 2015

CARTA BRASILEIRA DE OUTUBRO: O PRIMEIRO PÊSSEGO

Meu caro amigo, me perdoe por favor se eu  não lhe faço uma visita. Mas o que eu quero lhe dizer é que antigamente, poucas casas tinham garagens, havia quintais, com espaço para as crianças brincarem. A casa de meus pais ocupava um terreno 20x40, onde  plantavam de tudo um pouco, alface, couve, repolho, chicória, almeirão, espinafre, cenoura, tomate, cebolinha, cheiro-verde e tomate. Havia espaço para árvores, uma enorme mangueira, mamoeiro, limão-china, um pé de tangerina, três laranjeiras, chuchu, parreira, uma touceira de cana caiana, figueira, pessegueiro, galinheiro, uma colmeia, e muitas bocas para comer.
O pessegueiro, por ser mais novo ou por exigir algum cuidado especial, demorou para frutificar. Um belo dia, apareceu uma flor. Depois, uma pequena fruta. Começamos a namorá-la. Sem que ninguém combinasse, decidimos, o primeiro pêssego seria de mamãe.
Os cuidados eram de todos. Se alguém jogava uma pedra, logo ouvia um grito: “cuidado com o pêssego da mamãe”. E assim foi,  com fruta  crescendo, o verde começou a amarelar. Um dia, sumiu do pé.  Alguém deveria tê-la colhido e dado a ela.
Quisemos saber dela como era, se doce ou azeda, que gosto teria. Ela não havia comido, guardara para nos mostrar. Descoberta por um passarinho, estava toda bicada. Contou-nos que a pegara caída, cheia de formigas. Fiquei endoidecido. Mas como os  bichos foram fazer aquilo? Peguei minha arma, um estilingue, sai ameaçando, esmagando formigas pelo caminho, naquele momento, matar o passarinho seria pouco. Mamãe interrompeu-me. O importante, ensinou-nos, foi termos visto o pêssego crescer, e o cuidando que tivemos.
CLIQUE NA IMAGEM PARA VER VÍDEO

Hoje, quando vejo na quitanda, ou no supermercado, a gôngula cheia de pêssegos, penso no quintal da minha casa, na penca de irmãos, nos ensinamentos de minha mãe, nos passarinhos e até nas formigas. Ainda bem, tenho coisas boas em que pensar, porque “coisa está preta”, é pirueta pra cavar o ganha pão, que gente vai cavando só de birra e só de sarro.
"Meu Caro Amigo", uma das canções de Chico Buarque que critica o regime é uma carta em forma de música, uma carta musicada que ele fez em homenagem ao Augusto Boal, que vivia no exílio, quando o Brasil ainda vivia sob a regime militar, lançada em 1976. 


P.T.Juvenal Santos



29 setembro 2015

Hélio Cardoso lança mais um livro sobre mecânica automóvel


Não é a primeira vez(1) que divulgamos o lançamento de livros por parte de um nosso conterrâneo radicado no Brasil, natural da Rebordosa: Hélio Cardoso (2). Acaba de nos chegar a notícia da apresentação, em S. Paulo, de mais uma obra sobre mecânica automóvel e que com todo o gosto partilhamos de seguida:


"Nos últimos anos, o engenheiro mecânico HÉLIO DA FONSECA CARDOSO, NATURAL DE REBORDOSA, PENACOVA, RESIDENTE EM SÃO PAULO BRASIL, diretor do IBAPE/SP (Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia de São Paulo) nas gestões 2010-2011 e 1012-2013, acompanhou diariamente as ocorrências de recall em veículos automotores no Brasil e no mundo, formando um banco de dados importantíssimo para desenvolver e publicar esta obra.
O Eng. Hélio da Fonseca Cardoso lançará no próximo dia 28/10/2015 a partir das19:00 hs. na Livraria Saraiva do Shopping Anália Franco, Av. Regente Feijó, 1739, Tatuapé, São Paulo , Brasil, a sua mais recente obra que aborda os principais pontos e polêmicas sobre problemas técnicos em veículos

Neste livro estão contidas informações que vão mostrar cenários nunca antes pensados pelos consumidores e proprietários de veículos automotores.

Quais são as principais causas de recall? Por que os consumidores não comparecerem para regularizar seu veículo?  Há solução definitiva para os problemas?  Existe diferença entre o recall no Brasil e no restante do mundo? Estas e outras perguntas são alvo da análise apresentada.
Tendo em vista que o recall no Brasil ainda contempla apenas itens relacionados à segurança, deixar de executá-lo é um risco potencial para todos nós.

A partir da leitura desta obra, é muito provável que muitas pessoas mudem a forma de pensar antes de escolher um automóvel e mesmo depois de já tê-lo comprado ao saber que faz parte de um recall.

O livro está sendo lançado pela editora Leud e foi escrito em linguagem acessível, a leitura do livro não requer do leitor qualquer conhecimento técnico prévio para total compreensão dos assuntos abordados. Segundo o autor, os artigos foram escritos pensando inclusive no interesse crescente das mulheres na temática. “Escrevi para que elas também se habituem ao tema. Hoje as mulheres escolhem o próprio carro, antigamente eram os homens que escolhiam para elas”, explica o engenheiro.

Para Cardoso, o livro dá uma visão geral sobre o assunto e também serve de apoio em situações comumente enfrentadas por proprietários de veículos. “Esta obra fará com que o leitor se torne cada vez mais analítico e crítico ao discutir sobre o assunto em qualquer ocasião, inclusive para evitar que o sonho vire pesadelo”, afirma o autor."


(2) Hélio da Fonseca Cardoso, é natural da Rebordosa  e reside  há mais de cinquenta anos em São Paulo, Brasil.
Em correspondência trocada disse-nos ter “grande orgulho de ter nascido nessa Terra abençoada e muito linda.”
Informou-nos também que é neto do Sr. Joaquim Luís Miguel que foi um grande comerciante de ervas medicinais de Penacova.

27 setembro 2015

Invasões Francesas: o povo humilde e obscuro, que, sem entender porquê, foi violentamente agredido e ultrajado.

O tema das Invasões Francesas ocupa,  por esse mundo fora, páginas e páginas dos livros de História. Batalhas, generais, heróis, vencedores e vencidos, mortos em combate... E sobre as vítimas mais humildes e ignoradas, as populações civis espoliadas, cruelmente martirizadas e assassinadas, quantas páginas se escreveram?
É enquadrada nesta interrogação que a historiadora Maria Antónia Lopes,  da Faculdade de Letras e Centro de História da Sociedade e da Cultura da Universidade de Coimbra,  tem vindo a centrar as suas investigações. Entre outros trabalhos, escreveu para o 3º volume da obra O Exército Português e as Comemorações dos 200 Anos da Guerra Peninsular um capítulo intitulado  “Sofrimentos das populações na terceira invasão francesa. De Gouveia a Pombal”. Apesar de não referir casos ocorridos no nosso concelho, sabemos que também esta zona foi flagelada.
Como apontamento (porventura longo) transcrevemos de seguida algumas partes do referido estudo que nos transportam para uma realidade da qual nos chegam apenas vozes distantes e muitas vezes desfocadas...

Infografia incluída no trabalho de Maria Antónia Lopes

(...) Sabemos que as Invasões Francesas deixaram atrás de si um rasto de destruição e morte. Sabemos, também, que a terceira, em 1810-1811, foi terrível para as populações.
(...)
Segundo António José Telo, a estratégia inglesa não visou proteger as populações portuguesas e nem sequer expulsar rapidamente o invasor, mas desgastar na Península os exércitos napoleónicos. Porque não interessava uma vitória rápida, evitaram-se as grandes batalhas e, quando estas foram inevitáveis, como a do Buçaco em 1810, os seus resultados não foram explorados. Wellesley (futuro duque de Wellington) rumou para Sul, abandonando Coimbra ao saque dos invasores, que decorreu nos dias 1, 2 e 3 deOutubro de 1810, até ser reconquistada pelas milícias comandadas pelo coronel Trant.
(...)
Detido em Torres Vedras ao longo de meses, o exército francês foi derrotado pela fome, frio, doença e desmoralização. A norte da frente de batalha ficara um país devastado e em muitas zonas deserto, pois as ordens inglesas tinham sido de evacuação total das povoações com destruição de searas, pontes, moinhos e tudo o que não pudesse ser transportado.
(...)
Em Março de 1811 os Franceses iniciaram a retirada. Desesperados pela fome, buscando mais a sobrevivência do que o combate, levaram as atrocidades ao último grau, apanhando as populações em fuga, a quem torturavam e matavam para lhes extorquir víveres. Coimbra foi poupada, pois Massena não conseguiu entrar na cidade. Conduziu então os seus homens para Espanha pela margem sul do rio Mondego, onde a carnificina prosseguiu. Nos dias 19 e 20 de Março, sem encontrar nada para comer, as tropas francesas espalhavam-se por Pinhanços, Sandomil, Penalva do Castelo, Celorico da Beira, VilaCortês, Vinhó, Gouveia, Moimenta da Serra, etc. As populações do concelho de Mangualde já tinha evacuado as aldeias, no que chamaram o “3º desterro”, isto é, a fuga para os matos, onde procuraram sobreviver escondidas dos invasores. O 1º desterro tinha sido em Setembro de 1810 e o 2º em Dezembro do mesmo ano e Janeiro de 1811.
(...)
À fome e aos assassínios, e acompanhando as vagas de desalojados e de órfãos, sucederam-se as epidemias. Regressados a suas casas, as populações encontraram a destruição e os campos estéreis. A escassez de géneros tornou-se aflitiva e os preçosdispararam. Só muito lentamente a situação se normalizou. Nunca a população civil portuguesa vivera um período tão trágico.
(...)
Sintetizando as informações que lhe chegaram dos párocos, o provisor da diocese de Coimbra – vasta região, englobando o norte do actual distrito de Leiria e ainda uma pequena porção dos de Aveiro, Guarda, Viseu e Santarém – abre assim o seu relatório de Dezembro de 1811:
“O bispado de Coimbra... [que] contém 290 paróquias, apenas contará 26 delas onde não entrasse o inimigo. O terreno de todas as outras foi por ele calcado, desde o dia 21 de Setembro de 1810 até ao meio de Março de 1811”. A miséria é geral, diz o provisor. Segundo os seus cálculos, morreram violentamente às mãos dos soldados 3.000 pessoas e em consequência da epidemia que se seguiu, teriam falecido, no mínimo, 35 mil habitantes da diocese.
(...)
O marquês de Sá da Bandeira presenciou o sofrimento das populações na
retirada das forças francesas: “Encontrámos as povoações saqueadas e desertas, e muitas casas incendiadas. Os poucos habitantes que ao caminho nos vinham encontrar, homens, mulheres e crianças, apresentavam o aspecto o mais desgraçado; famintos, cobertos de farrapos, e parecendo alguns terem perdido a razão. A presença destes infelizes indivíduos causava o maior dó. Soldados e oficiais do exército aliado procuravam socorrê-los, partilhando com eles das suas escassas rações, que eles comiam com a avidez da fome”
(...)
Um Aviso Régio de 25 de Março de 1811 mandou proceder ao registo dos estragos, incêndios e mortos provocados pela última invasão.
(...)
Para se cumprir o Aviso, foram encarregados os párocos de elaborar relações dos prejuízos e vítimas das suas freguesias. (...) Quanto aos mortos causados pela epidemia, segundo as mesmas fontes, foram em números avassaladores. Na Figueira da Foz, onde não houve assassínios porque os invasores não passaram por lá, sucumbiram 4.135 indivíduos por doença, entre naturais e refugiados. Em Vila Verde, povoação vizinha onde também os invasores não entraram, estão assinaladas 290 vítimas da epidemia, além dos estragos causados pelos fugitivos que se acolheram à freguesia.
Grande parte do percurso dos Franceses, à entrada, efectuou-se pela margem norte do rio Mondego, mas repare-se que a maior mortandade se encontra ao longo das estradas a sul do rio, isto é, no trajecto utilizado na retirada e, por certo, também, nas incursões efectuadas durante a imobilização nas linhas de Torres.
(...)
Eis as palavras do prior de Pelmá:
“Não se podem numerar, nem tão pouco vir no miúdo conhecimento dos atrozes procedimentos dos bárbaros procedimentos que os inimigos cometerão nesta freguesia; e jamais poderá haver quem miudamente descreva suas atrocidades porque eles executavam quantas barbaridades lhe[s] vinham à imaginação. Sim, Excelentíssimo Senhor, o seu brutal apetite não perdoou ao sexo octogenário nem à pura inocência e, não satisfeitos desta calúnia e violência, moeram estas com pancadas, de que se tem seguido infinita mortandade. Nesta igreja nada deixaram que imagens mutiladas e degoladas; [...].Pelo que pertence aos roubos desta freguesia é incalculável o seu valor, porque, ainda que se quisesse fazer uma exacta averiguação pelos moradores, estes mesmos não saberiam dar uma exacta conta de sua perda porque levaram todos os gados de todas as qualidades: bois, bestas, porcos, cabras, ovelhas, perus e galinhas. De pão, vinho, azeite e legumes nada ficou nem vestígio. Pelo que pertence a roupas, as que lhe[s] não faziam conta rasgavam e faziam dela aos cavalos cama para que deste modo apodrecesse e os donos semnão utilizassem. Trastes de casa era com que os malvados faziam as fogueiras e aqueciam os fornos; toda a qualidade de louça a faziam mais miúda que sal [...]. Mas o procedimento que mais horroriza destes infames bárbaros, é as mortes que perpetraram nesta freguesia, que julgando este povo que lhe[s] escapava pelos bosques e fragas, não lhes escapou de trilhar a unhas de cavalo as fragas mais ásperas e esconderijos mais invadiáveis aonde apanharam quase todo o povo, aonde mataram 56 pessoas umas à bala, outros enforcados e outros a baioneta e também a espada; e os que não morreram logo, ou têm morrido ou ficaram mutilados e se acham na disposição de durarem pouco, porque além destes golpes, os deixavam nus e descalços. Entre o número de mortos foi o padre Miguel Lopes Alumbre que depois de lhe darem um sem número de picadas, lhe arrancaram as barbas, tiraram-lhe os olhos e afinal o passaram com duas balas”
(...)
Os párocos de Arganil, Vila Cova de Alva e Góis também narram as barbaridades cometidas. O primeiro descreve a morte de um colega de 76 anos: “Foi morto pelo modo o mais cruel: depois de ser atormentado cruelmente no campo, aonde foi achado, daí foi trazido com uma corda ao pescoço para sua casa, aonde depois de lhe[s] ter dado todo o dinheiro que tinha escondido em várias partes, o mataram à espada e baioneta, castrando-o sobre a cama e levando em um barrete eclesiástico as suas partes pudendas”
(...)
Foquemos agora só as mulheres, muito massacradas nesta invasão.
(...)
É possível que o recuo do exército, com a soldadesca desesperada de esgotamento e fome, tenha sido mais dramático para as mulheres. O pároco de S. Miguel de Poiares, terra invadida nas duas vezes e onde a percentagem de vítimas femininas atinge os 73%, afirma que pelo Natal de 1810, embora os invasores os tivessem colhido de surpresa, as mortes e atrocidades foram muito menores do que nos três dias que aí estiveram em Março do ano seguinte.
(...)
Como morreram estas mulheres? Os dados são escassos, mas sabemos que em Góis pereceu uma a tiro (quando fugia) e as outras “a golpe de ferro”; que em Vila Cova de Alva, Bernarda Maria, viúva de 60 anos, por ter “resistido as desonestidades que lhe queriam fazer lhe deram um tiro”; que em Arganil, Mariana Mendes, viúva, foi morta a espada e depois queimada e a Maria, casada, arrancaram-lhe a língua e mataram-na com tormentos vagarosos; e que em Nogueira do Cravo (concelho de Oliveira do Hospital) assassinaram três mulheres (sendo duas entrevadas) “com tanta barbaridade que lhes
tiraram os olhos e arrancaram a língua”
(...)
Recordemos que a fome desesperava os soldados e que as mulheres mortas eram camponesas, isto é, as guardiãs dos víveres. É bem possível que as mortes e torturas de que foram vítimas se expliquem pela sua resistência em ceder os mantimentos.
A violência contra as mulheres em tempos de guerra traduz-se sempre em crimes sexuais. Disponho de pouca informação sobre o número de vítimas de violação, a quem alguns párocos chamam cruamente “mulheres estragadas” ou, pelo contrário, de forma muito casta, “mulheres vistas”. Como veremos adiante, é assim que elas próprias se designam. Lemos já o testemunho do prior de Pelmá que, escolhendo cuidadosamente as palavras, se referiu à violação de meninas e de anciãs, mas é para os arciprestados de Sinde e Arganil que temos mais notícias. Assim, em Sarzedo (concelho de Arganil), onde foram mortas quatro mulheres (os homens foram 10), as “moças aprisionadas e estragadas” atingiram o número de 56; em Meda de Mouros (concelho de Tábua), com 13 vítimas mortais (10 homens e 3 mulheres), o pároco assinalou 43 “mulheres que foram estragadas”; em Celavisa (concelho de Arganil) a soldadesca levou consigo “15 raparigas da freguesia que voltaram estragadas”. Em três outras povoações regista-se que “foram muitas” as mulheres violadas. Afirma o pároco de Mouronho (concelho de Tábua) que os
Franceses passaram “à maneira de tempestade” e que foram as mulheres que mais sofreram com a sua violência. Em Góis, terão escapado à violação ou, então, o vigário preferiu não esclarecer o assunto: “Roubaram desta freguesia, na primeira vez que entraram, 25 mulheres e raparigas, que, indo fugindo, ficaram dentro do cerco; e todas depois de roubadas as faziam carregar com os fardos e mais coisas que furtavam, pondo-as todas descalças e com poucos vestidos, mas por misericórdia de Deus pouco tempo estiveram em poder do inimigo, algumas apenas duas horas, outras seis, e logo vieram ter a suas casas”.
(...)
Como o exército aliado vencera a batalha do Buçaco a 27 de Setembro de 1810, em Coimbra comemorou-se efusivamente. Mas Wellington decidiu rumar a Lisboa, abandonando aquela cidade, onde só na madrugada do dia 29 de Setembro se percebeu que o exército inimigo se encontrava às suas portas. Foi ordenada a total evacuação da urbe e a destruição de tudo o que não pudesse ser transportado. Em pânico, pobres e ricos, padres e freiras, velhos e novos, fugiram em direcção a Lisboa e ao porto da Figueira da Foz ou embrenharam-se por matos e pinhais, mas muitos foram capturados e violentados na estrada real. Outros, impossibilitados de caminhar por doença ou velhice ou esperançados na clemência do invasor, permaneceram e sofreram as consequências.
(...)
Igrejas, conventos, colégios, recolhimentos, câmara municipal, seminário, misericórdia, lojas, casas particulares... tudo foi saqueado.
Populações massacradas, aterrorizadas e espoliadas.
Vítimas não necessariamente heróicas, gente que nem sequer integrou as guerrilhas ou clamou pela pátria. Apenas povo humilde e obscuro, que, sem entender porquê, foi violentamente agredido e ultrajado.

26 setembro 2015

Batalha do Bussaco: memórias do dia vinte e seis de Setembro 205 anos depois


Gravura representando a Batalha do Buçaco - 27 de Setembro de 1810 - publicada em Londres, em 1 de Junho de 1815, por J. Jenkins, 48 Strand. Existe no Arquivo Histórico Militar, Lisboa, Portugal, e é identificada com o código PT-AHM-FE-10-A7-MD-12.A…

Noite de 26 de Setembro de 1810

Massena reune-se com Ney,Junot, Reynier, Fririon,Eble e Lazowski. Ney considera que o ataque já devia ter sido feito enquanto o exército anglo-luso ainda não tinha concentrado as suas tropas e por isso entende que o melhor seria retirar para Viseu e daí seguir para o Porto ou para Almeida. Junot, Fririon e Eble tinham a mesma opinião mas Reynier e Lazowski, apesar de acharem difícil o ataque, entendiam que havia algumas possibilidades de êxito. Massena decide-se pelo ataque e retira-se para o quartel general em Mortágua.

Para a batalha os franceses posicionaram-se do seguinte modo:

O 2º Corpo de Reynier abandonava a estrada que ligava Mortágua ao Botão, próximo de Santo António do Cântaro e atacava procurando romper o dispositivo inimigo:

-A divisão Merle formaria junto de Pé da Serra

-O general Foy ocuparia Santo António do Cântaro

-A brigada Arnauld e a cavalaria ficariam em reserva à retaguarda de Sto António.

O 6ºCorpo de Ney deslocar-se-ia na Estrada Mortágua-Luso. As 3 divisões deste Corpo formariam a retaguarda de Moura

O 8º Corpo de Junot deveria deixar os seus bivaques no Barril e vir para a retaguarda do 6ºCorpo.

A cavalaria de Montbrun formava à esquerda da estrada Mortágua-Moura. Fica decidido também que Reynier e Ney atacariam em simultâneo.

O exército francês contaria com cerca de 64 000 mil homens.

Do lado das forças anglo-lusas:

No Montalto estariam 5 companhias da “Leal Legião Lusitana” e meia brigada de artilharia portuguesa;

Um pouco atrás, à esquerda o Corpo Hill ocuparia todo o alto da Chã, entre Galiana e Palmazes;

A 5ª divisão de Leith posicionar-se-ia entre a Portela da Oliveira e Santo António do Cântaro, bem como a divisão Picton e a divisão Spencer.

Em frente á ravina que desce a serra e passa a sul dos moinhos da Moura, estaria a brigada portuguesa Pack.

Dos dois lados do moinho de Sula estaria a divisão Craufurd e atrás desta a divisão Colleman constituída por portugueses.

Guarnecendo o moinho do Milijoso estaria a brigada portuguesa Campbell.

No flanco esquerdo a 4ª divisão Cole, barrando os acessos a Ninho de Águia e Cabeço Redondo em frente a Trezói. Em Monte Novo estaria a Legião Alemã.

A divisão de infantaria portuguesa comandada por Lecor ocuparia a região da Ponte da Mucel.

As milícias Trant, sedeadas em Mortágua vigiariam os caminhos que iam dar ao Sardão.

A cavalaria e a artilharia distribuir-se-iam:

-Próximo da Mealhada e em Avelãs do Caminho posicionar-se-iam as tropas inglesas de Cotton

-As tropas portuguesas (incluindo um regimento inglês) comandadas por Fane posicionar-se-iam na margem direita do Alva junto à Ponte da Mucela.

Refira-se que a artilharia estava em maior força em Santo António do Cântaro e na estrada defronte da profunda ravina defendida por Craufurd.

A parte da serra ocupada por Wellington era demasiado grande para ser ocupada integralmente mas havia a vantagem de existir uma estrada ligeiramente afastada da crista ao longo da qual se podiam deslocar as tropas sem serem vistas pelo inimgo e ao mesmo tempo, nas posições já referidas, poderem deslocar-se as tropas de um lugar para outro antes que os franceses tivessem tempo de escalar as alturas e dominar a situação.
FONTE: A BATALHA DO BUSSACO-MEMÓRIA, edição do Museu Militar do Bussaco, 1981

21 setembro 2015

As Vésperas da Batalha do Bussaco descritas por Simões de Castro


Muito se escreveu (e se escreve ainda hoje) sobre a Batalha do Bussaco. Muitos e muitos  relatos ficaram registados quer pela mão de franceses, quer de ingleses e portugueses. O texto que se segue,  não trazendo nada de novo, tem no entanto a particularidade de ter como autor Augusto Mendes Simões de Castro  que,  como todos os penacovenses sabem, deu origem à designação do Penedo do “Castro” outrora conhecido por Penedo da Cheira. Simões de Castro deixou muitas obras entre as quais o “Guia Histórico do Viajante do Bussaco” onde dedica um capítulo àquele acontecimento militar que marcou a nossa região, o país, e mesmo grande parte do “mundo ocidental”.
O capítulo começa com uma sextilha de Delfim Maria d’Oliveira Mata:

Aqui a águia vencedora
Ofuscar seu brilho outrora
Por nossas armas já viu;
-Empolgava quasi a Europa
Mas à forte lusa tropa
O colosso sucumbiu.

Transcrevemos a parte inicial do capítulo em causa:

“Junto dos muros do Bussaco se feriu no dia 27 de Setembro de 1810 uma famosa batalha, em que o exército anglo-luso, sob o comando de lord Wellington, ofuscou pela primeira vez a glória militar do afortunado e célebre Massena -o filho querido da Vitória, como lhe chamava Napoleão.
Havendo as tropas francesas invadido por duas vezes o nosso pais, sem que obtivessem vantagem decidida, a primeira em 1807 capitaneadas por Junot, e a segunda em 1809 por Soult, resolveu Napoleão mandar de novo invadir Portugal por um grande exército sob o comando do marechal Massena, que efectivamente transpôs a nossa fronteira em Agosto de 1810, depois de tomar Astorga e Ciudad Rodrigo.
Era Massena precedido pela grande fama de seus esplêndidos feitos militares; alcançara vitórias assinaladas, e ufanava-se de ter salvado a França com a batalha de Zurique, que havia ganhado contra os russos, e com a memorável defesa de Génova, com que facilitara a Napoleão a passagem dos Alpes. Trazia consigo generais
de grande perícia; e suas tropas eram numerosas, aguerridas e valentes. Os nossos soldados eram em menor número, grande parte recrutas, que nunca se tinham encontrado em campo com o inimigo. Bem desigual era pois o partido; todavia os brios
da nação tudo supriram, e o Filho Querido da Vitória, que segundo a linguagem soberba de Napoleão, vinha arrojar Wellington para o Oceano, teve de se reconhecer vencido e de evacuar o país depois de muitos revezes.
Entradas as tropas francesas em Portugal, o seu primeiro passo foi o cerco de Almeida. Uma terrível explosão, sucedida nos armazéns de polvora d'esta praça no dia 26 do dito mês de Agosto, obrigou a guarnição a capitular.
Tratou Massena imediatamente de dispor as coisas para realizar o seu plano de invasão, e ordenou aos diversos corpos do seu exercito fizessem colheitas e se provessem de viveres para dezassete dias- tempo que calculara o necessário para a conquista de Portugal.
No dia 20 de Setembro acamparam as tropas junto de Viseu. Esta cidade fora abandonada pelos habitantes, e Massena, encontrando-a deserta, ficou surpreendido e viu transtornados seus planos; pois não só esperava que o povo português o receberia bem, mas contava por consequência encontrar facilmente os necessários recursos para o exército prosseguir sem embaraço na sua marcha até Lisboa.
Convocou Massena os oficiais de estado maior, e alguns portugueses que trazia consigo, para o instruírem da estrada que mais conviria seguir em direcção a Lisboa, e deliberou que se marchasse pela de Tondela e que em Santo António do Cântaro se atravessasse a serra do Bussaco.
No dia 25 pôs-se todo o exército em movimento, e veio acampar em Tondela e cercanias. Encontrou esta vila deserta e completamente desprovida de mantimentos.
No dia 26 continuaram as tropas a sua marcha. Na ponte do Criz achou a vanguarda alguma resistência por parte dos aliados, mas depois de ligeiro combate abandonaram estes a ponte, deixando-a cortada. Repararam- na logo os Franceses e por ela pôde passar a artilharia; a cavalaria e infantaria passaram num vau pouco acima da ponte.
A vanguarda dos aliados continuou a afastar-se até Santo António do Cântaro, e neste ponto opôs forte resistência. Viram os franceses que lhes era impossivel vencer esta posição, e ao mesmo tempo descobriram uma força superior sobre a montanha do Galhano. Fizeram então reconhecimentos para todos os lados, mas foram rechaçados sucessivamente.
Nessas circunstâncias participaram a Massena (que havia ficado muito para trás) que os aliados se opunham à passagem da montanha com forças consideráveis.
Veio Massena reconhecer a posição, e seguidamente perguntou ao general Pamplona se julgava que os aliados ofereceriam batalha. Respondeu este que sem dúvida, visto como sobre a montanha se descobriam forças tão consideráveis. Disse então Massena, convencidissimo e em tom de oráculo: — «Eu não me persuado que Lord Wellington se arrisque a perder a sua reputação; mas se o faz, je le tien: demain nous finirons la conquête du Portugal, si en peu de jours je noyerai le léopard»
Mal diria Massena que dentro de poucas horas haviam as coisas de suceder tanto pelo contrário do que esperava!


09 setembro 2015

Cartas Brasileiras - Festa do Peão de Boiadeiro de Barretos

Festa do Peão de Boiadeiro de Barretos

Para eximir-me de algum deslize, adianto que sou “beia” em assunto de rodeio, mas não quero ser um “mofete”, espero não levar um “pialo” nessa minha tentativa.
Em agosto, Barretos, minha cidade natal, fica agitada. No dia 25 é comemorado o aniversário da cidade (161 anos) e durante dez dias Festa do Peão de Boiadeiro (20/08-30/08). Haja quem ponha restrição ao nome da festa, deveria ser Festa do Peão de Rodeio, por contar com a participação dos astros, enquanto o peão de boiadeiro se refere mais precisamente ao profissional que lida dia a dia no campo.

Não vai aqui nada de bairrismo pela escolha do tema dessa carta, já deixo claro, o evento não mais me causa arrepios, talvez porque a pele ressecada pelos meus passados setenta anos consiga controlar meus eosinófilos. Independentemente de tudo, vamos em frente. Aliás, a festa, realizada pelos Os Independentes, vai além dos espetáculos protagonizados pelos peões, que disputam diversos prêmios em diversas modalidades, haja shows de cantores.
O que me traz é a curiosidade da fala dos peões, a linguagem oficial atrás dos “bretes”. Se no futebol existe a Maria Chuteira, mulher que dá de cima dos jogadores, existe a correspondente a “Maria Breteira”, não largam do pé dos moços.
Os peões, na maioria jovens, se põem “traiados”, ninguém quer ser “carregado” ou “guaiaca”, e as “chayenes”, muitas delas usando “sedém no talo”, identificam facilmente um “faiado”, até mesmo as “dirrubadas” sabem quem é quem.
Bebida forte é um “trago”, pão duro é “escorpião no bolso”, e quem “está com medo para que veio”, é porque mal chega já quer ir embora. Existem muitas outras expressões usadas, a Internet pode ser fonte para consulta.

P.T.Juvenal Santos – ptsantos@bol.com.br
  
Abeia braba (abelha brava): Peão fraco, que não consegue ficar em cima do animal.
Abeia (abelha) ou beia:  quem em não entende nada de rodeio; inexperiente, peão iniciante.
Brete: cercado, curral, local onde os animais do rodeio ficam antes das provas de montarias começarem.
Carregado: Quem usa roupa country com muitas franjas e bordas.
Chayene: moça com traje típico vistoso com franjas,
Dirrubada (derrubada, caída): Péssimo rodeio; mulher feia
Guaiaca: Cinto de couro com vários compartimentos; peão mal trajado ou com roupa velha.
Faiado (falhado): cowboy de araque.
Mofete: pessoa chata
Pialo: tombo
Sedém: espécie de corda atada na virilha dos cavalos para fazê-lo pular mais.
Sedém no talo: Calça jeans bem apertada.
Traiado ou na traia: Adepto de roupa country legítima e completa (camisa listrada, chapéu bonito, botas e fivelas novas)




08 setembro 2015

Marcas do progresso chegaram ao Mont'Alto...em 1947

A romaria ao Mont'Alto continua a marcar a vida de Penacova num misto de Fé,  Tradição e Convívio. Muitas "histórias" vividas ao longo dos tempos podiam ser recordadas...

Nos finais do século XIX o percurso era feito a pé e os carros de bois transportavam os farnéis para aliviar o peso da caminhada:

"O Joaquim Catarino e o Benêjo andavam a trote a juntar os farnéis para os carros de bois da D. Maria da Pureza enquanto na casa da D. Joaquina de Melo e da D. Natividade se fazia outro tanto. Só pelas onze horas é que deslizava a caravana com os carros cobertos de verdura para ser mais fresco." 
                                                                                 Recorte de jornal

Outros tempos...

Mais tarde aparecem os automóveis, as camionetas, as motorizadas...
Quem se lembra do ano em que pela primeira vez subiu ao "Monte Alto" uma camioneta... ( a "Vagarosa Ligeira" ?) e uma moto?
Terá sido em 1947... E felizmente o fotógrafo estava lá!

A "triunfal" chegada da "camionete" do
Sr. Heliodoro do Casal
No ano seguinte alguém recordou em verso tão importante acontecimento:

TRANSFORMADO EM CARRO DE ASSALTO
FOI A PRIMEIRA VEZ UMA CAMIONETE
SEM ESTRADA À Sª DO MONTE ALTO
EM SETEMBRO DE MIL NOVECENTOS
E QUARENTA E SETE

ISTO COM GRANDE ALEGRIA
SEM PENSAR NO GASTO DA MOTA
FOI AO MONTE ALTO NO MESMO DIA
SEVERINO FIGUEIREDO DA MOTA

HOJE NOVECENTOS E QUARENTA E OITO
QUE JÁ VAMOS SEM SUSTO
IMITAI ESTES BEM FOITO
PORQUE JÁ VAMOS SEM CUSTO

AVANTE PROGRESSO

Nota: agradecemos ao Sr. José Alberto Costa a cedência da imagem bem como do recorte com as quadras alusivas.